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06 outubro 2020

Autoperdão e obsessão - Rogério Miguez

 
 
AUTOPERDÃO E OBSESSÃO

O emprego do autoperdão vem recebendo viva atenção nos meios espíritas: em palestras nos centros, transmissões ao vivo, as quais são disponibilizadas na WEB, artigos, entrevistas, ou seja, nos mais variados meios de divulgação e comunicação.

Tema realmente oportuno e relevante, com eficazes resultados para os seus reais utilizadores, pois pode proporcionar, quando pertinente, o reencontro com a paz interior, momentaneamente perdida pelo cometimento de graves atos e condutas perpetrados pelo infrator, distanciados do correto ordenamento divino.

Entretanto, é imperioso esclarecer que no desenrolar da existência, não há receitas mágicas, tudo desenvolve-se através do merecimento e do aproveitamento das lições oferecidas pela vida, traduzidas pelo resultado das boas obras efetivamente realizadas, ou seja: não há a lei do menor esforço.

Sem perceberem ter o emprego do autoperdão alcance e efeitos muito bem delineados, alguns iludem-se acreditando em poder, pelo uso continuado deste recurso, escapar das inevitáveis consequências de suas obras levianas, às vezes mesmo, maldosas.

Uma das possíveis formas de, infelizmente, autoenganar-se, alguns por desconhecimento, outros às vezes mesmo tentando subtrair-se das implicações de anteriores atitudes cometidas irrefletidamente, o indivíduo autoperdoa-se, na expectativa de poder iniciar nova caminhada livre do sentimento de culpa, sem nenhuma necessidade de expiar e reparar o mal realizado.

O autoperdão é uma ferramenta a ser utilizada em casos contundentes, onde o descumpridor dos eternos princípios divinos, se vê acuado diante de sua conduta, não encontra respaldo e apoio junto a seus amigos e familiares, e, diante de uma pressão interna cada vez maior, o autoperdão apresenta-se como uma válvula de alívio da insuportável pressão interna, permitindo ao que sofre as consequências do remorso e arrependimento profundos, reorganizar-se, tendo condições de retomar sua marcha evolutiva.

Eventualmente, o conflito interno experienciado pelo transgressor pode ser acentuado pela atuação incisiva de um Espírito ainda desorientado – o chamado obsessor - que, por razões diversas, ligou-se mentalmente ao transgressor da lei e, através de continuadas más sugestões especificamente direcionadas à questão em foco, martiriza ainda mais a vítima, fazendo crer que o delito foi gravíssimo, não havendo desculpa para o feito, em suma: o agressor cometeu uma falta irremissível.

Nesta situação, poder-se-ia argumentar que o autoperdão seria a solução ideal, liberando o obsidiado desta incômoda situação.

É fato que o autoperdão sincero, por parte daquele que se considera pecador, o ajuda muitíssimo a conviver com as consequências da ação indevida. Entretanto, se o vínculo obsessivo se estabeleceu por conta de uma prejudicial conduta direta ao Espírito desencarnado, por exemplo, a prática de um abortamento, o futuro reencarnante que se viu impedido de voltar ao mundo material poderá, se assim o decidir, iniciar um processo obsessivo, tentando vingar-se. Neste caso, apenas o autoperdão terá pouca ou nenhuma serventia para interromper o assédio do obsessor.

O único caminho com o poder de aliviar a vítima de seu algoz, nesta particular situação, seria a mudança de atitude do infrator, neste caso a mãe que, em geral, já havia prometido previamente, antes de reencarnar, receber aquele particular Espírito para uma jornada em nova existência familiar.

E qual seria a conduta adequada em um caso como o descrito, além de autoperdoar-se? Certamente a mãe poderia voltar-se a atividades envolvendo crianças sem pais, um orfanato, por exemplo, dedicando-se a cuidar de filhos alheios.

Outra opção seria assumir a manutenção material de uma criança abandonada em uma ONG dedicada a este tipo de atividade, suportando as despesas materiais que este órfão necessita para viver sob a tutela desta organização filantrópica. Não há necessidade em absoluto de levar a criança escolhida para a própria residência, pois muitas mães nem podem (possuem jornadas de trabalho extensas), é suficiente o compromisso de cuidar do filho alheio, com dedicação e responsabilidade.

Em nosso país é difundida a prática da contratação de serviços domésticos ajudando no funcionamento de um lar. Em muitos casos, esta pessoa que nos ajuda, a chamada diarista, possui filhos. Por qual razão não “adotar” estas crianças, caso os contratantes possuam recursos suficientes, provendo material escolar, brinquedos, vestimentas, ou mesmo algum apoio na alimentação destes filhos alheios?

O obsessor precisa observar um comportamento altruísta da mãe em relação ao próximo; isto é que o motiva a desfazer o laço obsessivo.

Entres tantas obras espíritas orientando neste sentido, podemos recordar literatura do século passado, onde se lê uma orientação geral para desanuviar as mentes culpadas: (1)

“Para desobstruir o caminho de nossa consciência culpada, devemos favorecer a libertação dos que suportam fardos mais pesados que os nossos, porque ajudando aos nossos semelhantes angariaremos o auxílio deles, fazendo-nos, ao mesmo tempo, credores do amparo daqueles Irmãos Maiores que nos estendem próvidos braços da Vida Superior”.

Em um caso de abortamento, quando a mãe desconhece as graves implicações desta conduta, a situação pode ser plenamente contornada por uma nova gravidez, quando, às vezes, o próprio Espírito não aceito no passado, pode apresentar-se mais uma vez para um novo tentame reencarnatório.

Este exemplo pode se estender a outras situações onde o transgressor da lei divina, por meio de uma simples atitude de autoperdoar-se, não logrará sucesso em acalmar-se internamente, e precisará agir de acordo com o delito perpetrado, reparando o mal realizado, e, certamente, a misericórdia de Deus sempre ajudará neste intento.

Rogério Miguez


Referência:

(1) XAVIER, Francisco C. Instruções psicofônicas. Espíritos Diversos. 2. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1955. cap. XII. Ante a reencarnação.

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