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10 outubro 2010

Não Perdoar - Hilário Silva

NÃO PERDOAR

Bezerra de Menezes, já devotado à Doutrina Espírita, almoçava, certa feita, em casa de Quintino Bocaiúva, o grande republicano, e o assunto era o Espiritismo, pelo qual o distinto jornalista passara a interessar-se.

Em meio da conversa, aproxima-se um serviçal e comunica ao dono da casa:

- Doutor, o rapaz do acidente está aí com um policial.

Quintino, que fora surpreendido no gabinete de trabalho com um tiro de raspão, que, por pouco, não lhe atingiu a cabeça, estava indignado com o servidor que inadvertidamente fizera o disparo.

- Manda-o entrar – ordenou o político.

- Doutor – roga o moço preso, em lágrimas -, perdoe o meu erro! Sou pai de dois filhos...
Compadeça-se! Não tinha qualquer má intenção...
Se o senhor me processar, que será de mim? Sua desculpa me livrará! Prometo não mais brincar com armas de fogo! Mudarei de bairro, não incomodarei o senhor...

O notável político, cioso da própria tranqüilidade, respondeu:

- De modo algum. Mesmo que o seu ato tenha sido de mera imprudência, não ficará sem punição.

Percebendo que Bezerra se sentia mal, vendo-o assim encolerizado, considerou, à guisa de resposta indireta:

- Bezerra, eu não perdôo, definitivamente não perdôo...

Chamado nominalmente à questão, o amigo exclamou desapontado:

- Ah! você não perdoa!

Sentindo-se intimamente desaprovado, Quintino falou, irritado:

- Não perdôo erro. E você acha que estou fora do meu direito?

O Dr. Bezerra cruzou os braços com humildade e respondeu:

- Meu amigo, você tem plenamente o direito de não perdoar, contanto que você não erre...

A observação penetrou Quintino como um raio.

O grande político tomou um lenço, enxugou o suor que lhe caía em bagas, tornou à cor natural, e, após refletir alguns momentos, disse ao policial:

- Solte o homem. O caso está liquidado.

E para o moço que mostrava profundo agradecimento:

- Volte ao serviço hoje mesmo, e ajude na copa.

Em seguida, lançou inteligente olhar para Bezerra, e continuou a conversação no ponto em que haviam ficado.

Pelo Espírito Hilário Silva
Do livro: Almas em Desfile
Médiuns: Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira

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