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31 janeiro 2021

Rituais de luto em tempo de COVID-19 - Cristiane C. Neves


RITUAIS DE LUTO EM TEMPO DE COVID-19


Nesse momento de pandemia, nós estamos vivendo vários tipos de luto, pois o processo de luto acontece em decorrência da experiência de perda, ou seja, a partir do rompimento de uma relação afetiva significativa. E, é isso que estamos passando nesse período, por diversas perdas importantes: emprego, produtividade, financeiras, perdemos aquele caminho planejado que estávamos percorrendo com sensação de segurança, perdemos temporariamente a convivência e o abraço das pessoas que amamos, e o pior de todas essas perdas: perdemos entes queridos. Nesse contexto, os rituais de passagem entre a vida e a morte têm o objetivo de reduzir a dor da perda, contribuindo para um processo de aceitação e continuidade da vida. Os rituais do luto são reconhecidos como fator de proteção muito efetivo e que favorece o processo de luto.

Na ausência desse ritual por conta do isolamento e proteção contra o vírus, é importante a comunicação com pessoas familiares ou no meio social ou religioso que passaram pela perda: ter contato afetivo (que seja virtual), a troca de experiências, uma rede de apoio ativa em que podemos confiar. Como exemplo, a Comunidade Espírita Ramatis oferece esse suporte emocional por meio do grupo de apoio aos enlutados. O acolhimento ao enlutado deve ser isento de “correções” dos sentimentos do enlutado e não deve haver medidor da dor ou comparações. Cada qual sabe a dor da sua perda e essa deve ser ouvida e respeitada. O luto já dá uma sensação de que estamos sozinhos no mundo, e ficar isolado com o nosso sofrimento pode potencializar isso, gerar mais sofrimento levando ao adoecimento emocional e físico.

A morte repentina e inesperada, que pode acontecer por tragédias ou morte súbita e, atualmente, vem acontecendo por conta da potencialidade desse Coronavírus, é considerada complicadora para a elaboração do luto reconhecido como luto normal e pode gerar transtornos psicológicos importantes nos enlutados por esse tipo de perda. O processo de luto se dá de forma mais intensa e duradoura do que o esperado, por não ter conseguido processar a situação nem se despedir de forma que lhe permita ter um senso de realidade e concretude.

A impossibilidade para que seja feito o trabalho do luto antecipatório – aquele que antecede à morte e auxilia no processo de finitude tanto para o doente em estado terminal, quanto para a família que prevê a perda – e, a consequência do impedimento de vivenciar os rituais fúnebres, pode trazer intensos sentimentos de raiva, culpa, choque, pânico, angústia, que somados a uma experiência de luto coletivo, no caso da pandemia, aumenta o risco para a complicação das características de um luto normal, no qual dá-se o nome de luto complicado. O enlutado vivenciando um luto complicado vai necessitar de um cuidado maior tanto das pessoas próximas, quanto de profissionais qualificados para auxiliá-lo na retomada de investimento nas situações necessárias para o enfrentamento da vida. Portanto, a fim de minimizar os efeitos nocivos para o luto, vamos sugerir algumas adaptações para a realização dos rituais fúnebres:

· Podemos promover encontros virtuais com familiares e amigos que conheceram e conviveram com o falecido. Podemos pedir para as pessoas trazerem para o encontro on-line algo simbólico para compartilhar, como uma vela acesa; uma memória ou história sobre o falecido; uma imagem ou um poema como homenagem ao falecido. Fazer com que as pessoas contribuam dessa maneira pode ajudar a criar uma sensação de unidade e conforto. Essa pode ser uma forma de o enlutado receber o carinho e acolhimento, podendo compartilhar os seus sentimentos com aquelas pessoas conhecidas. E todos podem chorar ou sorrir juntos.

  • Pode-se reservar um tempo para criar um memorial em casa. Uma sugestão seria reservar um tempo olhando as fotografias do falecido, acender uma vela, escrever uma mensagem para ele, seguir um ritual familiar ou espiritual.
  • As pessoas também podem escrever homenagens e memórias afetivas em um documento compartilhado que pode ser transformado depois em um lindo livro de memorias.

  • Possibilitar contato virtual, enquanto não é possível presencial, com líderes religiosos importantes para a família e que sejam significativos para esse momento: cultos/missas virtuais.
  • Como os rituais religiosos públicos estão restritos, podemos sugerir orações em vídeo conferência ou simplesmente marcar um horário para que a família e amigos, cada um de sua casa, dirijam sua atenção e preces ou pensamentos ao falecido e aos enlutados em torno. Pedir para que acendam uma vela em um mesmo momento e compartilhem por WhatsApp também é simbólico.

E na situação de um ente querido internado podemos:

Escrever uma carta (embalada em um saco plástico) ou fazer uma gravação em vídeo que possam ser entregues por profissionais de saúde, são duas ideias interessantes. Pedir que uma música especial seja tocada ou uma poesia seja lida, são outras. Ou seja, lembrar histórias, cantar canções, ler textos, agradecer pela vida daquele que está hospitalizado.

Confiantes no nosso processo de evolução, desejo que possamos passar por essa tribulação, com esperança de um amanhã melhor e reforçados na nossa fé de que que há um Deus no comando de tudo e de todos. Que assim seja!

Por Cristiane C Neves
Psicóloga Clínica Especializada em Luto
Fonte:
Medicina e Espiritualidade

30 janeiro 2021

Mar e Praia - Inácio Ferreira

 
MAR E PRAIA

Qual a água do mar toca a praia, e a encharca, assim é o Mundo Espiritual próximo, em relação à Terra.

Notemos que os banhistas, muitos deles, em seus trajes menores, à feição dos desencarnados, permanecem num estado de transição – continuam tão humanos que, quando logram se retirar da praia, deixam-na quase completamente repleta de lixo.

A praia, por assim dizer, é o “Umbral”, a Dimensão intermediária entre a cidade e o oceano – entre a Terra e o Mundo Espiritual livre.

Raros são os banhistas que, por saberem nadar, se aventuram mar adentro, distanciando-se da praia.

A esmagadora maioria, quando se vê fora do corpo, com receio do Infinito, não ousa mais que molhar os pés – depois de breve bronzeado, deliberam voltar à cidade e retomar a segurança de quem pisa em chão já conhecido.

Dando as costas para o Infinito, ou seja, para o Mundo Espiritual de natureza mais transcendente, opta pelo regresso à vida comum – toma um banho quente em casa e procura se livrar de toda e qualquer lembrança da areia das praias do litoral.

Não obstante, o oceano, ou seja, o Mundo Espiritual, em suas águas mais rasas ou mais profundas, permanece na expectativa de quem seja capaz de desbravá-lo.

Até o presente momento, poucos são os banhistas que, exímios nadadores, arriscam-se a ir um pouco mais longe, e, depois, retornam procurando encorajar os mais temerosos a não se contentarem com apenas molhar os pés, ou dormir sob as sombrinhas postadas na areia da praia.

Realmente, para que alguém se aventure mar adentro é preciso que tenha aprendido a nadar, e mergulhar, assimilando, inclusive, a técnica da flutuação.

Alguns têm tanto receio do mar que preferem, embora em trajes de banho, permanecer num dos bancos da calçada, à sombra de uma palmeira, repetindo de maneira inconsciente: - Eu quero a minha mãe!...

E é justamente esse desejo, o de querer a mãe, que faz muitos banhistas retornarem mais depressa às suas casas, entrarem num pijama e dormir ao barulho da maré...

Contudo, o mar permanecerá onde sempre esteve – desafiador. E quem não vencer o medo do Infinito nada conseguirá, por muito e muito tempo, mais que pisar na areia da praia e permitir que a água do oceano lhe toque os pés.

A praia é o “Umbral” dos espíritos que deixam o corpo – praia, diga-se de passagem, repleta da presença humana dos banhistas que não se preocupam com o meio ambiente.

O Espiritismo é excelente “escola de natação”, para que os futuros banhistas percam o medo das águas do oceano e comecem a bracejar na direção do Infinito.

Mas, por hora, o receio de afogamento vem predominando na maioria dos banhistas, que, como eu, literalmente, nunca puderam realmente aprender a nadar sequer numa piscina – eu tinha medo de afogar até debaixo do chuveiro, ou, quando era mais menino, até na bacia d’água em que minha mãe me colocava para que eu pudesse me livrar da poeira cotidiana de minhas traquinagens.

Todavia, é verdade que tem banhista na cidade que sequer nunca foi à praia – eu penso que deve ter medo de ser puxado pelas ondas do mar...

Por este motivo, meu caro, se você quiser, o Espiritismo também pode ser, para você e para muita gente, um “Manual de Natação”, que, talvez, quando você for à praia, consiga encorajá-lo a entrar no mar da Vida Mais Alta com a água lhe dando, pelo menos, à cintura.

Inácio Ferreira
Médium: Carlos A. Baccelli

29 janeiro 2021

Busca de mim mesmo (a): Preocupação ou Necessidade? - Adriana Machado

 
BUSCA DE MIM MESMO(A): PREOCUPAÇÃO OU NECESSIDADE?

Muitos se equivocam quando abraçam a preocupação, tendo como maior objetivo a busca de si mesmos. A bem da verdade, preocupar-se não é a palavra que deveríamos usar!

COMO AGIMOS NORMALMENTE

Cada um de nós busca o conhecimento de si mesmos nas verdades divinas e isso se dá, para cada um, por razões particulares: porque sente que algo está errado no mundo em que vivemos; que não pode haver somente violência, corrupção, injustiça ao nosso redor; porque tem de existir algo maior do que o que a gente enxerga... Na maioria das vezes, fazemos isso porque nos sentimos desamparados. 
 
Começamos a duvidar da providência divina e nos sentimos órfãos. E é exatamente porque não compreendemos o que está acontecendo ao nosso redor (no plano material) é que buscamos respostas que nos ajudarão a saber como agir (interna e/ou externamente) diante de tanta degradação moral, ética e intelectual. Mas, essas mazelas da sociedade nos incomodam também porque estão sendo flagradas em nosso mundo interior: a violência sentida em nosso coração; a revolta que assola o nosso eu diante das injustiças que presenciamos; a falta de empatia que enxergamos no outro, e até em nós mesmos, frente às necessidades do próximo... tudo isso e muito mais está em nosso mundo interior, mas que não eram sentidos como hoje.

HISTÓRIA DE NOSSA HUMANIDADE

Desde os tempos imemoriais, nós agimos assim, com corrupção, com violência, com imaturidade emocional e eu me pergunto: como somente agora estamos tão incomodados com algo que já existe desde sempre? Uma das respostas que podem ser dadas é que tudo isso estava longe de nós, não nos atingia diretamente, fazia parte da vida "dos outros". Mas, agora, tudo está escancarado: a violência está nas nossas portas; as guerras, a corrupção, em nossos lares (através da televisão, por exemplo), nos fazendo nos deparar com a nossa própria violência e corrupção (em patamares menores, mas dolorosos para quem se dizia íntegro)... E, frente a tudo isso, nossos sentimentos e emoções borbulham, nos incomodam.

SE INCOMODA, O QUE FAZER?

A verdade é que nada fazemos para mudar a nossa realidade se não nos incomodarmos com o que vemos e não nos aprofundarmos em nós mesmos para possíveis mudanças. Não somos obrigados a buscar, ou nos preocupar com o nosso mundo interior (que é uma parte nossa significativa que nos identifica com o mundo verdadeiro do qual viemos - o imaterial), mas, nós que nos propomos a isso, percebemos que esse encontro nos permite sentir uma paz íntima, apesar de todos esses tormentos. 
 
Nossos olhos se abrem um pouquinho mais para percebermos que tudo o que está acontecendo não é novidade para a humanidade e, ainda assim, Deus não nos abandona. Como dizia, desde os tempos imemoriais, a humanidade vive essas mazelas, mas, apesar disso, estamos crescendo. E percebemos isso porque nos sentimos crescer, através de nossas observações internas. E é por isso que chegou a hora de todos esses desvirtuamentos mundanos serem mostrados, escancarados para nós, porque já estamos tendo maturidade para vê-los e enfrentá-los.

O MUNDO EM QUE VIVEMOS

O plano material é um lugar maravilhoso, mas imaturo. Precisa de bons líderes, mas também precisa de um bom povo que mude muitos de seus conceitos sobre integridade, honestidade, merecimento... E isso só acontecerá se formos chacoalhados, balançados em nossas bases, em nossas zonas de conforto. Vivenciando e sentindo tudo isso, como ficaremos se não acreditarmos que estamos sendo protegidos, amparados pelo Criador? Tudo isso que desejamos (mudanças para a humanidade e para a nossa vida diária) só alcançaremos quando pudermos ter olhos para ver.

Leon Tolstói, afirmou em uma de suas obras que, "há quem passe pelo bosque e só veja lenha para a fogueira". Muitos só abrirão os seus olhos quando perceberem que tudo isso está vinculado também à sua vida imaterial, suas responsabilidades diante de suas escolhas diárias e a necessidade de vivenciarem todas as experiências de sua vida, percebendo como reagirão em relação às mesmas. Para muitos de nós, sem essas bases, nos sentimos angustiados, desmotivados, sem chão... sem esperança; nos sentiremos desmotivados, porque se os nossos olhos estiverem voltados somente para o que é útil (como a lenha), não perceberemos o que é necessário (a beleza e o lazer que o bosque proporciona e alivia a alma).

POR TUDO ISSO...

... buscar as verdades espirituais deixa de ser algo com que nos preocupamos e se torna algo que necessitamos, porque elas servirão como instrumentos para nos fortalecer diante dessa "dor" moral em que vivemos em nosso país e no mundo, e nos tornaremos proativos para que as mudanças ocorram. Se me perguntarem porque eu busco as verdades espirituais, eu respondo sem medo: é porque eu preciso compreender quem sou e ter a certeza de que o que parece ser o caos ao meu redor é tão somente Deus agindo para o esclarecimento de todos os Seus filhos.

Adriana Machado
Fonte:
Adriana Machado


28 janeiro 2021

Crimes Hediondos: É preciso armar a Sociedade para se proteger? - Richard Simonetti


CRIMES HEDIONDOS: É PRECISO ARMAR A SOCIEDADE PARA SE PROTEGER

1 – Sucedem-se acontecimentos funestos, envolvendo ações criminosas que chocam a opinião pública, como o assassinato da menina jogada do sexto andar de um edifício, em São Paulo. O mal está se expandindo?

Melhor dizer regredindo. Quando lembramos o circo romano, a escravidão, os tribunais inquisitoriais, as cruzadas, o assassinato de recém-nascidos com deficiência física e tantos outros crimes de lesa-humanidade, praticados outrora com a iniciativa dos governos e o aplauso dos governados, dá para perceber que houve progresso. Hoje essas atrocidades geram repulsa, como está ocorrendo em relação ao episódio citado.

2 – Não obstante, crimes hediondos continuam ocorrendo, em escala progressiva. Chega a ser assustador.

É preciso considerar que a população mundial, no início do século passado, era de aproximadamente um bilhão e seiscentos milhões de habitantes. Hoje está mais que sete bilhões, quase quatro vezes maior. Por isso, embora em menor proporção, tais crimes ocorrem em maior número. Por outro lado, há o espantoso desenvolvimento dos meios de comunicação. Acontecimentos funestos tornam-se universalmente conhecidos em questão de minutos, chocando a opinião pública. Antes, raramente ou tardiamente tomávamos conhecimento do que acontecia fora do âmbito de nosso Estado ou de nosso país.

3 – Isso é bom?

Emmanuel, em psicografia de Chico Xavier, diz que o comentário em torno do mal é sempre o mal a expandir-se. Milhões de pessoas maldizendo episódios dessa natureza, revoltadas contra os criminosos submetidos à execração pública, entram numa faixa de desajuste e favorecem a ação de Espíritos perturbados e perturbadores, a gerar novas atrocidades, como rastilhos de pólvora a detonar explosivos.

4 – É uma perspectiva preocupante. A própria indignação popular favorecendo a expansão do mal?

Quando se adensam as nuvens sobre uma cidade, logo desabam temporais violentos, chuva pesada, raios destruidores, causando sérios prejuízos. O mesmo acontece com a atmosfera psíquica. Se a população não cultiva os valores morais preconizados por Jesus, turva-se o ambiente psíquico, favorecendo a incidência maior de ocorrências policiais, inclusive crimes que chocam a opinião pública.

5 – Não é razoável a indignação popular diante de crimes hediondos, pressionando as próprias autoridades para que haja justiça?

Justiça sob pressão é coerção que favorece a injustiça. Em defesa da paz é preciso que a nossa justiça, como ensina Jesus, exceda o olho por olho, dente por dente, de Moisés, exercitada por escribas e fariseus.

6 – Qual é a proposta de Jesus?

Uma justiça inspirada na compaixão, que nos coloca no lugar dos que praticam o mal para entender que são irmãos nossos, necessitados, como ensina Jesus, de tratamento, não de execração.

7 – É impensável para a maioria da população encarar dessa forma os que se comprometem em atrocidades, agindo com requintes de crueldade.

Isso apenas demonstra quão distanciados estamos da moral evangélica. E se o criminoso fosse nosso filho? Não nos sentiríamos de certa forma culpados por não lhe termos oferecido uma orientação moral que o isentasse de tais comprometimentos? E ainda que tivéssemos a consciência tranquila, não nos compadeceríamos dele, procurando ajudá-lo ao invés de repudiá-lo? A fórmula de Jesus é perfeita: aprendamos a nos colocar no lugar das pessoas, reconhecendo a doença moral dos que se comprometem com o crime e a dor moral daqueles que estão ligados a eles pelos laços familiares e afetivos.

8 – E quanto às vítimas desses crimes tenebrosos? Qual a sua situação após a morte?

Todo aquele que desencarna na condição de vítima recebe amplo amparo dos benfeitores espirituais. Não obstante, nossa posição além-túmulo não depende do tipo de morte que soframos, mas do tipo de vida que levamos. As crianças constituem um caso especial. Sem nenhum comprometimento com vícios, paixões e ambições, já que são Espíritos acordando para a vida física, são imediatamente amparadas, sem maiores problemas de readaptação à vida verdadeira.

Richard Simonetti
Fonte
: Kardec Rio Preto

27 janeiro 2021

Males que vêm para o bem - Sidney Fernandes


 MALES QUE VÊM PARA O BEM

Paralítico de nascença, o magro doentinho, com oito anos de idade, não falava, não andava, não chegava a sentar-se, via muito mal, quase nada ouvia da esfera humana. O choramingo do menino enfermo inspirava piedade. André Luiz

Perguntei a Richard Simonetti:

— Como explicar que uma criança tenha uma doença grave ou terminal? Trata-se de castigo divino?

Respondeu Richard:

— A criança não está sendo castigada, nem punida, pois a lei divina não é punitiva e sim educativa. Nós estamos vendo o presente da criança, não estamos considerando aquele espírito que veio com comprometimentos do pretérito.

Sofrimentos pessoais ou de familiares abalam nossas convicções. Infelizmente, nem sempre as filosofias e religiões têm respostas consoladoras. Para melhor entendermos os mecanismos da vida, melhor seria se considerássemos a dor e a deficiência como reflexos de atos negativos que cometemos. Como assim? A criança da narrativa inicial nunca fez nada de errado. Como justificar esse sofrimento?

Fomos programados para o bem e para o equilíbrio. Todavia, se não correspondemos às regras divinas, desajustamo-nos espiritualmente. Se não encontramos justificativa para nossos sofrimentos na presente existência, surge a chave da reencarnação para indicar que, provavelmente, as causas das nossas dores residem em vidas pretéritas.

Dores físicas e morais desbastam nossas arestas e formam nossa experiência. Para nós, espíritos rebeldes e endividados, o sofrimento às vezes passa a ser o único caminho para a elevação.

Deus nos oferece diariamente oportunidades de conhecimento do bem, a fim de evitarmos o mal. Nem sempre, contudo, aproveitamo-nos desses meios, tornando-se necessárias providências mais amargas para que despertemos do orgulho, do egoísmo e da vaidade.

André Luiz continua com a narrativa a respeito do enfermo do início deste texto:

Há quase dois séculos, decretou a morte de muitos compatriotas numa insurreição civil. Valeu-se da desordem político-administrativa para vingar-se de desafetos pessoais, semeando ódio e ruínas.

Na espiritualidade, foi perseguido por suas vítimas. Muitas delas já o perdoaram, mas remanescem duas almas obstinadas, em processo final de transformação.

O outrora verdugo, revestido agora de piedosa criança, está em fase final de resgate. A presente encarnação completará sua cura efetiva.

Voltemos a Simonetti:

Essa breve existência vai representar uma espécie de escoamento dos desajustes perispirituais que esse espírito acumulou no passado, para que, numa próxima encarnação, ele possa vir em melhores condições.

Fiquemos com as sábias palavras de Eckhart Tolle:

O sofrimento é necessário até que você se dê conta de que ele é desnecessário.

Sidney Fernandes – 1948@uol.com.br
Fonte: Kardec Rio Preto

26 janeiro 2021

A inevitável solidão humana - Leda Maria Flaborea


A INVEVITÁVEL SOLIDÃO HUMANA

Diante do aparente silêncio do Universo, o homem encontra-se absolutamente só. De todos os seres da Natureza, somente ele vive só, porque deve viver consigo mesmo. E é natural que assim seja, pois é o único que pode, através do processo evolutivo ao qual se encontra submetido, ser consciente da sua condição de criatura, do mesmo Criador de tudo que existe ao seu redor. Essa condição se ser consciente, portanto pensante e responsável pelos seus pensamentos, é o que o diferencia de todos os outros seres viventes que habitam o Universo e aonde mais o imaginário de cada um puder levar.

Nessa condição, tornamo-nos assim – homens que somos – diferentes entre si por características que nunca se repetem, pois inerentes à condição de criaturas divinas e juízes dos próprios atos. Apenas nós e somente nós nos condenamos, nos absolvemos, criando para nós as punições que tantas vezes nos martirizam a existência, num processo de culpas que parece não ter fim. Nem mesmo o deus punitivo, celebrado por diferentes crenças, é capaz de tanta perversidade quando se trata de punir faltosos. Não necessitamos de advogados que nos defendam, nem de promotores que nos acusem. Nossos atos representam todo um processo de acusações ou aprovações pelos quais nossa consciência, juiz implacável, nos demandará as penas que se fizerem justas. Está aí, certamente, o maior erro que cometemos. Autoflagelamo-nos psiquicamente, criando quadros de punições que se refletem, com o tempo, nas doenças do Espírito e do corpo material. Doenças psíquicas inexplicáveis, doenças físicas de diagnósticos impossíveis...

Orgulho e egoísmo são certamente duas molas que movem os homens nesse julgamento. Imaginando-se sabedor de todas as coisas, não admitindo errar e vendo-se diante do fato inconteste, impõem-se penas tão severas como a mostrarem a si próprios que podem suportá-las, porque se julgam mais fortes e mais corajosos diante das tribulações inerentes à existência terrena. Não têm misericórdia para consigo e não terão, certamente, para com os outros. Penas brandas ou perdão pelos próprios erros não fazem parte das atitudes de quem se julga mestre, e não aprendiz da Vida. Essa posição, na maioria das vezes inconsciente, acaba por levar a comportamentos de rebeldia, inconformismo e intolerância para com tudo e com todos que os cercam, como vítimas perenes da existência. Tempo roubado na caminhada evolutiva...

Ninguém consegue penetrar nesse recesso, e somente na solidão de suas experiências e lembranças podem os homens encontrar-se consigo mesmos e com Deus. Essa viagem interior é absolutamente necessária, mais cedo ou mais tarde, mas deve ser feita sempre sozinha. Impossível ser de outra forma. Pretender fugir à própria consciência é tarefa inútil. Talvez se consiga por algum tempo, mas mesmo quando acreditamos não ter que prestar contas de nossos atos a quem quer que seja, nem ao nosso juiz interior, percebemo-nos falando sozinhos. Sozinhos? Realmente alguém fala sozinho? E quem é esse interlocutor com quem falamos? Por ventura, não será nossa consciência a nos direcionar caminhos?
As ciências humanas nos dizem que o homem é um ser gregário e isto é um fato. Em nenhuma outra circunstância podem-se colocar em prática os valores morais indispensáveis à nossa evolução, a não ser na troca e nas oportunidades que surgem, quando nos relacionamos com o outro. Entretanto, as resoluções que tomarmos ao vivenciar esses valores serão, incontestavelmente, individuais e, nesse momento, ninguém, absolutamente ninguém, deverá interferir sem que com isso acarrete prejuízos para ambos. A decisão de um ao aceitar ou não as sugestões do outro será de sua total responsabilidade, porque será sua a escolha; o outro, ao sugerir o que quer que seja, estará assumindo diante de sua consciência a responsabilidade por todas as consequências que advierem de sua interferência.

É importante não se perder de vista que ao falarmos de interferência não incluamos as amorosas orientações que recebemos dos que nos querem bem e que nos acenam, dentro do possível, com possibilidades que nos permitam escolhas acertadas ou, ao menos, com menores chances de erros e, portanto, com menores comprometimentos futuros. Se para quem ouve e segue as sugestões recebidas a responsabilidade é grande, para quem orienta ela não é menor, pois em nome desse bem querer quantos enganos se tem cometido. Nesse momento, somente o bom senso, o comedimento e o equilíbrio devem ser as molas propulsoras de cada ato, de ambas as partes, quando existirem as condições de discernimento para tal.

Sempre a escolha para o Espírito... Sempre a solidão do Espírito...

Mas, mesmo sendo o homem um ser gregário, se tivermos o olhar um pouco mais atento, perceberemos esse ser só. Igual a todos os corpos do Universo, os homens se atraem e se repelem num constante movimento de aproximação e afastamento. Tantos chegam e passam em nossas existências. Seres simpáticos ou não, respirando a mesma atmosfera de desejos e ideais, ou contrários às nossas expectativas, vão e vêm, enriquecendo-nos sempre, porque aprendemos sempre, mesmo que só venhamos a nos dar conta disso muito mais tarde. Todavia, apesar de toda movimentação ao nosso redor, permanecemos sozinhos.

E como assusta essa solidão para aqueles que confundem essa intrínseca necessidade com a ausência constante ou não de pessoas ao redor! Quantos buscam permanecer na superficialidade das relações por medo de estarem sós... Sensação de abandono ou profundo receio de ficar só consigo mesmo que se traduz, muitas vezes, pela aceitação de qualquer coisa, em lugar de nenhuma. Perde-se qualidade com a ilusão de se ganhar em quantidade; banalizam-se ideais e esperanças em troca da não tomada de posição perante seu juiz interior. Porém, cedo ou tarde, teremos de nos colocar frente a frente com nossa consciência.

Entendemos claramente essa imensa dificuldade que o ser humano tem em não enxergar a riqueza do seu mundo interior, postergando esse encontro com seu íntimo; de não se sentir capaz de realizar dentro de si as mudanças necessárias que o levarão a entender, de vez, que pode caminhar junto com outros, embora totalmente isolado na sua individualidade.
 
Se a troca é imperativa ao crescimento, ela é também igual para todos. Uns caminham já à nossa frente; outros, todavia, ainda se encontram mais atrás. Entretanto, existe a imensa massa de seres que como nós prosseguem com as mesmas dificuldades, em busca do progresso. Podemos, certamente, nos dar as mãos ajudando-nos mutuamente, amparando-nos uns aos outros, até mesmo nos solidarizando, mas ninguém caminhará por nós. É tarefa individual, intransferível e absolutamente solitária.

Leda Maria Flaborea 

25 janeiro 2021

Preocupações e Morte - Joanna de Ângelis


PREOCUPAÇÕES E MORTE

Vives os impositivos da carne em regime de absoluta submissão, como se a neblina material que te envolve não se diluísse ao impacto da morte.

Entregas-te às preocupações imediatas qual molusco aderido a rocha, como se a existência física não fosse um breve instante da vida plena, diante da qual te colocará a morte.

Afadigas-te com as opiniões alheias sofrendo dores não programadas, como se os conceitos dos outros pudessem acompanhar-te além da morte.

Pensas no futuro, envidando esforços e sacrifícios infindáveis para o dia de amanhã, sem lembrares que ele termina por aqui, para recomeçar depois da morte.

Experimenta as angústias que se multiplica na vestimenta celular, mas amas o corpo de tal modo que o negarias se pudesses, para a viagem da morte.

Conceituas o mundo como ingrato e cruel, onde o amor não viceja e a bondade não produz frondes, mas o aceitas como se não te libertasses dele ao chamado inexorável da morte.

Programas tarefas e ensaias atividades, perdido no turbilhão do carro somático, emprestando à existência colorido mentiroso que se desmancha ao fragor da morte.

* * *

Muitos desavisados consideram os discípulos da codificação kardequiana como um grupo de pessoas frustradas em franco desequilíbrio mental, porque eles falam sobre a morte, pensam na morte, esperam a morte, qual se conhecessem a vida depois da morte.

E a verdade é que os espiritistas conhecem realmente o continente estuante de vida que se alonga além das vibrações do decesso carnal.

Mensageiros da erraticidade lhes falaram das realidades do após túmulo, ensejando-lhes meditações apuradas sobre os valores legítimos e os imaginários que acompanham o espírito na vida futura.

Para tais, o corpo, vestimenta temporária, merece o que vale. Indumentária que carece de respeito e zelo, conservação e cuidado, amizade e gratidão.

Crescer através do corpo - é o seu lema - em vez de viver para o corpo.

O corpo é oportunidade. Liame entre o berço e o túmulo, facultada entrada e saída da vida física no processo incessante do evoluir.

Não te atenhas as questiúnculas passageiras do domicílio corporal.

Unge o coração de amor e alça a mente aos elevados programas da vida exuberante, preparando-te sempre para a desencarnação, matando lentamente vans ambições, infelizes querelas e secundários valores.

Fiandeiros da inutilidade gastam o tempo na roca da ilusão.

Operários da atividade reta despertam com os instrumentos do dever movimentados nas mãos.

Não te deixes consumir. A vida real é além da morte, onde se programam tarefas, ajusta-se roteiros e se organizam atividades... A erraticidade é a esfera das causas...

* * *

Quando o Sublime Governador da Terra corporificou entre os homens, considerou o trabalho atendendo aos impositivos da ação na comunidade; respeitou a indumentária, submetendo-se as contingências da época; manteve amigos em círculo de afeição, atento à vida em sociedade; aceitou problemas comuns, compreendendo as limitações mentais dos que o cercavam; mas, sobretudo, preparou-se para o serviço de salvação dos espíritos, entregando-se, Ele mesmo, às maiores renúncias, às mais pungentes dores, às mais graves aflições para, através da cruz, em morte imerecida, atestar que as fronteiras do Reino da Alegria Perfeita começam com as primeiras tintas da madrugada, que brilha na esfera excelsa da Imortalidade, depois de todas as preocupações, vencida a morte...

Joanna de Ângelis
Psicografia de Divaldo P. Franco
Livro: Dimensões da Verdade - 33


24 janeiro 2021

Distorções – Orson Peter Carrara


DISTORÇÕES

Sabemos bem o que é o Espiritismo?

Embora lamentável o que se vem assistindo no movimento espírita – igualmente contagiado por fatores estranhos à sua genuína proposta, como acontece em tantos segmentos –, é natural que aconteça, face à imaturidade que ainda nos caracteriza. Muitos já reconhecemos sua real natureza e seus objetivos, mas seduzidos por interesses e paixões variadas, ainda nos mostramos incapazes de viver o que sabemos. A essência do Espiritismo está na caridade em sua ampla configuração, não restrita – é claro – à doação de bens materiais passageiros, mas sim e especialmente na atenção, na gentileza, no acolhimento (presente no abraço, no aperto de mão, no estímulo sincero em favor da felicidade alheia por exemplo), e também na fé e na esperança que se materializam na postura de retidão, na solidariedade e no respeito que nos devemos mutuamente, de vez que todos precisamos uns dos outros. E conforme encontramos no item 292 de O Livro dos Médiuns, o objetivo principal, prioritário, do Espiritismo está na nossa melhora moral, ou, em outras palavras, nos esforços que possamos desenvolver na aquisição de virtudes e na superação das más tendências.

Infelizmente, porém, nos dividimos, levados por fanatismos momentâneos ou visões distorcidas da realidade que conseguimos assimilar, iludidos que ainda estamos por posições, imposições, por ideias ou posturas dispensáveis, pois que incompatíveis com a moral de Jesus. Será uma ilusão de domínio de consciências alheias, será fruto do orgulho que ainda nos caracteriza ou da vaidade que se permite cultivar? Não sei exatamente, cada um descobrirá dentro de si mesmo tais razões, já que só o tempo nos levará ao amadurecimento que se busca.

Felizmente, porém, por outro lado, tudo isso é ação humana, bem própria de nossa mediocridade moral, e que nada tem a ver com a grandeza da Doutrina Espírita. Esta sim, impecável, inatacável e que recebe os impactos ingratos de todos nós, os espíritas, que embora reconheçamos devidamente sua grandeza e benefícios em favor da humanidade, que poderíamos multiplicar continuamente, permitimo-nos contagiar pela vaidade, pelo egoísmo ou pelo ciúme, e simplesmente iludidos por tolas e dispensáveis pretensões para quem pretende afirmar-se discípulo de Jesus.

Isso é pessimismo? Não! Absolutamente! É até um processo natural, bem próprio de aprendizados que nos amadureçam. Mas grita dentro de nós um apelo ao bom senso, ao discernimento, virtudes que tão bem caracterizaram a inigualável personalidade de Allan Kardec. Seja por gratidão à própria vida, ou aos exemplos marcantes de nomes veneráveis (e quantos não são?!) que abriram os primeiros caminhos e os mantiveram íntegros. Vamos, pois, rever os caminhos? Já não é hora de nos mostrarmos coerentes, agindo dentro da ética que aprendemos com o Espiritismo?

Sei que essa reflexão será ignorada ou desprezada pela maioria – somos assim mesmo, é de nossa natureza, nunca achar que somos nós os protagonistas de ações em desserviço do Espiritismo e que isso é culpa dos outros, nunca somos os responsáveis –, apreciada por outros com reserva e assimilada por minoria muito significativa, mas isso é secundário. O que é preciso é que se fale. Quem sabe um mínimo trovão consiga despertar alguns, até o próprio autor, sujeito também a equívocos de todo tipo, como criatura humana também em lutas.

O lamento, porém, é pela supervalorização de ações (e aqui é um universo delas) sempre em detrimento do estudo e da consciência doutrinária – que esclarecem e orientam –, substituindo prioridades por interesses que estimulam vaidades e supremacias, criando exércitos que seguem pessoas e não o Espiritismo, quando deveria ser o contrário, face à nossa condição de criaturas falíveis.

Mas a Lei do Progresso é determinante. Não há como impedi-la. A vida nos colocará devidamente no lugar no tempo certo, quando então deveremos rever posturas e reparar os estragos que causamos com nossas vãs e tolas pretensões. Felizmente, porque nos levará à maturidade de consciência que estamos tentando construir.

Mas a história pode ser diferente desde já. Basta o olhar da humildade e da constatação de nossa própria fragilidade, aprendizes ainda incapazes de domar a si próprios. 

Orson Peter Carrara

23 janeiro 2021

O Evangelho e o “Novo” - Yé Gonçalves


O EVANGELHO E O "NOVO"

Constantemente escuto alguns companheiros ou companheiras de jornada espírita, após um seminário ou uma palestra pública, ou outro determinado evento, fazerem o seguinte questionamento:

– O que o facilitador, orador, expositor ou palestrante trouxe “de novo” do Evangelho?

Essa interrogação soa, aos meus abençoados ouvidos, em forma de eco, e me leva a trocar miúdos com os meus botões:

– O que o Evangelho tem “de novo”? Será que foi aumentado ou retirado um til ou um jota da tão devassada fonte de conhecimentos sublimes para a vida eterna?

E, logo após, volto os meus ditos sentidos normais ao chão da fábrica do nosso movimento espírita e percebo que há uma preocupação, até alarmante, de muitos confrades e confreiras, na busca de facilitadores, expositores ou palestrantes ilustres, de oratória cuja eloquência acima do normal, proferindo seminários, exposições ou palestras espetaculosos, e que tragam o “novo” do Evangelho de Jesus.

Por que trazer o “novo” do Evangelho, se o Evangelho é sempre “novo”?

Por que não trazer apenas o Evangelho na sua pura simplicidade?


* * *

Se observarmos que o Evangelho é a boa nova, ou se preferirmos, a boa notícia do reino de Deus, e que é o nosso principal manual de trabalho de aperfeiçoamento moral e espiritual, concluiremos que Ele é sempre “novo”, sempre atual.

Então, caro leitor, com base na lógica, a pergunta que sugiro seja elaborada é o inverso, assim vejamos:

– O que “de novo de mim mesmo” estou extraindo do Evangelho a cada dia, numa perspectiva de evolução de minha visão em relação ao seu conteúdo?

– Em cada contato com o estudo do Evangelho, eu estou me tornando uma pessoa renovada, estou me tornando um “homem novo”?

Logo, a questão é que, se diante dos desafios das sendas evolutivas da vida, estou deixando emergir “o novo de mim mesmo” com base nos ensinamentos evangélicos. Se eu estou me tornando “novo” a cada instante.

Se eu estou me tornando “novo” no pensar e no agir, bem como na visão da verdade da vida e de mim mesmo.

Se eu estou me tornando “novo para mim mesmo”, domando as minhas más inclinações ou más tendências, transformando-as em atos de bondade, de misericórdia.

Então, nessa perspectiva, o “novo” deve partir de cada um de nós, da maneira como estamos vivenciando o Evangelho nas tarefas do cotidiano, ou seja, na administração do lar, da empresa, da conduta no trabalho profissional, no trânsito, na forma de se expressar e de posicionar-se diante de tal assunto, situação ou acontecimento, dentre outros exemplos.

E assim, não mais preocuparemos com o que “de novo” os oradores, expositores, facilitadores e palestrantes trarão do Evangelho; mas, acima de tudo, o que cada um de nós estará levando “de novo” para uma melhor compreensão do Evangelho, e dessa forma colaborando positivamente, em vibrações fraternais, com os trabalhos dos oradores, facilitadores, expositores e palestrantes em trazer “o novo de si mesmo”, a fim de despertar “o novo” de cada espectador ou telespectador, acerca do Evangelho que é sempre “novo” e sempre a fonte de renovação e de redenção de nós outros, espíritos imortais, na eternidade do aprendizado constante da vida.


Yé Gonçalves
Fonte:
Agenda Espírita Brasil


22 janeiro 2021

A saudade como um bálsamo de luz - Adriana Machado

(
Saudade (1899), por Almeida Júnior)
 
A SAUDADE COMO UM BÁLSAMO DE LUZ

Um dia, eu estava sentindo muita saudade de alguém especial e percebi que isso trazia muita tristeza ao meu coração.

Chorei um pouco em razão das lembranças que parecem estar sempre vinculadas à saudade e que, por vezes, maltratam o espírito e que nos fazem perceber que poderíamos ter aproveitado melhor a presença daquela pessoa que nos era, ou ainda é, tão preciosa.

Em determinado momento daquele processo de dor, tive a benção de poder escutar um espírito amigo que me disse: “Que bom que você sente saudade!” Eu respondi no impulso: “Mas, ela me entristece, me traz dor...” Então, ele continuou: “Mas, ela demonstra que o amor que vocês construíram nesta existência fez valer cada experiência vivida. Você preferiria não tê-la em sua vida só para evitar agora a dor da separação? Sentir tristeza é natural, tente somente não exacerbar o sofrimento alimentado por você nestes momentos”.

Eu nunca tinha pensado assim. Eu sabia, por já me ter sido explicado antes, que o sofrimento era uma escolha minha (já até comentei em outros artigos desse blog), mas pensar que a saudade era um reflexo de algo maravilhoso, nunca!

Quantas vezes nos deparamos com situações que nos fazem sentir como se o mundo ao nosso redor estivesse desabando e não sobreviveríamos a mais um dia? Quantas vezes, alimentamos um sofrimento desenfreado por acreditarmos que aquela “perda” foi um golpe da vida contra nós?

Se pudéssemos compreender que todas essas intempéries são alavancas para o crescimento de nosso ser, talvez, não nos sentíssemos tão desamparados!

Pensando na mensagem daquele amigo espiritual, a saudade é um momento de luz que, na maioria das vezes, transformamos em trevas através do sofrimento. Se entendermos que a saudade é o resultado positivo de nossos sentimentos pelo outro, que não está mais tão perto de nós, e que foi construída em razão de nossos esforços coletivos e diários para nos superarmos naquilo que ainda não compreendemos ou não colocamos em prática, talvez a possamos ver como um momento gratificante de nosso viver e não sofrer tanto por isso.

E não estou falando somente de sentir saudade de pessoas queridas, que desencarnaram ou estão longe de nós, mas também de lugares, de situações que vivemos e que gostaríamos de vivenciar mais um pouquinho, por nos ter feito sentir muito bem.

A saudade é um aviso nosso para nós mesmos dizendo que conseguimos amar alguém, que conseguimos viver um momento ou uma circunstância em que nos permitimos sentir a felicidade, nos sentir mais realizados, mais donos de nossos destinos...

A saudade é como um alerta para nós daquilo que realmente vale a pena termos em nossa vida, não como um retorno ao passado, mas como uma viagem ao futuro com o ser modificado que já nos transformamos, e com as pessoas e circunstâncias que nos são de grande valor e que estão conosco em nosso presente.

A saudade é como um sentimento que nos assola, vez por outra, para nos lembrar que podemos fazer algo que antes não nos sentíamos capazes de fazer (amar esse alguém) e que agora já é passível de ser vivenciado mais e mais se assim o desejarmos (viver, dividindo com o outro ou consigo mesmo aquilo que nos completa).

Mas, enquanto não aprendermos que o sofrimento é diferente da dor, que aquele é uma construção pessoal e que a sua intensidade somos nós que determinamos, ainda não conseguiremos enxergar a luz que se dá a cada momento da saudade.

Quem já não sorriu quando teve lembranças de momentos vivenciados com alguém que já se “foi”? Esse é um momento de luz! Quem já não agradeceu a Deus por ter tido essa pessoa em sua vida, apesar de agora ela não poder mais estar ao seu lado? Esse é um outro momento de luz! Quem não fez outros planos para adaptar a sua vida a uma circunstância baseada na saudade dos sentimentos vivenciados? Tudo isso é luz! Tudo isso nos traz saudades e, se desejarmos, também a felicidade.

Quero deixar claro que, em nenhum momento, devemos nos criticar ou julgar por sentirmos tristeza pela ausência de quem amamos ou pela impossibilidade de vivenciarmos aquela circunstância que desejamos uma vez mais em nossa vida, isso é natural. Contudo, que não transformemos a saudade em um momento de sofrimento, e sim a enxerguemos como uma reação que nos leva a valorizar tudo aquilo que foi importante para nós e ainda é.

“A saudade é um bálsamo de luz, quando bem a entendemos”, - disse-me um espírito amigo.
 
Adriana Machado

21 janeiro 2021

O que são Espíritos Agêneres? - Tereza Cristina D'Alessandro


O QUE SÃO ESPÍRITOS AGÊNERES

O que é um agênere? É uma aparição em que o desencarnado se reveste de forma mais precisa, das aparências de um corpo sólido, a ponto de causar completa ilusão ao observador, que supõe ter diante de si um ser corpóreo.

Esse fato ocorre devido à natureza e propriedades do perispírito que possibilitam ao Espírito, por intermédio de seu pensamento e vontade, provocar modificações nesse corpo espiritual a ponto de torná-lo visível.

Há uma condensação (os Espíritos usam essa palavra a título de comparação apenas) tal, que o perispírito, por meio das moléculas que o constituem, adquire as características de um corpo sólido, capaz de produzir impressão ao tato, deixar vestígios de sua presença, tornar-se tangível, conservando as possibilidades de retomar instantaneamente seu estado etéreo e invisível.

Para que um Espírito condense seu perispírito, tornando-se um agênere, são necessárias, além da sua vontade, uma combinação de fluidos afins peculiares aos encarnados, permissão, além de outras condições cuja mecânica se desconhece. Nesses casos a tangibilidade pode chegar a tal ponto que é possível ao observador tocar, palpar, sentir a resistência da matéria, o que não impede que o agênere desapareça com a rapidez de um relâmpago, através da desagregação das moléculas fluídicas.

Os seres que se apresentam nessas condições não nascem e nem morrem como os homens; daí o nome: agênere - do grego: a privativo, e géine, géinomai, gerado: não gerado, ou seja, que não foi gerado.

Podendo ser vistos, não se sabe de onde vieram, nem para onde vão. Não podem ser presos, agredidos, visto que não possuem um corpo carnal. Desapareceriam, tão logo percebessem a intenção diferente ou que os quisessem tocar, caso não o queiram permitir.

Os agêneres, embora possam ser confundidos com os encarnados, possuem algo de insólito, diferente. O olhar não possui a nitidez do olhar humano e, mesmo que possam conversar, a linguagem é breve, sentenciosa, sem a flexibilidade da linguagem humana. Não permanecem por muito tempo entre os encarnados, não podendo se tornar comensais de uma casa, nem figurar como membros de uma família.


Transcrevemos a seguir um exemplo extraído da Revista Espírita de 1859 - Fevereiro (EDICEL):

"Uma pobre mulher estava na igreja de Saint-Roque em Paris, e pedia a Deus vir em ajuda de sua aflição. Em sua saída da igreja, na rua Saint-Honoré, ela encontrou um senhor que a abordou dizendo-lhe: "Minha brava mulher, estaríeis contente por encontrar trabalho? - Ah! Meu bom senhor, disse ela, pedia a Deus que me fosse achá-lo, porque sou bem infeliz. - Pois bem! Ide em tal rua, em tal número; chamareis a senhora T...; ela vo-lo dará." Ali continuou seu caminho. A pobre mulher se encontrou, sem tardar, no endereço indicado - Tenho, com efeito, trabalho a fazer, disse a dama em questão, mas como ainda não chamei ninguém, como ocorre que vindes me procurar? A pobre mulher, percebendo um retrato pendurado na parede, disse: - Senhora, foi esse senhor ali, que me enviou. - Esse senhor! Repetiu a dama espantada, mas isso não é possível; é o retrato de meu filho, que morreu há três anos. - Não sei como isso ocorre, mas vos asseguro que foi esse senhor, que acabo de encontrar saindo da igreja onde fui pedir a Deus para me assistir; ele me abordou, e foi muito bem ele quem me enviou aqui.

O Espírito São Luiz consultado a respeito, forneceu instruções muito interessantes:

• Reafirma: - não basta a vontade do Espírito; é também necessário permissão para ocorrer o fenômeno.
• Existem, muitas vezes na Terra, Espíritos revestidos dessa aparência.
• Podem pertencer à categoria de Espíritos elevados ou inferiores.
• Têm as paixões dos Espíritos, conforme sua inferioridade; se inferiores buscam prazeres inferiores; se superiores visam fins elevados.
• Não podem procriar.
• Não temos meios de identificá-los, a não ser pelo seu desaparecimento inesperado.
• Não têm necessidade de alimentação e não poderiam fazê-la; seu corpo não é real.


Encerrando nosso estudo sobre os agêneres, relembramos que, por mais extraordinário que possam parecer, esses fatos se produzem dentro das leis da Natureza, sendo apenas efeito e aplicação dessas mesmas leis. Recomendamos aos leitores continuem a pesquisa sobre o tema nas Obras Básicas e na Revista Espírita, Fevereiro de 1859, 1860 e 1863.

Tereza Cristina D'Alessandro
Fonte:
Letra Espírita


Bibliografia:

KARDEC, Allan - O Livro dos Médiuns: 2. ed. São Paulo: FEESP, 1989 - Cap VII - 2ª Parte.
KARDEC, Allan - Revista Espírita - 1859 - Fevereiro: 1. ed. São Paulo: EDICEL, 1985.


20 janeiro 2021

A experiência dolorosa da perda e do luto de todos os matizes grita na nossa face - Florencio Anton

A EXPERIÊNCIA DOLOROSA DA PERDA E DO LUTO DE TODOS OS MATIZES GRINA NA NOSSA FACE

O analfabetismo tripudia das nossas lives, a fome espiritual e orgânica satiriza nosso lema “fora da caridade não há salvação.”

Meus amigos espíritas,

Hoje eu assisti angustiado a uma reportagem no YouTube sobre a morte de uma juíza, pelo seu ex-marido, no Rio de Janeiro, na frente de suas filhas. Sem nenhuma demagogia, devo dizer que orei por todos mas o choro ainda está está entalado na garganta.

Isso me mobilizou a perguntar se vocês já se deram conta do contexto desafiador que estamos vivendo? Não?!!!!! Tentarei demonstrar com alguns indicadores:

  • 190. 795 mortos pela COVID 19 de março a dezembro;
  • 329 mortes de homossexuais somente em 2019 o que equivale a 1 morte a cada 26 horas;
  • Entre março e agosto 497 mulheres perderam a vida; tivemos um feminicídio a cada nove horas;
  • Por dia são registradas 233 agressões contra crianças no nosso país;
  • O suicídio é a terceira causa de morte de jovens e adolescentes brasileiros entre 15 e 19 anos, compondo um quadro de cerca de 12 mil suicídios por ano em nosso país;
  • Da nossa população 13,5 milhões de pessoas vivem na miséria…
  • Mais de 20 milhões de hectares da Amazônia, do cerrado da mata atlântica e do pantanal foram dizimados por queimadas…


Citando apenas alguns…

O fato é que a triste realidade se nos impõe de tal forma que chego a pensar mesmo que a vida exige, hoje, de nós religiosos , uma espécie reposicionamento conceitual e consequentemente ação social transformadora. A experiência dolorosa da perda e do luto de todos os matizes grita na nossa face, o analfabetismo tripudia das nossas lives, a fome espiritual e orgânica satiriza nosso lema “fora da caridade não há salvação” e nós que nos ufanamos de uma fé raciocinada temos nos entregado a um modelo sub-reptício de afastamento da realidade refletido em frases de efeito, pinçamentos do corpo teórico Kardequiano, mensagens de espíritos, tertúlias evangélicas que lembram, com a rogativa de perdão aos mais sensíveis, um farisaísmo moderno bem a moda de jargões políticos do “fala bem mas não faz nada.”

Se o pensar é a natureza da filosofia e a nossa doutrina pode ser considerada uma filosofia religiosa ou uma religião filosófica, não podemos nos esquecer de que a filosofia existe para pensar e transformar vidas, ou seja, é tarefa do espírita promover, com os instrumentais argumentativos de que dispõe, transformações sociais. O que estiver fora disso é tentativa de catequese barata!

Trago aqui o pensamento muito apropriado do professor Mário José dos Santos do departamento de filosofia da UFJF que dizia: crescer significa fazer da sua vontade livre aquilo que permite o seu ser realizar da melhor maneira possível o que lhe é peculiar, próprio e específico. O ser humano não é só o seu corpo e suas vaidades, mas é, sobretudo, uma dimensão racional. Pensar é preciso porque, sem essa opção interior, viver não é possível. ”

O momento atual então requer de nós um pensamento que reflita uma espécie de exercício filosófico da vida e para a vida.

O momento é o de contextualização de nossas falas e adequação das mesmas á realidade de sofrimento que nos cerca.

O momento não é de teoria e teologia apenas, lembremo-nos de que as teorias se consubstanciam nos laboratórios diversos e o nosso, meus amigos, o nosso laboratório é a sociedade.

Um padre fundador de uma ordem dos enfermeiros chamado Camillo de Lelis trazia como lema “mais coração nas mãos meus irmãos.”

Interpreto assim: menos palavras sobre o amor e mais ações de amor. Resiliência e resignação sim!!! Conformismo e logorréia jamais!!!! Hoje, mais do que nunca a realidade nos pede uma avaliação severa do sentido de utilidade de nossas falas.!!!!

Nessa sociedade do conhecimento e do consumo é preciso demonstrar a aplicabilidade prática de Jesus sob pena de que, se assim não for, o nosso discurso não passe de um amontoado de palavras bonitas quanto a forma mas vazias quanto ao conteúdo.

Não fiquem chateados comigo não, nem me mandem indiretas! (risos). Podem discordar á vontade!!!! Beijos com carinho!!!!!

Florencio Anton
Fonte: Porta Casa Espírita Nova Era


19 janeiro 2021

Sim, somos racistas! - Marcelo Henrique Pereira

(Arte mensagem divulgada pela FEB no dia 20/11)
 
SIM, SOMOS RACISTAS!

Somos racistas quando maquiamos o discurso de ódio, inventando justificativas para o injustificável.

Somos racistas quando “torcemos o nariz” para programas econômico-financeiros de inclusão social, com discursos abrandados de meritocracia, quando a “lei da vida” nos impulsiona, desde as espécies do reino animal, a prover as necessidades dos hipossuficientes. “O forte deve amparar o fraco”, como contido em “O livro dos Espíritos”.

Somos racistas quando nos sentimos ameaçados ao vermos uma pessoa preta se aproximar de nós, na rua.

Somos racistas quando percebemos que alguém sofre algum prejuízo em dada oportunidade, nos cenários sociais, e não dizemos e nem fazemos nada!

Somos racistas quando visualizamos que alguém olha para outrem, de outra cor, com suspeita ou prevenção, e não a acolhemos nem nos posicionamos contrariamente a tal atitude.

Somos racistas quando atribuímos papéis ou funções, em espaços de integração, como a praia, o avião, o shopping, a determinadas pessoas simplesmente em razão da cor da pele, como a servidão em espaços de transporte, limpeza, lazer ou comida, por exemplo.

Somos racistas quando buscamos nos justificar como não-racistas, com o discurso pronto de que temos, em nossos círculos familiares ou de amizade, pessoas de outra cor.

Os reflexos racistas estão por toda a parte, em múltiplas faces! E se amplificaram, tanto no Brasil, quanto nos Estados Unidos, com o retorno a discursos, candidaturas e gestões marcadas pela exclusão, pelos preconceitos em geral (não somente o étnico) e pela violência no discurso e na prática. No segundo, a eleição (ainda não oficialmente encerrada, mas que já proclamou um vencedor), ao que parece, há avanços. Espera-se que, por aqui, logo à frente, também hajam.

Em um estudo publicado pelo Instituto DataFolha, em 2019 e realizado pela Oxfam – Percepções sobre desigualdades no Brasil de 2019 – para a população brasileira em imensa maioria (72%) a cor da pele seria o elemento definidor da contratação por parte de empresas; para 81%, um número ainda superior, os pobres pretos sofrem mais do que os brancos e a raça define o tipo e o nível da abordagem policial. Exatamente como ilustra o caso no supermercado, ocorrido esta semana. É o racismo “fora do armário” e a desconstrução do mito do não-racismo.

Um dado significativo da esperança pela mudança (de mentalidade e de comportamento) está no relatório, de 2018, da Associação Nacional de Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior, que declinam que 70,2% dos estudantes de universidades públicas federais vêm de famílias com renda mensal per capita inferior a um salário mínimo, 64% são egressos de escolas públicas e 52,1% são pretos.

Antes que haja, também em relação a este texto, alguma sombra de preconceito, vou justificar porque estou utilizando PRETO ao invés de NEGRO. Em um depoimento tocante e necessário, que circula na internet, um ganês de nascimento que vive há mais de trinta anos, no Brasil, e já entendeu a cultura brasileira e, por extensão, a forma de manifestação, o palavreado, a riqueza (ou nem tanto) das expressões do nosso vernáculo e a utilização de expressões em dados contextos, assim se pronuncia:

“Tem uma coisa que eu não compreendo no Brasil. No tempo da escravidão, os negros e os indígenas brasileiros eram chamados de negros da terra. Isto até 1755, quando se aboliu a palavra negro para indígenas, porque proibiu a escravidão de índios.

O Brasil usa palavras como a lista negra, o dia negro, magia negra, câmbio negro, vala negra, mercado negro, peste negra, buraco negro, ovelha negra, fome negra, humor negro, nuvem negra, passado negro, futuro negro. Não deveria chamar uma criança de negro, entendeu? Esta é uma coisa passada. Quando chama uma criança de negro – e tudo o que é negro é relacionado a coisas negativas – a criança fica com dúvidas, dúvidas acerca de sua própria identidade!

No dicionário de língua portuguesa – você que ainda não prestou atenção – está escrito: negro quer dizer “infeliz, maldito”. Brasileiro, então, quando valoriza, ele não fala negro. Ele fala preto! Ele não come feijão negro, ele come feijão preto. O carro dele não é negro, é preto. Ele não toma café negro, toma café preto. Quando passa fome, a fome é negra. Quando ganha na loteria, ganha nota preta.

Se branco não é negativo, preto também não é, entendeu? Mas negro não! Negro é palavra cem por cento negativa. Atrasa, causa morte, causa miséria e doença. Então, já que o mundo mudou, vamos mudar nossa linguagem, também, pra acompanhar a mudança do mundo!”

Vejo sensatez, bondade, riqueza, brasilidade e fraternidade nesta manifestação. E é por isso que me sinto representado neste discurso.Voltando ao racismo, é preciso dizer que a escravidão (de pretos, de indígenas e de povos colonizados por outros povos) tem um papel preponderante neste cenário e fixou raízes profundas na estrutura de nossa sociedade contemporânea, manifestando-se na economia, na política e nas relações sociais.

O fato é que o racismo se amplificou no século XIX, com a reverberação do conceito de que a cor branca, no contexto europeu se postava numa fictícia posição de superioridade, autoproclamando que as características físicas da cor da pele (branca) eram ficticiamente superiores. E os brancos, assim, se perfilaram superiores a outros grupos.

E, então, o conceito de “raça”, que deriva disto, produz um fenômeno (a priori, incontrolável) que situa pessoas não-brancas (pretas, indígenas, amarelas) como pertencentes a uma raça, ao passo que pessoas brancas são consideradas indivíduos.

Não saberia, eu, dizer se todos somos racistas. Mas vivemos, indiscutivelmente, numa sociedade enraizada no racismo. Pois o racismo está em todas as relações sociais e é notório perceber que há privilégios a uns, na conjuntura brasileira, pela cor de pele, meramente.

Não precisamos, assim, de isonomia, igualdade, equivalência, porque o discurso, inclusive constitucional (“todos são iguais perante a lei”) é mais uma poesia legal sem amplitude e eficácia! É impermanente, posto que efêmero, instável e inconstante! O que necessitamos é de equidade, para concretizar as oportunidades para todos e, ainda mais, para não permitir nem tolerar nenhuma diferenciação, seja porque motivo for.

No agir, é fundamental, como muitos especialistas no estudo das ciências humanas, sociais e antropológicas têm afirmado:

1) perceber em realidade que todas as práticas sociais da atualidade contêm racismo;

2) que lutar contra o racismo é compromisso e responsabilidade de todos, inclusive os não-pretos;

3) que, por sermos privilegiados, por certas convenções sociais e em face de características exteriores (como a cor da pele) e devemos nos posicionar contra isso; que não se pode calar diante da opressão nem tolerar que os que lutam e denunciam as práticas racistas sejam calados;

4) que não é responsabilidade dos pretos (ou dos índios, ou dos amarelos) perceberem e lutarem contra o racismo; e,

5) que não devemos tratar pessoas, sob qualquer interesse ou justificativa, como objetos (inclusive sexuais).

E dizer: vidas pretas importam! Vidas importam, sempre!

Pela cor da pele, pela herança genética, pela ascendência genealógica, sou um homem branco, fruto da miscigenação de italianos, portugueses e alemães. Mas isso não me impede de me sentir como um preto, de me solidarizar ante a dor dos que, sendo pretos, sofrem algum tipo de preconceito e, muito mais, de me alinhar contra toda e qualquer atitude que, direta ou indiretamente, de modo superficial ou fundante, na seriedade ou na “brincadeira”, em público ou privativamente, pensem, falem ou ajam por puro preconceito contra qualquer irmão em Humanidade.

Neste ponto, sou um branco-preto, ou um preto-branco. E é fundamental que todos os humanos do século XXI se posicionem nada mais do que como homens!

Esta semana, nas redes sociais, houve quem cobrasse do chamado “movimento espírita” uma atitude em relação ao racismo, sobretudo em face do crime bárbaro cometido aqui no sul brasileiro, onde também eu estou. Em nome da Associação Brasileira de Divulgadores do Espiritismo e em nome dos Movimentos “Espiritismo COM Kardec” e “Espíritas Progressistas”, nós nos manifestamos. Nós dizemos em alto e bom tom: – Não basta não ser racista. É preciso ser ANTIRACISTA.

Caso contrário, sim, somos racistas!

Marcelo Henrique Pereira

18 janeiro 2021

Considerações - Joanna de Ângelis

 
CONSIDERAÇÕES

Gemendo, no solo, aterrada, clamava a pequenina a semente: "Que será de mim, esmagada neste abismo de sombra e morte?" E, tendo morrido, renasceu em vetusta árvore que espraiou sombra protetora, flor perfumada e fruto saboroso, em vasta gleba verdejante e nobre.

Retorcido, em brasa viva, sofrido pelo malho e a bigorna, murmurava, sem resistência, a lâmina de ferro: "Que me acontece sob tortura que me aniquila, desça respeitando minhas forças?" E, submetido a vontade do metalúrgico, converteu-se em segurança numa ponte grandiosa.

Picada pela abelha diligente e operosa reclamava a flor: "Porque me roubam pólen e néctar, candidatando-me a extinção, em violenta morte prematura?" Todavia, enquanto cede, fecunda-se e, ao morrer na haste, revive no mel que atende a colmeia feliz, mais além.. Extirpado da furna em que em clausurava, grita, sob vigorosos golpes, o humilde carbono cristalizado: "Destróem-me, levando-me a nada, eu que venho da poeira dos milênios, em transformações interminas". Ferido, no entanto, e habilmente lapidado e engastado em precioso adereço fulge iridescente e valorizado.


* * *

Não olvides o impositivo da disciplina no programa da educação em família, preparando os que vivem contigo e seguirão a longa via por onde deambulas.

O mundo está miniaturizado no lar.

A família é a sociedade em embrião.

O indivíduo é o próton do átomo social.

Quando o lar desarmoniza, a sociedade cambaleia.

Sem a submissão aos impositivos do respeito à ordem e da valorização do caráter, com amplas considerações à honra, são improfícuas quaisquer arregimentações doutrinárias desta ou daquela filosofia, tendo em vista um mundo melhor ou uma sociedade mais feliz.

Tergiversando com o velho-novo Código do Sinai, abrasado pelo calor da loucura que grassa, infrene, levando de roldão aspirações superiores e condutas irreprocháveis, justificando a criminalidade e a degenerescência estarem em toda parte, o homem de bem com o desequilíbrio e a insânia por comodismo e assimilação, para despertar, logo mais, vencido e desesperado.

* * *

Por essa razão o Cristão Espírita não se deve permitir veleidades e aspirações rocambolescas, longe do impositivo kardequiano: "O verdadeiro espírita é um verdadeiro cristão".

Como o cristão verdadeiro entendemos o homem que se renova interiormente cada dia para melhor, plasmando, pelos atos corretos, uma mentalidade mais elevada em relação a ele e em torno dele.

Vivendo o século do áureo poder de Roma, em que o imediato da posse e da força elegia os seus comandantes, cantados por menestréis da frivolidade, nas galerias da honra transitória, Jesus chamou humildes e sonhadores corações entre escravos e gente considerada de má vida, aspiravam por uma Era Nova; e com eles renovou os conceitos de honra e de valor, conduzindo várias gerações pelos caminhos da sublimação, no legado de esperança e consolo aos que se encontram, ainda hoje, atados aos eitos de mentira e de ilusão, adorando as paixões e as vacuidades que logo passam...

Joanna de Ângelis
Psicografia de Divaldo P. Franco
Livro: Dimensões da Verdade - 34

17 janeiro 2021

Rejeição: Dor ou Autoconhecimento? - Adriana Machado

 
REJEIÇÃO: DOR OU AUTOCONHECIMENTO?

Rejeição e dor parecem fácil de se relacionar, mas pode se dizer que parece estranho pensar em sentir-se rejeitado como uma forma de autoconhecer-se, mas tentarei explicar o meu ponto de vista.

Vamos por parte, no entanto.

O QUE É REJEIÇÃO?

Simplificadamente, é uma ação ou efeito de rejeitar, de aceitar, de não tolerar, de repudiar.

Vocês percebem que quando somos agentes desta ação ou estado de espírito estaremos sempre ativos, mesmo quando formos o alvo de seus efeitos? Se não entenderam, sigam o meu raciocínio.

SER OU SENTIR-SE REJEITADO

Quando somos nós a rejeitar algo ou alguém, isso, normalmente, não nos atinge; não nos provoca dor, não nos incomoda.

Mas, quando somos o alvo desta ação, sentirmo-nos ou sermos rejeitados são estados emocionais bastante complicados para sustentar. Quando isso acontece, construímos algo em nosso mundo interior e, normalmente, esse algo não é bom, porque a rejeição para nós é sinônimo de repúdio, de repulsão por parte daqueles que estão ao nosso redor, nos colocando numa posição de inadequação frente a coletividade que nos cerca.

Ninguém quer estar à parte do coletivo. Queremos ser aceitos, queremos ser amados e, se possível, como somos. Mas, nem sempre isso acontece e precisamos, para a nossa paz de espírito, entender esse processo.

QUEM NOS MARCA COMO ALVOS?

Afirmei que somos alvo, e agora quero deixar claro que isso nem sempre vem de terceiros.

Quando o outro age, fica fácil identificá-lo, mas quantas vezes nos colocamos como alvo de nossas próprias censuras desumanas, da não aceitação de nós mesmos, transformando-nos nos principais algozes de nossa autoestima? É claro que isso pode ter sido provocado por ação de terceiros que nos convenceram que não merecemos o chão que caminhamos, mas também pela nossa ridícula exigência de uma perfeição que não existe.

Infelizmente, pensando assim, estaríamos somente refletindo o que a nossa coletividade, extremamente ignorante dos verdadeiros valores espirituais a serem angariados, nos exige. Fomos convencidos que para nos amar precisamos atender aos ridículos requisitos de uma sociedade imperfeita e mundana em que o Ter é mais precioso do que o Ser.

Então, deixamos de amar o que somos e até o que conquistamos, para amar o que ainda não possuímos, invadindo-nos sensações de frustração, inadequação...

Temos de parar e refletir sobre o que estamos fazendo; que caminhos estamos trilhando; porque não podemos continuar desse jeito.

Fomos criados por Deus com a semente da transformação, ou seja, estamos sempre nos modificando, nos aprimorando, nos fazendo melhores. Mas, para tudo isso acontecer de forma sadia, precisamos de um tempo de adaptação, de compreensão das nossas próprias experiências.

O PROBLEMA É... QUEREMOS ESPERAR?

É uma pergunta importantíssima para respondermos. Quem de nós exige de uma criança no jardim de infância que ela, já no primeiro dia de aula, saiba a matemática complexa dos doutorados? Isso é insano e tenho certeza de que concordam comigo.

Então, por que exigimos de nós algo que ainda não temos condições de saber?

Se estão pensando: “é porque os outros da minha idade já sabem, então, como eu não sei?”, precisamos refletir melhor.

Vamos dar um exemplo: vamos dizer que tenho cinquenta anos e nunca aprendi a dirigir. Somente porque tenho cinquenta, posso pegar qualquer carro e sair dirigindo sem colocar em risco outras pessoas, inclusive eu? Não, claro que não. Posso até colocar o carro em movimento porque já vi outros fazerem, mas precisaria mais do que isso para sentir que sei o que estou fazendo. Única solução é aprender com quem sabe ou cursar uma autoescola e, a partir daí, dirigir como todos aqueles que têm a minha idade e mais além.

PARÂMETROS EQUIVOCADOS

Muitas são as circunstâncias que nos equivocamos ao colocarmos a nossa capacidade vinculada a um parâmetro errado, como no caso do exemplo acima. Como posso usar da idade como um parâmetro válido, se ela em nada influencia para nos cobrarmos saber dirigir? Se assim fizermos, nos frustraremos com certeza, nos rejeitando injustamente, acreditando-nos incompetentes.

Mais do que nunca, precisamos lembrar a razão por nunca termos desejado ou podido aprender, porque nos surpreenderemos ao lembrarmos que tínhamos motivos que, à época, eram suficientemente fortes para não abraçarmos tal empreendimento.

REJEIÇÃO COMO DOR

Ora, com certeza nos rejeitarmos ou sermos rejeitados por terceiros nos trazem desconforto, tudo isso provoca uma descarga de descontentamento no nosso mundo interior. Muitos questionamentos são levantados por nós, mexendo com a nossa consciência.

Um dos pontos cruciais é que a nossa dor está pautada em uma inverdade! Não posso me considerar incompetente quando não sei fazer algo, porque competência vem com o aprendizado. Se eu não sei dirigir, a minha incapacidade está pautada na minha ignorância! Sem estudar e praticar, eu não terei conhecimento para conduzir um automóvel. Não sou incompetente, mas sim, ignorante, o que pode ser resolvido com o esforço do querer aprender.

REJEIÇÃO COMO AUTOCONHECIMENTO

Bem, aqui vem uma pequena reflexão de tudo o que estamos conversando. Se eu me rejeito ou se eu me sinto rejeitada, preciso entender o porquê.

Preciso saber se sentir-me rejeitada ou me rejeitar são duas situações diferentes.

Respondo não quando o nosso sentimento de sermos alvos da rejeição alheia está pautado na nossa própria autorrejeição. Então, se eu já me rejeito por não aceitar as minhas limitações, eu posso enxergar rejeição nas ações alheias, mesmo quando ela não existe. Neste caso, a fonte da rejeição vista por nós, somos nós mesmos.

Respondo sim, quando, infelizmente, nos deparamos com comportamentos inaceitáveis de alguns que ainda vivem escravizados a valores mundanos, não aceitando que o outro seja quem ele é, com todas as suas virtudes e imperfeições.

O ponto crucial destas duas respostas, no entanto, é que, não importa qual delas está ativa em nosso ser, somente nós podemos mudar o curso de nossos pensamentos, de nossa vida.

Somente nos conhecendo, poderemos saber o que nos falta para ultrapassar as dificuldades da falta do entendimento sobre determinado assunto. Se nos escondermos de nós pelo medo de encararmos a dor pela ausência do saber, jamais nos colocaremos como aprendizes para angariarmos a teoria e prática daquilo que nos falta. Viveremos na dor, sem nos aprofundarmos no autoamor projetado pelo autoconhecimento.

Então, a REJEIÇÃO nos leva à DOR e ao AUTOCONHECIMENTO?

Sim, a ambos e muito mais.

Adriana Machado
Fonte: Adriana Machado