SERÁ O CARNAVAL UMA FESTA DE ALEGRIA, DE PAZ E LOUVOR?
Com
o risco de sermos taxados de moralistas, num tempo em que se perdem as
noções de moralidade, não podemos deixar de analisar criticamente alguns
absurdos do mundo de Momo. Sem determinar regras de falsa santidade e
árduos sermões impulsionados pelas cantilenas morais, não deixaremos de
comentar sobre os prejuízos espirituais decorrentes das comemorações do
Carnaval.
Há muitos séculos o Carnaval era marcado
por grandes festas, em que se comia, bebia e participava de frenéticas
celebrações e busca incessante dos prazeres. [2] Prolongava-se por sete
dias (no mês de dezembro) nas ruas, praças e casas da antiga Roma. Todas
as atividades e negócios eram suspensos nesse período; os escravos
ganhavam liberdade temporária para fazer o que quisessem e as restrições
morais eram relaxadas. Um rei (saturnalicius princeps) era eleito por
brincadeira e comandava o cortejo pelas ruas.
Não fossem os exageros, o carnaval, como
festa de relação sociocultural, poderia se tornar um evento
compreensível, até porque não admitir isso seria incorrer postura de
intolerância. Há pessoas que buscam fazer do carnaval um momento de
esperança, oportunizando empregos, abrigando menores, e isso tem o seu
valor social. Entretanto, a bem da verdade, o grande saldo da homenagem a
Momo se resume em três palavras: violência, ilusão e sensualidade.
Reza a tradição que o folguedo de Momo
surgiu permeando o mundo “sagrado” e o orbe profano. Sinceramente! Não
conseguimos compreender algo de “abençoado” nas folias momescas.
Entretanto, em São Paulo há a escola de samba Dom Bosco, em Itaquera,
zona leste da cidade, cujo presidente é um padre salesiano de 73 anos e o
vice-presidente é um sacerdote de 37 anos que toca inclusive repinique
(tambor com baquetas) na bateria.
Além de celebrar missas, casamentos e coordenar projetos sociais, a dupla de sacerdotes obviamente participa dos ensaios da “Dom Bosco”. Ambos desejam arrastar 1.200 componentes ao Sambódromo do Anhembi, e entre os sambistas constam baianas, passistas (seminuas, portanto, nada beatas), velha-guarda e destaques. O enredo homenageia o fundador da congregação salesiana: “Dom Bosco: 200 Anos de Amor ao Próximo… Um Presente para o Mundo”.
Para os clérigos, idealizadores da escola
de samba, a concepção da agremiação foi a saída encontrada para unir um
grupo de jovens mais desregrado, que não estudava e era bastante
desinteressado nas atividades educativas oferecidas pela obra social da
igreja. Entretanto, tal artifício para atrair a juventude não tem sido
apreciado por alguns fiéis e superiores da Igreja romana.
Isso nos remete a recordar a escola de
samba Unidos do Viradouro que em 2011 levou para a Sapucaí um carro
alegórico carregando uma imagem do Chico Xavier. O médium de Uberaba foi
representado por uma escultura (psicografando) cercada por 60
componentes, alguns deles “espíritas” (!?), que fizeram uma performance
de “trabalho mediúnico” (!?). Santo Deus! Nada mais burlesco.
Será que o Carnaval é apenas um festival
de alegria, de paz e louvor? A princípio, o Espiritismo não estimula nem
recrimina o Carnaval e respeita todos os sentimentos humanos. Porém,
será que a farra carnavalesca, vista como uma manifestação popular,
consegue satisfazer os caprichos da carne sem deteriorar o espírito?
Será lícito confundir “diversão” passageira com alegria legítima? O
carnaval é um desses delírios coletivos, cuja reverência a Momo
representa a ocasião em que pessoas projetam o que há de mais irracional
e de mais incivilizado em si mesmas.
É verdade! O Espiritismo nada proíbe,
nada obriga, nem censura o carnaval; porém igualmente, não defende sua
realização. Sabe-se que durante a folia de Momo são perpetrados abusos
de todos os tipos e, mormente, desregramentos da carga erótica de
adolescentes, jovens, adultos e até idosos (mal resolvidos); há consumo
exagerado de álcool e outras drogas, instalação da violência
generalizada, excessos esses que atraem espíritos vinculados ao
deletério parasitismo magnético, semelhantes aos urubus diante de
carcaças deterioradas (carniças).
Os foliões de plantão reafirmam que o
carnaval é um extravasador de energias reprimidas. Entretanto, nos três
dias não são atenuadas as taxas de agressividade e nem as neuroses. O
que se observa é um somatório da selvageria urbana e de desgraça
doméstica. Após os festivais de erotismos surgem as gravidezes
desatinadas e a consequente propagação de criminosos abortos, acontecem
graves acidentes de trânsito, aumento da criminalidade, estupros,
suicídios, aumento do consumo de várias substâncias estupefacientes,
alcoólicos, assim como o surgimento de novos drogados, disseminação das
enfermidades sexualmente transmissíveis (inclusive a AIDS).
Em síntese, se o Carnaval é uma ameaça
concreta ao bem-estar social, nós espíritas temos muito a ver com ele,
porque uma das tarefas primordiais de cada espírita é a de lutar por
dispositivos de preservação dos valores mais dignos da Sociedade, sem
que se violente, obviamente, o direito relativo do livre-arbítrio
coletivo e individual, jamais nos esquecendo que no carnaval ocorre a
obsessão nos seus vários matizes como conseqüência da invigilância e dos
desvios morais. Somente poderemos garantir a vitória do Espírito sobre a
matéria, se fortalecermos a nossa fé, renovando-nos mentalmente,
praticando o bem nos moldes dos códigos propostos por Jesus Cristo, e
não esquecendo os divinos conselhos do Mestre: “Vigiai e orai, para que
não entreis em tentação”. [1]
Em suma, cremos que inexista outro
caminho que não seja o da abstinência sincera das folias de Momo. O bom
senso nos convida a aproveitar o feriadão para entrosamento com os
familiares, leitura de livros instrutivos, frequência a reuniões
espíritas. Aliás, será coerente fechar as portas dos centros espíritas
nos dias de Carnaval, ou mudar o procedimento das reuniões? Existem
alguns centros que fecham suas portas nos feriados do carnaval sem
motivos racionais. Em verdade, o espírita pode participar de eventos
educacionais, culturais ou mesmo descansar em casa, já que o ritmo
frenético do dia a dia exige, cada vez mais, preparo e estrutura
físico-psicológica para os embates pelo ganha-pão.
Em face do determinismo da Lei de
Evolução, um dia tudo isso passará, todas as manifestações ruidosas que
marcam nosso estágio de inferioridade desaparecerão da Terra. Em seu
lugar, então, predominarão a alegria pura, a jovialidade, a satisfação e
o júbilo real, com o homem despertando para a beleza e a arte, sem
violência, nem degeneração moral.
Jorge Hessen
Referências:
[1] A Festa do deus Líber em Roma; a Festa dos Asnos que acontecia na igreja de Ruan no dia de Natal e na cidade de Beauvais no dia 14 de janeiro, entre outras inúmeras festas populares em todo o mundo e em todos tempos, têm esta mesma função.
[2] Mt 26:41
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