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30 setembro 2020

Esquecimento do passado não é apertar a tecla delete - Paulo da Silva Neto Sobrinho

 
 

ESQUECIMENTO DO PASSADO NÃO É APERTAR A TECLA DELETE

 
“O gênio […] é fruto de longa experiência em muitas vidas. Algumas almas são mais velhas do que outras e, por isso, sabem mais…” Henry Ford

Equivocadamente algumas pessoas pensam que o esquecimento do passado seja algo como apertar a tecla delete do teclado do seu notebook. Às vezes, dizem que ao nascer o Espírito é “uma página em branco”; sim, é fato, mas não de um livro com todas as páginas em branco, mas já com milhares de páginas escritas, onde se encontram gravadas em sua memória integral, o inconsciente, toda a sua evolução intelectual e moral.

O notebook, que usamos como exemplo, tem duas memórias: ROM e RAM:

As memórias ROM (Read-Only Memory – Memória Somente de Leitura) recebem esse nome porque os dados são gravados nelas apenas uma vez. Depois disso, essas informações não podem ser apagadas ou alteradas, apenas lidas pelo computador, exceto por meio de procedimentos especiais. […].

As memórias RAM (Random-Access Memory – Memória de Acesso Aleatório) constituem uma das partes mais importantes dos computadores, pois são nelas que o processador armazena os dados com os quais está lidando. Esse tipo de memória tem um processo de gravação de dados extremamente rápido, se comparado aos vários tipos de memória ROM. […]. (1) (grifo nosso)

Podemos, por comparação, dizer que, semelhante ao notebook, o ser humano tem duas memórias: memória integral, que corresponderia à ROM, e a memória atual, relacionada a RAM.

Curioso é o que aparece nos relatos de Espíritos e nos de pessoas que passaram por uma EQM – Experiência de Quase Morte, que, em tempo muito curto, viram, como se fosse um filme, todos os atos de sua vida, tal e qual um programa de texto que o lê, antes de gravá-lo na memória ROM.

Em O Livro dos Espíritos, 2º Livro, cap. IV, tópico “Ideias inatas”, temos esclarecimento quanto aos conhecimentos inatos:

218. O Espírito encarnado conserva algum vestígio das percepções que teve e dos conhecimentos que adquiriu nas existências anteriores?
“Resta-lhe uma vaga lembrança, que lhe dá o que se chama ideias inatas.”

218-a. A teoria das ideias inatas não é, portanto, uma quimera?
“Não; os conhecimentos adquiridos em cada existência não se perdem; liberto da matéria, o Espírito sempre se recorda. Durante a encarnação, pode esquecê-los em parte, momentaneamente; mas a intuição que deles guarda lhe auxilia o progresso, sem o que estaria sempre a recomeçar. Em cada nova existência, o Espírito toma como ponto de partida aquele em que se encontrava em sua existência anterior.” (2)

A prova de que os conhecimentos anteriores não se perdem, ao contrário se manifestam, vamos encontrar, especialmente, nas pessoas que vemos como homens de gênio.

Em A Gênese, cap. I, item 5, Allan Kardec (1804-1869) explica-nos:

"Mas quem são esses homens de gênio? Por que são gênios? De onde vieram? Como se tornaram? Notemos que a maioria deles possui, desde o nascimento, faculdades transcendentes e alguns conhecimentos inatos que, com pouco esforço, desenvolvem. De fato, eles pertencem à humanidade, pois nascem, vivem e morrem como nós. Pois, então, de onde adquiriram esses conhecimentos que não puderam aprender durante a vida? Pode-se dizer, como fazem os materialistas, ter o acaso dado a eles matéria cerebral em maior quantidade e de melhor qualidade? Neste caso, não teriam mais mérito que um legume maior e mais saboroso que os outros.

"Diremos, como certos espiritualistas, que Deus dotou os gênios de uma alma mais favorecida que a das pessoas comuns? Essa suposição é igualmente ilógica, pois qualificaria como parcial. A única solução racional desse problema está na preexistência da alma e na pluralidade das existências. O homem de gênio é um Espírito que, tendo vivido mais tempo, conquistou e progrediu mais do que os menos adiantados. Ao se encarnar, traz consigo o que sabe. Por saber mais que os outros, sem precisar aprender, é chamado de gênio. Contudo, seu saber é fruto de um trabalho anterior, e não resultado de um privilégio. Antes de renascer, já era um Espírito adiantado; reencarna para fazer os outros aproveitarem seu conhecimento, ou para progredir ainda mais." (3)

Retornando à obra O Livro dos Espíritos, destacamos, respectivamente, dois comentários de Allan Kardec sobre as respostas dos Espíritos superiores às questões 393 e 399:

"Embora em nossa vida corpórea não nos lembremos com exatidão do que fomos e do que fizemos de bem ou de mal nas existências anteriores, temos a intuição de tudo isso, sendo as nossas tendências instintivas uma reminiscência do nosso passado, tendências contra as quais a nossa consciência, que é o desejo que sentimos de não mais cometer as mesmas faltas, nos adverte para resistir." (4)

"Embora o homem não conheça os próprios atos que praticou em suas existências anteriores, sempre pode saber qual o gênero das faltas de que se tornou culpado e qual era o caráter dominante. Basta estudar a si mesmo e julgar do que foi, não pelo que é, mas pelas suas tendências." (5)

Então, evidencia-se que, de fato, não somos uma página branca em um livro em branco, mas trazemos, via reminiscências, todo o nosso passado que deságua sobre a personalidade atual como tendências, às quais é impossível fugir. Devemos nos esforçar para eliminar as más, visando sobressair somente as boas.

Na Revista Espírita 1858, mês de fevereiro, Allan Kardec publica o artigo “Diferentes ordens de Espíritos” no qual apresenta a classificação dos Espíritos conforme a ordem a que pertencem. Vamos destacar os de segunda ordem – bons Espíritos:

"Caracteres gerais. – Predominância do Espírito sobre a matéria; desejo do bem. Suas qualidades e o seu poder para fazerem o bem estão em razão do grau que alcançaram: uns têm a ciência, os outros a sabedoria e a bondade; os mais avançados unem o saber às qualidades morais. Não estando, ainda, completamente desmaterializados, conservam, mais ou menos, segundo sua classe, os traços da existência corporal, seja na forma da linguagem, seja em seus hábitos, onde se encontram mesmo algumas das suas manias; de outro modo, seriam Espíritos perfeitos." (6)

Importante a informação de que somente os Espíritos puros não conservam os traços da existência corporal, seja na forma da linguagem, seja em seus hábitos e algumas manias. O que vem significar que todos os Espíritos de segunda e terceira ordem trazem consigo tudo isso. Logo, quando reencarnam, apresentam todas essas características. Como? Na forma de reminiscências instintivas, ou seja, manifestam-se como tendências.

Na Revista Espírita 1859, mês de março, Allan Kardec diz que “[…] Estamos persuadidos de que devemos ter reminiscências de certas disposições morais anteriores; diremos até que é impossível que seja de outro modo, pois o progresso não se realiza senão gradualmente. […].” (7)

De O que é o Espiritismo, publicado em julho/1859, no tópico “Esquecimento do Passado”, destacamos este argumento de Allan Kardec:

"É assim que, reencarnando, o homem traz por intuição e como ideias inatas, o que adquiriu em ciência e moralidade. Digo em moralidade porque, se no curso de uma existência ele se melhorou, se soube tirar proveito das lições da experiência, se tornará melhor quando voltar; seu Espírito, amadurecido na escola do sofrimento e do trabalho, terá mais firmeza; longe de ter de recomeçar tudo, ele possui um fundo que vai sempre crescendo e sobre o qual se apoia para fazer maiores conquistas." (8) (grifo nosso)

Allan Kardec, como se vê, mantém-se firme na mesma linha de raciocínio, certamente, calcada nos ensinamentos dos Espíritos superiores.

Em Obras Póstumas, no artigo “Minha missão”, buscando confirmação do que lhe fora dito antes, pergunta ao Espírito Hahnemann: “Outro dia, disseram-me os Espíritos que eu tinha uma importante missão a cumprir e me indicaram o seu objeto. Desejaria saber se confirmas isso.” Cuja resposta foi:

"– Sim e, se observares as tuas aspirações e tendências e o objeto quase constante das tuas meditações, não te surpreenderás com o que te foi dito. Tens que cumprir aquilo com que sonhas desde longo tempo. É preciso que nisso trabalhes ativamente, para estares pronto, pois mais próximo do que pensas vem o dia." (9)

Então, a missão de Allan Kardec de trazer à Humanidade a revelação espírita, entre vários fatores, tem relação direta com as suas aspirações e tendências, provando, portanto, que nossas experiências reencarnatórias são como tijolos na construção de um edifício.

Assim, como existiram (ou ainda existe?) os caçadores da arca perdida, semelhantemente, no meio espírita, encontramos os “caçadores de reencarnações de personalidades”. Esse fato em si, não é um grande problema, já que a reencarnação é um dos princípios basilares do Espiritismo, o que torna isso fora de propósito é quando não apresentam elementos de prova que possam ligar os todos os candidatos envolvidos pela semelhança de tendências de seus supostos personagens anteriores.

Isso demonstra, que, apesar de se apresentarem como profundos conhecedores da Doutrina Espírita, estão bem longe disso, pois apenas elaboram uma lista de personagens sem entretanto apresentar as tendências que possam ligá-los uns aos outros, obedecendo, obviamente, ao fato de que “A cada nova existência, o Espírito dá um passo adiante na estrada do progresso. […].” (10)


Paulo da Silva Neto Sobrinho
Fonte: Espiritismo em Movimento


Referências:


2 KARDEC, O Livro dos Espíritos, p. 136.

3 KARDEC, A Gênese, p. 44.

4 KARDEC, O Livro dos Espíritos, p. 203.

5 KARDEC, O Livro dos Espíritos, p. 206.

6 KARDEC, Revista Espírita 1858, p. 41.

7 KARDEC, Revista Espírita 1859, p. 70.

8 KARDEC, O Que é o Espiritismo, p. 115.

9 KARDEC, Obras Póstumas, p. 309.


10 KARDEC, O Livro dos Espíritos, p. 120

Revisores:

Hugo Alvarenga Novaes
Rosana Netto Nunes Barroso.

Referências bibliográficas:

KARDEC, A. A Gênese. São Paulo: FEAL, 2018.

KARDEC, A. Obras Póstumas. Rio de Janeiro: FEB, 2006.

KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. Brasília: FEB 2013.

KARDEC, A. O Que é o Espiritismo. Rio de Janeiro: FEB, 2001.

KARDEC, A. Revista Espírita 1858. Araras (SP): IDE, 2001.

KARDEC, A. Revista Espírita 1859. Araras (SP): IDE, 1993.

29 setembro 2020

O choro como válvula de escape da aflição - Jorge Hessen


O CHORO COMO VÁLVULA DE ESCAPE DA AFLIÇÃO

O choro pode durar a noite inteira, mas de manhã vem a alegria. (1) Estudiosos afirmam que a função evolutiva do choro foi despertar empatia no semelhante e estimular o auxílio em momentos de necessidade. Na verdade, a histórica cooperação entre indivíduos foi e continua sendo essencial para a sobrevivência da espécie humana.

Sabe-se que o choro libera hormônios e neurotransmissores que aliviam a tristeza e a dor. Especialistas alegam que reprimir o choro significa abafar alguns sentimentos, tornando mais difícil lidar com eles. Em face disso, médicos e psicólogos recomendam chorar para liberar as emoções. O choro amiúde constitui o acesso nas essências mais profundas dos sentimentos. É quando não se domina a amargura e ela necessita ser vazada, exposta, nem que seja solitariamente.

As lágrimas são um mecanismo de defesa do organismo para liberar o stress e auxiliar no reequilíbrio das emoções. O choro alivia a angústia e pode nos levar a submersões mais intensas, quando oferecemos um sentido para as lágrimas, para aquela dor vivida no presente.

Todavia, são urgentes alguns alertas! O choro pode ser um episódio ligeiro de tristeza, mas também pode ser um transtorno psicológico depressivo. A tristeza é um estado emocional transitório e comum, uma reação psicológica circunstancial. Entretanto, a depressão, ao contrário da tristeza, não é algo efêmero. Uma pessoa deprimida padece de condição emocional crônica sob as chibatas da ansiedade mental prolongada.

Meditando a questão do choro, observamos que ele foi sublime em Jesus. Como registrou o evangelista afirmando que à frente de Lázaro “morto”, o Cristo chorou. O excelso Galileu “também chorou lamentando a incompreensão dos homens sentado em uma das grandes raízes de uma árvore no fundo do quintal da casa de Pedro".(2) Jesus chorou no Getsêmani, quando sozinho, todavia, em Jerusalém, sob o peso da cruz, rogou às mulheres generosas a cessação das lágrimas. Na alvorada da Ressurreição, questionou Madalena a razão do seu choro junto ao sepulcro.

Conta o Espírito Hilário Silva no livro “A Vida Escreve” uma metáfora em que Eurípedes Barsanulfo teria indagado ao Mestre: “Senhor, por que choras?”. Jesus não respondeu. O nobre filho de Sacramento reiterou: “Choras pelos descrentes do mundo?” E após um instante de atenção, Jesus respondeu em voz dulcíssima: “Não, meu filho, não sofro pelos descrentes aos quais devemos amor. Choro por todos os que conhecem o Evangelho, mas não o praticam”.(3)

Sabendo que o choro pode significar abrigo de alívio, consintamos que ele advenha, para benefício daquele que chora. Apenas expressemos compaixão. Abriguemos os que choram, dizendo-lhe frases do tipo: “Conte comigo”, “estou ao seu lado”, “compreendo e respeito sua agonia”, “confie e espere’, ‘tudo passa”, sempre sussurrando-lhe Jesus aos ouvidos: “Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados.” (4)


Jorge Hessen


Referências bibliográficas:

1, Salmo 30:5

2, FRANCO, Divaldo. Primícias Do Reino Ditado pelo Espírito Amélia Rodrigues, Salvador: Editora, LEAL 2015


3, XAVIER, Francisco, VIEIRA, Waldo. A Vida Escreve, pelo Espírito Hilário Silva, ed. FEB, 1998

4, Mateus 5:4


28 setembro 2020

Contrastes - Divaldo Pereira Franco



CONTRASTES

Não penseis que vim trazer paz à Terra. Não vim trazer paz, mas espada... Mateus, 10:34

Quando Jesus pronunciou essa frase singular, causou um certo espanto, porque toda a Sua doutrina é de amor e de misericórdia, fundamentada na compaixão e no exercício da caridade.

Todos aqueles profetas e missionários de Luz que vieram antes dEle estiveram apoiados nas propostas tiranizadoras da espada destrutiva. Ele veio como a esperança dos mais fracos, a coragem dos desfalecidos, a alegria dos desdenhados, a abnegação dos aparentemente vencidos. Ele mesmo na Cruz era o símbolo de quem fora dominado e submetido pelas espadas triunfantes dos poderosos de mentira e dos gozadores da ilusão. No entanto, ali estava como o triunfo da Verdade sobre a mentira, da liberdade sobre a escravidão, da honra sobre a vileza moral, da Imortalidade sobre a transitoriedade do mundo...

Isso, porém, somente foi reconhecido depois, assim como a Sua advertência especial sobre a espada.

À medida que os Seus nobres conceitos penetravam as vidas, todas experimentavam profundas mudanças e alteravam por completo o seu rumo. A espada, a Verdade, separava a ignorância da presunção, a dignidade da desfaçatez e do ludíbrio, o amor real pela volúpia da libido exacerbada.

Ela significava um ontem e um depois, mediante um comportamento que era o mesmo em qualquer circunstância.

Em relação aos Seus ensinamentos, não havia lugar para dubiedades, vacilações nem aparências. A aceitação deles era um divisor de águas, que somente o amor no seu mais elevado significado consegue viger.

É necessário dispor-se de muitos recursos morais e de decisões legítimas para abandonar-se toda uma trajetória de engodos para firmar-se numa realidade que não aceita conchavos para a sobrevivência, nem dissimulações para evitar prejuízos.

Com Ele ou sem Ele, não há possibilidade de postura morna, meio a meio, aguardando o vencedor da batalha, a fim de saltar-se para o lado do vitorioso mesmo que ignóbil.

Foi por essa razão que a Sua mensagem derrubou o Império Romano e impôs novos padrões de justiça, de responsabilidade, de honradez. Houve alteração total da ética de subserviência, de pusilanimidade para a conduta de desejar e fazer ao próximo o que gostaria que lhe fosse feito...

A sociedade, porém, não estava amadurecida suficientemente para manter a igualdade, a solidariedade e o respeito no mesmo padrão entre todos.

Os interesses vis e as paixões em desgoverno diluíram a espada no ardor das suas conquistas miseráveis, e os velhos hábitos e costumes corromperam a Sua mensagem e o mundo voltou ao passado.


Merece, porém, considerar que a espada está em ação...

De que lado te encontras nestes severos dias?

 

Por DivaldoPereira Franco
Artigo publicado no jornal A Tarde, coluna Opinião, 20 de agosto de 2020


27 setembro 2020

Espiritismo, doutrina da lógica! - Francisco Rebouças

 
ESPIRITISMO, DOUTRINA DA LÓGICA

“Considera o que te digo, porque o Senhor te dará entendimento em tudo.” – Paulo. (2ª Epístola a Timóteo, 2:7)

Se verdadeiramente estivermos preocupados com nosso bem-estar, não podemos, de forma alguma, deixar de extirpar de nosso mundo interior qualquer tipo de sentimento menos digno tais como ódio, vingança, mágoa etc., pois quem alimenta esse tipo de sentimento incendeia o próprio coração, causando-lhe sérios distúrbios de difícil reparação.

Se nos dispomos viver de forma saudável, não podemos, de maneira alguma, fazer uso de qualquer tipo de vício, pois, quem assim procede, e se utiliza de substâncias que causem dependência, logo estará sob o seu domínio escravizado por elas, sofrendo seus maléficos efeitos.

Se nos propomos viver de forma positiva, em busca do nosso crescimento físico, moral–espiritual, não podemos nos dar ao luxo de cultivar a ociosidade, pois, seu efeito é o crescimento da preguiça, e o conseqüente envolvimento com as energias negativas do desânimo destruidor.

Quem dentre nós desejar desfrutar de uma vida saudável e harmônica, não poderá se fazer surdo ao chamado lúcido e carinhoso com que Jesus nos convida a trilhar os roteiros seguros constantes do seu Evangelho, procurando vivenciar na prática o seu conteúdo edificante e salutar.

Se desejamos seguir o caminho do progresso, é preciso saber suportar os desafios e as dificuldades da caminhada, e seguir amando e servindo como nos exemplificou o Mestre de Nazaré. Já temos capacidade de compreender que as nossas linhas de ação se interpenetram com responsabilidades e obrigações para todos.

“Alegria, assim, na esfera da consciência que dispõe de suficiente vontade para exaltar-se no discernimento do bem e do mal, com capacidade de ajudar ilimitadamente, será regozijar-se estendendo fatores de regozijo a benefício dos que nos cercam; dar-se às boas obras; receber vantagens distribuindo-as e amar sem reclamar amor de ninguém; alegria constituída de ação permanente no domínio dos impulsos inferiores, na movimentação construtiva, na administração criteriosa daquilo que possuímos e na ternura que possamos oferecer de nós para edificação dos semelhantes.

Jesus resumiu os deveres religiosos na síntese:- “Ama a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo”. E compreendendo-se que em nossa presente situação evolutiva, não dispomos de mais alta fórmula para amar o Criador que não seja amá-lo nas criaturas, a Doutrina Espírita nos define felicidade como sendo a alegria dos que possuem a alegria de cumprir o dever de auxiliar os outros para o bem, com base na consciência tranqüila.” (1)

Os mensageiros celestes, prepostos do nosso Mestre e Guia, não podem ser confundidos como Seres privilegiados como se fossem trabalhadores especiais da seara de Jesus, e sim, nossos companheiros com maior soma de conhecimentos e experiências, constituindo conosco o exército pacífico, de trabalhadores convocados ao reajustamento espiritual da Humanidade.

Nunca deixamos de ter enormes contingentes de oportunidades de servir na luta benemérita, que continuam esperando por nossa decisão de servir com alegria aproveitando da melhor forma os momentos de fazer a parte que nos está destinada dando nossa importante parcela de contribuição para o engrandecimento nosso e do nosso irmão de caminhada evolutiva.

Para tanto é imprescindível estarmos em constante alerta, vigiando e orando como nos recomendou Jesus, porque no nosso atual estado de imperfeição estaremos quase sempre envolvidos pelas investidas arremetidas da sombra, pelas ciladas sutis do mal, entretanto, em nosso programa evolutivo grafado nosso compromisso com as ações e vivência dos princípios contidos no Evangelho Redentor.

Somos sabedores de que nossa meta principal será sempre a renovação de nosso modo de ver, ouvir, falar e agir esforçando-nos pelo burilamento do Ser imortal que somos lutando para controlar os impulsos irracionais do homem velho, deixando brotar do imo do nosso ser o Homem novo, modificado, evangelizado, e moralizado, disposto a levar adiante a tarefa essencial da reforma íntima, tornando-nos homens de bem.

Urgente se faz não continuar colecionando lamentações, queixumes, reclamações descabidas, para não seguir submetido aos efeitos danosos das tempestades de lágrimas e aborrecimentos. O Espírita sabe que de si depende seu progresso e sua felicidade, e que deve se empenhar em fazer o que a Providência Divina lhe estabeleceu como cota de sacrifício no trabalho de crescimento moral espiritual como sendo sua contribuição na melhoria da sociedade em que está inserido para crescer, progredir e se purificar.

Francisco Rebouças
Fonte:
Agenda Espírita Brasil

Referências:

(1) Vieira,Waldo, pelo Espírio André Luiz, livro: Sol nas Almas- Cap. 5


26 setembro 2020

Como se pode resistir a má influência das entidades espirituais? - Hugo Lapa

 
COMO SE PODE RESISTIR A MÁ INFLUÊNCIA DAS ENTIDADES ESPIRITUAIS?

A melhor forma é viver uma vida sadia, de prática de virtudes, de moral elevada, de nobreza de caráter e atividades. O respeito para com o próximo, a caridade, a compaixão, o desapego, assim como a renúncia de nosso interesses pessoais em benefício dos interesses coletivos são imprescindíveis.

A fé, o amor e a caridade formam a base mais sólida para manter nossa aura em altas frequências e estar invulnerável a influências externas.

Além disso, a frase “Conhece-te a ti mesmo” é um ensinamento essencial para isso. O autoconhecimento é importantíssimo, pois a pessoa que não se conhece e oculta seus próprios defeitos, acaba sendo uma presa fácil das entidades que podem ver nossas mais íntimas intenções e desejos.

Quando você nega firmemente algo em você, os outros te descobrem com mais facilidade; quando você esforça-se ao máximo para ocultar suas tendências, elas vêm à tona em momentos inoportunos e aparecem com bem mais força.

Por isso, o melhor caminho é aceitar quem somos; aceitar nossos defeitos, fraquezas, feridas e tendências, para que possamos enxergá-las e buscar sua superação.

Hugo Lapa
Fonte: Kardec Rio Preto
 

25 setembro 2020

Arrepender e corrigir - Waldenir A. Cuin


ARRENPENDER E CORRIGIR

O arrependimento sincero durante a vida é suficiente para extinguir as faltas e fazer que se mereça a graça de Deus? “O arrependimento auxilia a melhora do Espírito, mas o passado deve ser expiado.” (Questão 999 de “O Livro dos Espíritos” - Allan Kardec.)

Vivendo na Terra, um mundo de expiações e provas, é muito natural que pela nossa própria condição evolutiva ainda cometamos muitos erros e equívocos, pois que estamos a caminho da perfeição, portanto, não sendo perfeitos.

No entanto, percebe-se, em boa parte das criaturas humanas, o sincero desejo de não cometer falhas e, quando elas existem, logo vem o interesse em repará-las. Inicia-se pelo arrependimento, esse sentimento que demonstra a nossa insatisfação pelo erro desencadeado, que geralmente vem seguido pela vontade de consertar aquilo que não foi bem-feito.

Obviamente, o desagrado que registramos diante de um acontecimento infeliz é de grande valia e importância, mas imperioso que procuremos reparar o erro cometido, pois causar prejuízo a alguém, de qualquer ordem, sempre nos deixa uma sensação desagradável e constrangedora.

O verdadeiro homem de bem se preocupa, com frequência, em servir ao irmão do caminho e não em lhe criar problemas e aflições. E, se isso acontece, por causas variadas, deseja ele, assim que se conscientiza do fato, resolver a questão se entendendo com a sua vítima.

Mas existe situação em que a falha cometida contra alguém, no momento, não tenha como ser reparada diretamente, talvez pela impossibilidade de uma aproximação com o ofendido. Mesmo assim não estaremos impedidos de começar a consertar nosso deslize, pois que podemos servir à humanidade, de uma forma geral, granjeando, para o nosso “curriculum”, créditos junto à Providência divina, que saberá entender os nossos propósitos e se prestará a nos criar as oportunidades devidas para a solução das nossas pendências.

De qualquer modo, o arrependimento será sempre uma imensa porta que se abre para que comecemos e reparar os nossos erros. Arrepender-se, tão somente, não basta, preciso será o desejo firme de trabalhar com determinação, para que se faça o devido conserto dos estragos promovidos.

Ainda, concluindo que não agimos como devíamos, jamais olvidemos da necessidade de não cometer os mesmos equívocos, ou seja, desencadear imensos esforços para não reincidir.

Mas, de qualquer forma, estando próximo da nossa vítima ou não, tendo possibilidades de contatar com ela ou não, elejamos o bem como meta máxima das nossas ações e saiamos a servir ao próximo, onde quer que ele esteja ou em que situação possa estar. O bem promovido em qualquer lugar, a qualquer hora, e em benefício de quem quer que seja, será sempre o nosso advogado de defesa nos momentos dos nossos testemunhos, diante dos acontecimentos da vida.

Por enquanto, não tenhamos a pretensão de passar pela vida física isentos de falhas, embora devamos fazer todo o empenho para evitá-las.

Na pessoa de quem estiver mais próximo, temos um imenso campo de trabalho para que nossas ações de equilíbrio possam produzir proezas de amor e auxílio.

Devemos sempre ter em mente que, trabalhando com afinco pela construção de um mundo melhor, onde nossos atos expressem a vivência prática do Evangelho do Cristo, teremos sempre um ponto de equilíbrio onde as atitudes sublimes e nobres estarão neutralizando aquelas que, por ventura, escapem ainda do nosso controle.

No momento, não somos seres angelicais, mas devemos exercitar o máximo de esforço visando errar o menos possível para que o arrependimento e o remorso não venham torturar os nossos dias.

Waldenir A. Cuin
Fonte: Espiritismo na Rede

24 setembro 2020

A Intransferibilidade da Obra de Redenção

 
A INSTRANSFERIBILIDADE DA OBRA DA REDENÇÃO

“Sabe, porém, isto: que nos últimos dias sobrevirão tempos trabalhosos” [1]

O Salmos 139, cujo autoria é atribuída ao Rei Davi, reconhecido como unificador e fundador da nação hebraica, descrito nos Velhos apontamentos bíblicos como possuidor de muitos dons artísticos, como o da música, da poesia e autor dos tradicionais Salmos

penitenciais. Sua maior inspiração ocorreu no momento em que conduzia as ovelhas pelos pastos verdejantes, criando salmos e cânticos para louvar a Deus, porém, ao pastorear as ovelhas, refletia na grandeza de Deus e na sua insignificância como criatura, embora entendendo-se único. Esses momentos geravam um amadurecimento do conceito do relacionamento do homem com o Criador.

O nosso amadurecimento espiritual, ao longo de milênios tem se revelado precioso instrumento para sondarmos os caminhos que tendem a elevar-nos ou afastar-nos daquilo que é divino.

Ao contrário de muitas teorias que divulgam a redenção ou salvação do espírito imortal através da doutrina da graça, sabemos convictamente que toda evolução, redenção ou salvação se dará através do esforço do próprio espírito, através de lutas incessantes para domar as suas más inclinações e transformar seu teor vibratório em ondas sutilíssimas de amor e paz.

Indagou Allan Kardec sobre a progressão dos espíritos na questão de número 114, de O Livro dos Espíritos: “Os espíritos são bons ou maus por natureza, ou são eles mesmos que se melhoram?” Os Benfeitores responderam: “São os próprios espíritos que se melhoram e, melhorando-se passam de uma ordem inferior para outra mais elevada” [2].

A intransferibilidade da obra de nossa redenção requer um entendimento das nossas responsabilidades, assumir compromissos sérios e legítimos. Reconhecermos a profundidade de nossas mazelas e misérias, descobrindo caminhos para nos libertar das amarras da ignorância e do mal, visto que este não deixa de ser produto da ignorância.

Acreditar que podemos encarregar os Espíritos superiores dessa tarefa é atitude ingênua, infantil e ilusória.


O tempo de evoluir acontece agora.

Oportunidades são franqueadas.

Trabalhos são disponibilizados.

Ações podem levar a redenção.


Sem dúvida poderíamos sempre pelos nossos esforços vencer as nossas más inclinações, porém quão poucos entre nós fazemos esforços para adquirir a ciência do bem viver.

A transformação do nosso sentimento será possível se houver o combustível da boa vontade, do método e da persistência. Entendamos aqui “boa vontade” como o esforço contínuo de transformação comportamental e o uso da razão a serviço da nossa evolução espiritual.

Vivemos tempos dinâmicos onde a trajetória evolutiva do espírito imortal deve ser alterada do status do ter para o ser.

Houve um tempo em que lutávamos pela liberdade e dessas pelejas instituímos a democracia, sob os ares da Grécia. Momentos póstumos, ansiávamos o poder, o domínio, a posse, criamos, então, o direto nas composições sociais romanas.

Senhores, pois, da liberdade e do direito ambicionamos perenizar nosso existir, assim sendo, engendramos a medicina, as tecnologias e ainda se cremos que falta pouco para sequestrarmos e assumirmos o lugar sacrossanto do Criador nas plagas terrenas.

Entretanto, afeiçoados ao ter, ainda acreditamos que podemos transferir a outrem nossa tarefa de iluminação interior. Esquecidos que o ser é o mais importante.

Não ouvimos os apelos dos imortais, dos sábios, dos filósofos. Escutamos tão somente a voz da consciência, ou da inconsciência, viciadas nas paixões e nas conquistas de curto prazo. Portanto, efêmeras!


A questão do livre-arbítrio nunca fizera tanto sentido, como nos dias atuais.

Somos sempre responsáveis pelas nossas ações. O trabalho que nos aguarda é necessário e urgente.


A Doutrina Espírita é o convite mais lúcido para o espírito que amadureceu moralmente e que deseja modelar seu roteiro divino. Atentemos para os campos verdejantes do trabalho no bem. Que nossa alma aflita encontre o refrigério do consolo e do entendimento ofertados pelos tutelados imortais e tal qual o pai de Salomão roguemos ao Pai Maior: “Vê se em minha conduta algo te ofende e dirige-me pelo caminho eterno.” [3]

Que o trabalho de edificação dos valores imortais, em nós mesmos, jamais ressoe pesado, em demasia, que as forças físicas e espirituais nunca sejam escassas.

Jane Maiolo
Fonte:
Kardec Rio Preto


Referências bibliográficas:

1. II Timóteo 3.1

2- KARDEC, Allan Kardec. O Livro dos Espíritos, 3ª edição, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 2007.

3-Salmos 139


23 setembro 2020

Não sou o único capaz - Orson Peter Carrara


NÃO SOU O ÚNICO CAPAZ

O que se vai ler abaixo é trecho de um pronunciamento de alguém que não se deixou levar pela vaidade ou por tolas pretensões oriundas do orgulho. O texto original e completo é bem longo e selecionamos aqui um único parágrafo para análise e reflexão do leitor. Referido pronunciamento foi feito em outubro de 1865. Vejam:

Deus me guarde de ter a presunção de me crer o único capaz, ou mais capaz do que um outro, ou o único encarregado de cumprir os desígnios da Providência; não, este pensamento está longe de mim. Neste grande movimento renovador tenho a minha parte de atuação; não falo senão daquilo que me concerne; mas o que posso afirmar sem vã fanfarrice, é que, no que me incumbe, nem a coragem, nem a perseverança, me faltarão. Nisso jamais falhei, mas hoje que vejo o caminho se aclarar de uma maravilhosa claridade, sinto minhas forças crescerem, não tenho mais dúvida e graças às novas luzes que praza a Deus me dar, estou certo, e digo a todos os meus irmãos, com toda a certeza que jamais tive: coragem e perseverança, porque um esplendoroso sucesso coroará vossos esforços”.

A seleção parcial está dentro de um contexto geral. Destacamos, todavia, esse parágrafo específico para apresentar uma posição bem coerente com a realidade de nossa fragilidade humana, que pede dispensar vaidades, orgulho e tolas pretensões, ao lado de intensa força pessoal construída sobre virtudes que todos podemos valorizar nesses tempos de imensa dificuldade social: coragem e perseverança.

O autor não se coloca em posição superior a ninguém, reconhece que todos tem sua parte de ação no programa geral de evolução do planeta.

Esse reconhecimento da parte de trabalho que cabe a cada um de nós no concerto geral de construção da harmonia social, onde se inclui naturalmente o próprio esforço pessoal nesse objetivo, é o primeiro passo que vacina contra vaidades ou pretensões desconectadas com nossa condição de filhos de Deus destinados à felicidade.

Todos podemos oferecer nosso trabalho, nosso esforço. Se soubermos agir com lucidez, se nos respeitarmos mutuamente, usando as ferramentas da coragem e da perseverança – como destaca o autor – um esplendoroso sucesso coroará vossos esforços, usando as palavras dele próprio.

E o que seria esse sucesso senão a vitória sobre nós mesmos, no domínio das paixões e imperfeições que ainda trazemos, no cumprimento do dever, do esforço pela conquista de virtudes, na luta pelo progresso. Exemplo claro trazido pelo Professor Denizard Rivail, que não se deixa vencer pela postura vaidosa ou orgulhosa, embora todo o trabalho que estava em suas mãos. 
 

Por Orson Peter Carrara
 

22 setembro 2020

Ditadura Juvenil - Joanna de Ângelis


DITADURA INFANTIL

A cultura hodierna exalta em demasia a juventude, oferecendo-lhe as mais belas contribuições para o prazer e o aplicar nas experiências imaturas dos compromissos para os quais ainda não se encontra psicologicamente preparada.

Muito cedo se faz a iniciação sexual, sem qualquer consciência de responsabilidade, como se fosse um jogo de sensações sem as inevitáveis consequências da concepção que abre as portas ao aborto delituoso, e, em razão da variação de parceiros aos contágios de enfermidades perversas e devastadoras.

O estímulo à frivolidade, por meio dos atrativos bem trabalhados para os jogos das paixões, e quando se anuncia o cansaço prematuro, surgem as soluções mentirosas das drogas alucinógenas que permitem a ilusão da alegria e da renovação das energias que logo se consomem.

A imaturidade dos jovens atirados à tirania do momento ligeiro que passa responde pela violência, pela exploração dos mais fracos, pela presunção ou pela perda da autoestima, por infelizes transtornos alimentares levando à anorexia e à bulimia, a fim de se submeter aos extravagantes ditames da moda em torno da beleza física, com a perda das possibilidades de um futuro feliz.

Cria-se nova linguagem, surgem comportamentos esdrúxulos estimulados pelos veículos de comunicação de massa e a vulgaridade toma conta dos arraiais da sociedade no culto exacerbado do erotismo, como se o ser humano fosse apenas o animal sexual atormentado pela libido.

A cada momento surgem os deuses da alucinação na música estranha e agressiva, sem qualquer conteúdo de harmonia, na qual a extravagância e a alucinação dão vida aos seus mitos, assim como nos esportes, nas artes, com predomínio do agressivo e do desrespeito aos valores de dignificação da Humanidade em bem-urdida campanha para o retorno ao primarismo, como se fosse possível abandonar-se todas as conquistas éticas logradas ao largo dos milênios de cultura, de civilização e de beleza...

Dá-se a impressão que o investimento da loucura tem primazia desde que se possa fruir até a exaustão, sem nenhum amanhã à vista...

Sucede, porém, que o tempo, na sua voragem inexorável, vai reduzindo em cinzas as construções de cada dia e atirando ao passado triste tudo quanto em um momento foi denominado de glória e disputa guerreira.

Onde se encontram os grandes conquistadores de um dia, sejam aqueles belicosos que conquistaram os países e os perderam, sejam aqueloutros que fascinaram a geração em que nasceram ou todos que vieram de maneira exaltada e agora se encontram nas furnas do olvido.

Astros luminosos das telas do cinema, da televisão, gênios do teatro e exemplares de incomum beleza não conseguiram manter-se na crista da onda e hoje são tristes sombras dos dias de mentirosa glória, sofrendo o abandono e a solidão, quando não devorados pelas enfermidades degenerativas ou pelo efeito dos farmaco-dependentes a que se entregaram, pelo abuso do álcool, do tabaco, dos excessos sexuais...

Quem os veja, envelhecidos, debilitados e frágeis, com a máscara da tristeza afivelada à face, não tem ideia dos seus antigos momentos de brilho e de ostentação...

Essa inevitável ocorrência sucede a todos quantos não desencarnaram no auge da fascinação que exerceram sobre as massas, tornando-se verdadeiros mitos na imaginação doentia dos seus fanáticos....

A juventude é a quadra própria para a preparação da existência, breve ou longa, em que o sentido da vida caracterizar-se á pela construção do futuro feliz, sem a perda da alegria inefável de viver com júbilo e harmonia.

Mantém-se jovem em qualquer idade todo aquele que cultiva os ideais de beleza e de serviço à sociedade, não somente os que possuem a maquinaria orgânica ainda nova, mas essencialmente quem é capaz de amar e de sorrir mesmo quando as ocorrências não se apresentam aureoladas de bênçãos, antes de reflexões e de dores que fazem parte da agenda evolutiva de todas as vidas.

Os anos juvenis são relativamente poucos, quando se trata de uma larga existência, mas tudo aquilo que foi armazenado nesse período irá permanecer para sempre como direcionador das aspirações e mantenedor dos sentimentos profundos do ser.

Jovem, desse modo, pode ser considerado todo aquele que seja capaz de olhar para trás não se envergonhando dos atos que ficaram na retaguarda constituindo-lhes algozes impenitentes geradores de culpa e de desar.

Corpos jovens existem que conduzem Espíritos profundamente comprometidos com as atitudes infelizes que resultaram da imaturidade psicológica, e que se pudessem retornar àqueles dias de descuido emocional tudo fariam por terem agido de maneira diferente.

Sendo, porém, impossível retornar para corrigir o que foi praticado equivocamente, dispõe-se do futuro que se encontra no presente ensejando um novo recomeço, uma nova atitude dignificadora cujos resultados se apresentarão no momento adequado.

Educado o jovem e informado da transitoriedade de todas as coisas terrenas e das admiráveis aquisições morais, facilmente adapta-se aos ditames da ordem e do progresso, tornando-se cidadão responsável que promove o progresso da sociedade e avança em direção à plenitude.

Desse modo, não são responsáveis os jovens pelas terríveis ondas de alucinação que varrem a Terra em todos os lados, mas aqueles que se lhes constituem modelos, na condição de educadores, de guias, mais interessados em fruir os resultados nefastos dos seus atos consumistas e mentirosos, do que promoverem as gerações novas que chegam necessitadas de diretrizes de equilíbrio e de orientação.

A cultura do corpo muito difundida estabelece os padrões de beleza esquecendo-se de informar que o indivíduo, em realidade, não é a forma, antes, pelo contrário, é a essência de que se constitui e que exterioriza, queira-o ou não através das vibrações que lhes são próprias.

Por essa razão, é demasiadamente comum encontrar-se os ídolos das massas cercados de tudo menos de bem-estar, esfaimados nos banquetes físicos pelo pão do amor real, da fraternidade legítima, da amizade, da paz interior.

Sucede que todas as conquistas externas não lograram proporcionar, conforme se esperava o desenvolvimento psíquico.

Há como efeito um terrível vazio existencial, mesmo nos jovens, quase em geral, que se atiram em busca de prazeres cada vez mais exorbitantes, pela perda da sensibilidade para as emoções simples e encantadoras da vida.

Viciados, desde cedo, facilmente entregam-se ao tédio ou às emoções fortes predatórias para se sentirem realizados.

Observe-se a conduta dos fanáticos desportistas, em suas reações contra a sociedade em geral e as pessoas em particular, quando os seus clubes não são vitoriosos, depredando, agredindo, matando em sanha selvagem inimaginável.

Juventude, no entanto, é quadra primaveril preparatória para a grandeza do verão da vida, e logo, o outono e o inverno existencial.

Para que seja revertida essa ordem de valores negativos torna-se necessário restaurarem-se os princípios psicopedagógicos da atualidade, facultando liberdades de escolhas com responsabilidades de conduta; colocando-se limites na educação doméstica, a fim de que a criança compreenda que não é um títere, mas um aprendiz da vida e que a existência não lhe transcorrerá conforme gostaria, mas consoante os padrões gerais estabelecidos por Deus.

Os transtornos e graves comportamentos de agora constituem um período de transição agressiva que cederá lugar ao de sofrimento expungitivo e de paz renovadora que virá.

Conduzir, portanto, as mentes novas aos compromissos dignificantes é dever de todos os indivíduos adultos que marcham adiante, devendo deixar-lhes a trilha evolutiva assinalada pelas bênçãos que lhes facilitem a ascensão, evitando-lhes as dores que estão programando para o futuro.
 

Joanna de Ângelis
Médium: Divaldo P. Franco
Livro: Liberta-te do Mal


21 setembro 2020

O Centro Espírita pós-pandemia - Divaldo Pereira Franco


 
O CENTRO ESPÍRITA PÓS-PANDEMIA

 
Como devem os Centros Espíritas balancear as atividades presenciais com as atividades virtuais no momento em que pudermos voltar às atividades presenciais?

R.: Nós vamos viver uma era diferente. Os instrumentos, os valores, serão um pouco diferentes. Iremos manter, naturalmente, comunicação virtual para as nossas atividades. Mas, não olvidemos das presenciais. O calor humano, o toque de mão, o olho no olho, o sorriso leal. Porque através da comunicação virtual podemos jogar a imagem que não corresponde à realidade do que somos. O nosso magnetismo intervivos é muito mais fácil quando estamos próximos.

Estabeleceremos as atividades com o público, com os sofredores, com as pessoas. E aqueloutras, de maior propaganda, de propriedade mais profunda, através dos recursos de natureza virtual e outros mais avançados que, certamente, no próximo ano, em dois anos, teremos.

Neste momento, usemos com parcimônia a comunicação virtual. Tenhamos muito cuidado para não baratear o significado profundo da Doutrina Espírita. Procuremos eleger pessoas conhecedoras da Doutrina para não corrermos o risco do fato da pessoa dizer-se espírita e ter a máxima facilidade da comunicação virtual apresentar ideias conflitantes, extravagantes, colocar apêndice na Doutrina: O meu guia espiritual pediu para que eu falasse ao grande público. – Nenhum guia espiritual faz pedido desta natureza.

Porfiemos, estimulando as pessoas para que não se utilizem da crise para se apresentar, mas que se apresentem para diminuir a crise; que não se utilizem da fama momentânea para as vaidades pessoais, – todos somos muito frágeis – mas que as nossas fragilidades sejam resguardadas. Se a pessoa não tiver facilidade de improvisar, temos dois mil títulos de obras excelentes para divulgar, ao invés de fazer improvisações que são menos eloquentes para a boa apresentação da Doutrina.

Como é natural, tudo tem seu lado positivo, também o lado oculto, o outro lado do espelho. As comunicações virtuais – tenho acompanhado algumas – são excelentes, outras nem tanto e outras sem nenhum compromisso com o Espiritismo, levando dúvidas a pessoas ainda não preparadas e demonstrando que não é tão bela a Doutrina conforme anunciamos. Precisamos conversar com os amigos para que convidem ou formem um grupo, elejam pessoas bem equipadas para falar a respeito da Doutrina. Dessa forma, devagar, escolhermos os novos Paulos de Tarso porque nem todos têm a mesma facilidade do antigo rabino.

Divaldo Pereira Franco
Texto publicado no Mundo Espírita (órgão de divulgação da Federação Espírita do Paraná) - Agosto 2020.
 

20 setembro 2020

O Suicídio e suas Consequências - Revista Espiritismo e Ciência


O SUICÍDIO E SUAS CONSEQUÊNCIAS


1. Como os Espíritos e o Espiritismo consideram o suicídio?


R: Usando unicamente os ensinos dos Espíritos constantes da Codificação, o suicídio é tido como um crime aos olhos de Deus (Céu e Inferno, cap. 5), e que importa numa transgressão da Lei Divina e constitui sempre uma falta de resignação e submissão à vontade do Criador. Desse modo, “jamais o homem tem o direito de dispor da vida, porquanto só a Deus cabe retirá-lo do cativeiro da Terra, quando o julgue oportuno. O suicida é qual o prisioneiro que se evade da prisão, antes de cumprida a pena; quando preso de novo, é mais severamente tratado. O mesmo se dá com o suicida que julga escapar às misérias do presente e mergulha em desgraças maiores” (Evangelho Segundo o Espiritismo, cap XXVII, item 71)

2. Por que os Espíritos tratam desse assunto com certa constância?

R: Primeiramente, porque ele é tema sempre atual, pois que o suicídio tem sido marca constante de nossa civilização.

Segundo, que é o mais importante: a doutrina dos Espíritos, tem um caráter consolador absoluto: através da mediunidade é permitido que os próprios suicidas venham dizer-nos que eles não morreram e afirmam que não só não solucionaram o problema que os levou ao ato extremo, como ainda estão “vivos” e, de quebra, com dois problemas: o antigo e o novo, gerado pela violação das leis da Vida. Assim, o Espiritismo trabalha preventivamente para que as pessoas saibam das responsabilidades em praticar atos que possam agravar sua situação futura e não para condená-las ao martírio eterno.

3. Quais as causas que levam o Ser ao suicídio?

R: A incredulidade, a falta de fé, a dúvida, as ideias materialistas. Em suma, crer que o Nada é o futuro, como se o Nada pudesse oferecer consolação, como se fosse remédio para supostamente abreviar o sofrimento, crença que, na verdade, se constitui em covardia moral.

4. Quais as consequências do suicídio para o Espírito?

R: Claro que há – total! Deus é Amor e Ele outorga a todas as Criaturas a maior expressão da Sua Bondade Infinita: a possibilidade de os Seres evoluírem sempre, incessantemente; permite que as existências se sucedam ofertando as oportunidades infinitas de reajuste e reforma; e isso é possível através do mais efetivo veiculo da Lei de Evolução: a reencarnação.

Portanto, os familiares do suicida de ontem ou de hoje não se exasperem, ao contrário, mantenham viva a esperança de que é possível a remissão das faltas e que o Pai de Misericórdia propiciará os meios de fazer com que o próprio autor do ato extremo se reconheça Espírito Eterno e indestrutível, e que a calma, a resignação e a fé serão os mais seguros preservativos contra as ideias autodestrutivas. Não será demais que se lhes repita: Deus é Bondade Infinita e, portanto, não permite que Suas Criaturas sofram indefinidamente e que esse sofrimento poderá ser abreviado mais rapidamente mercê de orações sinceras e cheias de amor de todos quantos querem que se restabeleça o Bem.


Revista Espiritismo e Ciência 11, páginas 06-08

19 setembro 2020

Quando eu voltar - Momento Espírta


 
QUANDO EU VOLTAR!


Eu tenho a firme convicção de que não vivemos uma única vez nesta Terra abençoada por Deus.

Tenho a convicção plena de que já vivi muitas experiências.

Como explicar, senão dessa forma, que meu coração bata descompassado ante certas paisagens do mundo? Paisagens que jamais visitei na presente existência mas que as contemplo como velhas conhecidas.

Como explicar que ouvindo determinado idioma, que não o do meu país natal, me aguce o cérebro e eu sinta como se conhecesse todas aquelas palavras, que soubesse pronunciar todos aqueles vocábulos?

Paisagens, sons, pessoas. De repente, tudo vai se sucedendo em minha mente como múltiplas lembranças. Não muito nítidas, mas nem por isso menos autênticas.

Pareço recordar paisagens da Gália, com seus cultos, suas crenças, seus sacerdotes druidas.

Peregrino pelo vale do Loire, entre castelos, como se fossem dias vividos, sofridos, passados.

As pirâmides do Egito, as areias do deserto, reis, escravos, nações que se digladiam.

Ásia, Oceânia, Europa. Por onde terei andado em tantas e multiplicadas vidas, entre muitas posses ou na quase miséria?

Com acesso às conquistas do intelecto ou iletrado, entre o povo ignorado?

Quantas vestes terei usado? De poder ou de submissão. Mantos de veludo, coroas, andrajos que mal cobriam o corpo.

Terei vivido recluso em mosteiros, montanhas? Ou livre, em cidades populosas?

A memória não permite acesso integral a tudo que fui, tudo que experienciei.

Mas, como afirmava o Apóstolo Paulo, Graças a Deus sou o que sou. Por isso, ouso erguer a fronte e sonhar.

Sonhar com meu retorno a esta terra bendita. Quem sabe quando se dará. Talvez décadas. Ou séculos.

Não importa. Penso e planejo o que desejo para quando eu voltar.

Com certeza, retornarei a esta Terra abençoada porque reconheço não ter pago até o último ceitil, conforme advertiu o sábio de Nazaré.

E, se nesta vida, aprendi a me extasiar com a beleza arquitetônica de prédios antigos, que sobreviveram ao tempo, quem sabe eu possa retornar como alguém que, qual novo Mecenas, possa restaurar tantos daqueles carcomidos pelo tempo.

Se agora plenifico a alma ouvindo a música que me enche os ouvidos, talvez eu possa retornar como alguém dedicado à arte musical. Serei, quem sabe, um virtuose do violino, do cello, do piano...

Ou então eu possa retornar com uma flauta mágica engastada na garganta e solte a voz em todos os tons, em caprichosas escalas.

Quiçá, como Bach, um dia, eu possa dizer que nasci para louvar a Deus, através das árias mais sublimes, executadas de forma magistral, arrebatando as almas em êxtase.

Ou retornarei como exímio pintor que reproduzirá em telas magníficas paisagens de uma outra dimensão, entrevistas em noites de sonho.

Penso e sonho. Em verdade, o mais importante é saber que voltarei.

Voltarei para esses campos do planeta azul e amarei a pátria onde renascer. Talvez até precise aprender um novo idioma.

Novo aprendizado.

No entanto, com certeza, nas noites brilhantes, olharei para os céus, contemplarei as estrelas, identificarei outros mundos, celestes moradas que me aguardam num futuro distante.




18 setembro 2020

Analisando mais uma vez a “Transição Planetária” - Vania Mugnato de Vasconcelos


ANALISANDO MAIS UMA VEZ A "TRANSIÇÃO PLANETÁRIA"

“Não tem problema não ter certeza”. (Carl Sagan)

Nos últimos meses tratei de vários modos sobre o tema TRANSIÇÃO PLANETÁRIA, explicando sob a ótica espírita que a Terra não mais se classifica de modo absoluto como Mundo de Expiações, pois adentramos na era da Regeneração com a ainda lenta, mas paulatina, implantação das características de um mundo melhor.

Também nos últimos meses tive várias surpresas. DESCOBRI pessoas que não imaginaria, apoiando como eu a ideia de que essa transição não será tão suave quanto se pensa; PENSEI que teria apoio e compreensão da maioria dos incansáveis trabalhadores da seara espírita, mas os vi simplesmente negarem-se a discutir o assunto achando ser tolice, fanatismo, fascinação ou assunto não espírita; PERCEBI pessoas brincarem com o tema e com a preocupação que há em esclarecer que se a transição tiver algum reflexo material (e mudança material gera desconforto, senão dor), precisaremos estar prontos, sem medo do fim, preparados para continuar; CONHECI muitas pessoas preocupadas com o assunto, as quais buscam obter dos espíritas a resposta mais racional, mais lúcida, menos fantasiosa que se possa encontrar a respeito, frustrados quanto a isso, pois, como disse, a maioria acha que está tudo em ordem, que Deus, por ser bom, preservará os bem intencionados, entendendo que é exagero a preocupação com qualquer mudança mais abrupta, sem lembrar da lei de causa e efeito e tudo o que semeamos outrora.

O fato é que o assunto da evolução planetária foi discutido por milênios e para todos os que viveram antes foi apenas especulação, enquanto nós vivemos ao vivo e a cores o que nos levará ao futuro da humanidade terrena. Por isso é importante voltar sempre ao assunto, na intenção de ajudar no preparo de cada alma, para que enfrentem com otimismo, coragem, resignação e fé nos desígnios divinos, quaisquer eventos imprevisíveis.

Quanto ao fim da Terra, está mais do que esclarecido que não será algo material, mas uma alteração de ordem moral, ela não será destruída antes de alguns bilhões de anos. Quanto ao fim da humanidade, isso depende de nós, não do planeta, pois a humanidade é resultado de nossas escolhas, decisões, modo de tratar e nos relacionarmos com a natureza, os animais e o próximo deste e de outros países.

O que podemos esperar? Não sabemos e, como disse Carl Sagan, não há nenhum problema em não ter certeza; mas não seria bom pensar e preparar-se para qualquer eventualidade?

Tenho a convicção absorvida no Espiritismo, de que a transição é eminentemente MORAL. Todos os indícios diretos e indiretos dentro da Doutrina Espírita afirmam que o homem ainda precisa evoluir moralmente para merecer manter-se no planeta Terra, renovado por valores mais nobres. No entanto, sabemos muito bem que não escapamos das plantações realizadas e recordamos que nossa história foi de semeaduras amargas: egoísmo, orgulho, belicosidade, separativismo… sabendo que a lei de causa e efeito existe, por qual razão haveria ela de não nos fazer corrigir tudo o que destruímos ou adulteramos, antes de merecer viver definitivamente num mundo melhor?

Desde a época da criação da Codificação Espírita (1857) fala-se que a era de Regeneração chegou e seria implantada mesmo contra nossa vontade, ou seja, ficará no planeta aquele que estiver dentro do novo padrão planetário. Nenhuma mudança miraculosa irá ocorrer, mas essa mudança aproxima-se a olhos vistos. Observem o mundo com mais atenção: mais pessoas más (joios manifestando-se); mais pessoas boas (trigo dando frutos); mais pessoas questionando, optando por mudar aquilo a que se tinham acostumado (saindo da posição acomodada e omissa); e muitas coisas tidas por “normais” ocorrendo em escala mais frequente e intensa que antes (terremotos, furacões, calor e frio fora de época etc).

Digo a vocês: a transição não será pacífica (digo sem dificuldades), pois não fizemos por merecê-la assim. Mas será menos dura do que seria, pois estamos nos esforçando em mudar para melhor. Não fizemos o suficiente ainda, por isso precisamos de todos focados na certeza de que o “amor cobre uma multidão de pecados” (I Pedro, 4:8) e, em amando para “ontem” ajudaremos que o mundo de expiações torne-se logo, apenas história…
 

Vania Mugnato de Vasconcelos
Fonte: Kardec Rio Preto
 

17 setembro 2020

A delicada e feminina questão do aborto - Marcelo Teixeira


A DELICADA E FEMININA QUESTÃO DO ABORTO

Dado o caso que o nascimento da criança pusesse em perigo a vida da mãe, haverá crime em sacrificar-se a primeira para salvar a segunda?

Resposta: Preferível é se sacrifique o ser que ainda não existe a sacrificar-se o que já existe.

“O Livro dos Espíritos”, de Allan Kardec, questão 359.

Já pensei várias vezes em escrever sobre aborto, assunto que requer vários ângulos de compreensão e compaixão. Sempre esbarrei, no entanto, nas seguintes considerações: eu tenho útero, vulva, clitóris, trompas e ovário? Eu ovulo, menstruo, corro o risco de ser assediado sexualmente, ser estuprado e passar por uma gravidez de baixo ou alto risco? A resposta será sempre não por uma simples razão: sou do sexo masculino. Por essa razão, não tenho como avaliar as dores e delícias de ser mulher e mãe. Eu não sinto isso na pele.

Dou início dizendo o óbvio porque me assusta a quantidade de homens – incluindo alguns espíritas – que vão para os púlpitos, tribunas e similares criticar com veemência a mulher que faz aborto; legislar de forma a criminalizá-las; condená-las ao inferno, umbral, reencarnações dolorosas e similares. Dizia o filósofo e escritor suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) que “O homem é produto do meio”. Sendo assim, por estarmos num país machista, muitos homens espíritas não deixam de sê-lo, apesar de serem espíritas.

Se o espiritismo é ciência, filosofia e religião, por que muitos de seus profitentes se agarram ao aspecto religioso, levam-no para os confins do medievalismo e transformam a doutrina codificada por Kardec em algo rígido que condena mulheres que praticaram aborto a duras penas? Onde o “Amai-vos uns aos outros”? Onde o “Quem não tiver pecado, atire a primeira pedra”? Onde a solidariedade que acolhe e a compaixão que cura as feridas morais? Onde a empatia para nos colocarmos no lugar dessas mulheres? Onde, enfim, a ciência que analisa e a filosofia que nos ensina a relativizar e contextualizar os fatos, a fim de percebermos que cada caso é um caso e que não podem ser analisados sob a mesma ótica? Sim; cada aborto é um aborto. Cada um deles contém meandros que envolvem a vida íntima da mulher, o ambiente em que ela foi criada, os sentimentos (raiva, medo, angústia, desespero etc.) pelos quais ela está passando, sua situação socioeconômica, entre outros tantos e tantos fatores.

Resolvi escrever a respeito de tão delicado e ao mesmo tempo espinhoso tema depois do ocorrido com a menina capixaba de 10 anos. Desde os 6 anos, ela era sistematicamente estuprada por um tio. O Brasil inteiro começou a opinar, incluindo vários representantes do movimento espírita que, por serem espíritas, acreditam ter opinião formada e definitiva a respeito de tudo. Não temos, convém frisar. O fato de sermos espíritas não nos dá pleno conhecimento e autoridade para emitirmos opiniões definitivas sobre todo e qualquer tema. Bem melhor analisarmos cada situação separadamente, à luz da razão, como preconiza Allan Kardec.

Recebi pela rede social messeger uma postagem de Marcos (nome fictício), presidente de centro espírita. Ela dizia respeito a uma visita que um grupo de católicos fez ao hospital onde foi realizado o aborto legal, enfatizo. Os católicos queriam que a gestação fosse levada a termo, pois já tinham uma família disposta a adotar o bebê. Mas, como se sabe, a gravidez – de risco, diga-se – foi interrompida, conforme preconiza a lei brasileira, que autoriza a cessação da gravidez em casos de estupro.

Perguntei a Marcos se ele também achava que o aborto deveria ser impedido. A resposta é um fiel retrato de como pensa a fatia conservadora e machista do movimento espírita: “Por acreditar que Deus permitiu a gravidez e que Deus não erra, sou contra qualquer aborto. Além disso, precisamos considerar as consequências para todos os espíritos envolvidos neste caso”.

Atônito, perguntei se ele achava que Deus também permitiu que a menina fosse estuprada pelo tio. Aproveitei o ensejo e lembrei-lhe que, há alguns anos, ocorreu um caso semelhante em Alagoas, se não me engano. Uma menina de 11 anos fora estuprada, engravidara de gêmeos e fora submetida ao aborto terapêutico. Ante a gritaria de vários religiosos, à época, Gérson Simões Monteiro, palestrante e escritor espírita do RJ, defendeu o aborto nesse caso específico. Afinal, tratava-se de uma criança vítima de estupro submetida a uma gravidez com alto potencial para tirar-lhe a vida. Gérson reiterou, ainda, que, se fosse o caso de os gêmeos estarem programados para serem filhos dela, a Providência Divina daria o ensejo de, mais adiante, ela ser mãe de ambos, já adulta e senhora de si. Como Marcos retrucou e começamos a ir para o desagradável terreno da troca de farpas, encerramos o assunto.

Muito me choca a postura conservadora e embotada desse tipo de espírita. Assim como o caso defendido pelo Gérson, a menina do ES não tinha estrutura física para levar uma gravidez até o fim. O risco de que ela perecesse era alto. Num caso grave como esse, é melhor o espírita posicionar-se a favor da proteção da menina e para que o tio estuprador responda pelo crime que cometeu. Isso não significa gritar palavras encolerizadas para que a lei seja severa. O caso precisa ser apurado; o culpado (ou culpados) tem de responder pelo que fizeram. No entanto, não percamos de vista a piedade para com os criminosos.

Depois desse entrevero entre mim e Marcos, resolvi dar uma olhada no perfil de alguns espíritas que, em geral, se posicionam contra o aborto. Vi homens e mulheres preocupados somente com o feto, gente sugerindo o que a menina e familiares deveriam fazer após o nascimento da criança. Isso sem falar nos vídeos em que expositores (homens, em sua maioria) falam que tudo estava programado, que a menina tinha de passar pela prova da gravidez em tenra idade, que decerto algo de errado ela fez no passado, que o referido aborto havia sido um crime… Deparei-me também com uma nota seca e cruel da Associação Médico Espírita (AME), que deixa um rastro de punição e passa longe do carinho que deveria receber uma criança de 10 anos vítima de uma violência abjeta. Tão fácil deliberar sobre a vida alheia e fazer generalizações rasteiras tendo a doutrina espírita como pretexto! Por favor, companheiros de ideal espírita, tenhamos delicadeza ante a dor alheia!

Confesso que teria me sentido confortado se tivesse visto mais espíritas saindo em defesa de uma criança que deve ter vivido dias infernais nos últimos quatro anos. Um inferno que deve ter sido um misto de ansiedade, revolta, medo, depressão, sensação de abandono, carência, desespero…

Eu sou contra o aborto, é bom salientar! Seis das implicações espirituais que ele acarreta. Mas também sei que Deus é misericordiosamente justo e bom e que não analisará todos os abortos sob a mesma ótica. Cada caso é um caso e depende de diversas circunstâncias (culturais, familiares, sociais, econômicas, psicológicas etc.). Isso tem a ver com não julgar, acolher, ajudar e por aí vai. A lei é de amor, não nos esqueçamos! Ainda mais quando se trata de uma garotinha seviciada por quatro anos!

O jornalista e ambientalista André Trigueiro (que é espírita), em transmissão ao vivo realizada pela rede social Instagram na manhã de 18 de agosto de 2020, observou que a menina, segundo informado pela avó, vinha tendo crises de histeria por não querer o filho que o tio lhe impôs. E que, no hospital de Recife (PE), onde foi realizado o aborto autorizado pela justiça, é feito, toda semana, pelo menos um procedimento semelhante em menores de idade vítimas de estupro, conforme declaração do diretor da instituição. Ou seja, a questão é bem mais grave do que se pensa neste Brasil carente de educação, saúde, qualidade de vida, justiça, cidadania, amparo social… Carências que resultam em problemas de variada monta. Entre eles, crianças sendo violentadas.

Analisando os fundamentalistas de direita que se dizem cristãos e que foram para a porta do hospital ofender a menina e a equipe médica, André salientou ser muito o grave o fato de confundirmos o público com o privado. André é contra o aborto, assim como eu e todos os espíritas, creio. Mas isso é uma questão nossa. Uma questão privada, de foro íntimo.

O Estado, todavia, é laico, ou seja, não tem religião. Por isso, é muito absurdo querer que todas as pessoas enxerguem a interrupção proposital da gravidez da mesma forma que a minha religião enxerga. Por isso, em vez de julgar com impiedade e frieza uma criança de 10 anos, o melhor que temos a fazer é respeitar a cidadania e o direito legal que uma menina ou mulher possui de passar pelo procedimento do aborto caso tenha sido violentada. Não é caridoso, nessas horas, querer enfiar conceitos espíritas pela goela alheia.

Volto à questão dos homens que levantam a voz contra o aborto. O Congresso Nacional é composto, em sua maioria, por deputados e senadores do sexo masculino. Muitos deles, profitentes de religiões conservadoras. E machistas também. Homens que, assim como eu, não possuem trompa, útero e afins. Tampouco correm o risco de estupro ou de passar por uma gravidez de risco. Em vez de condenarem a mulher que aborta, por que não elaboram leis que punam o homem que aborta? Será que o machismo corporativo não permite? Afinal, quando uma mulher recorre ao aborto, o homem que a engravidou já abortou a criança antes, seja abandonando a parceira, mandando ela se virar, fugindo para não pagar pensão ou para não ser preso etc.

Não seria melhor todos os homens, sem exceção, se meterem o menos possível no assunto e deixarem as mulheres decidirem o que melhor lhes convém? Falo sobre deputadas e senadoras reunidas com mulheres representantes de vários segmentos sociais e profissionais para legislarem em causa própria. Fica a sugestão.



16 setembro 2020

Como o Luto das Pessoas pode afetar os Espíritos que Desencarnaram? - Adriana Machado


COMO O LUTO DAS PESSOAS PODE AFETAR OS ESPÍRITOS QUE DESENCARNARAM?

Como ficamos quando os nossos entes amados se vão e como os afetamos mesmo que indiretamente?

A primeira parte da pergunta é muito fácil de ser respondida: nós ficamos muito tristes. Isso é um fato. Muitos são os sintomas que podem ser vivenciados profundamente por cada um de nós: a saudade bate, arrependimentos se fazem presentes, a culpa por atitudes impensadas martela o nosso coração…

Na maioria das vezes, sentimos um vazio em nossas vidas que, a cada dia, nos faz lembrar que alguém deixou de estar conosco. Então, nós sofremos: sofremos pouco, sofremos muito, sofremos bastante… depende de cada um de nós.

Mas, em nosso egocentrismo pensamos que somente nós sentimos saudade. Esquecemos que não existe morte e que, do outro lado da vida, aqueles que são alvo de nossa saudade também a sentem e com intensidade.

Esquecemos que, se eles estão vivos, também estarão sentindo a mesma ausência, a mesma saudade, a mesma dor por terem tido a necessidade de se ausentar de uma vida que, em muitos casos, nem queriam perder.

O interessante, todavia, é que as nossas emoções não se fixam somente em nós, estejamos nós no plano material ou espiritual. O amor nos liga ao ser amado aonde quer que ele se encontre.

Vamos pensar: se estamos o tempo todo em constante ligação energética com quem amamos, imaginem se estivermos (desencarnados) fixados em alguém (encarnado) que está portando sentimento de tristeza, de saudade, de arrependimento e de culpa que foram construídos pela nossa ausência (no desencarne)? Imaginem que pudéssemos sentir tudo isso com muita intensidade! Se não é fácil lidar somente com as nossas dores, imagine nos depararmos com a dor que “provocamos” em alguém que amamos. Pois é o que acontece! Quando estamos no plano extrafísico, as emanações energéticas exacerbadas de nossos entes encarnados chegam a nós com intensidade e são quase audíveis.

Por isso, se amamos a quem se foi, temos que tomar cuidado com os sentimentos que alimentamos. Porque sentir é uma coisa, alimentar esse sentimento é outro bem diferente.

Para todo espírito que desencarna e que se encontra em um equilíbrio razoável (segundo a sua própria evolução), existe uma proteção natural que o isolará dos sentimentos normais de saudade dos entes que ficaram, dando-lhe a oportunidade de uma adaptação à sua nova etapa de vida.

O problema é quando não acontece assim. O espírito pode chegar portando algum nível de desequilíbrio que somado ao fato dos seus entes amados estarem sofrendo devastadoramente, fazem com que ele não consiga lidar bem com o seu retorno às esferas espirituais.

Ele pode sentir que precisa ajudar aos seus e, por uma escolha muito equivocada, desejar estar com eles nas esferas carnais.
Imediatamente, ele se desloca para junto dos seus amados, fazendo com que todos entrem num processo prejudicial de influenciação.

Se não ficou claro, eu explico: todo espírito é livre para fazer o que quiser e, no plano espiritual, estará onde ele mais se identifica. Se ele deseja estar com os seus entes queridos, ele poderá se deslocar para junto deles. Mas, o problema é que ele não sabe o que fazer, porque ainda não se adaptou ao plano etéreo.

Então, em decorrência de uma postura de sofrimento exagerada adotada pelos próprios entes encarnados, inicia-se um processo obsessivo destes junto ao desencarnado, escravizando-o e alimentando uma ligação dolorosa de sofrimento mútuo.

Vê-se, portanto, que esse processo de influenciação pode partir dos encarnados. E isso em razão da ignorância daqueles que amam, mas que não conseguem amar livremente. Não conseguem libertar o alvo de seu amor, por acreditar que eles (encarnados) somente serão felizes ao lado daquele que se foi. Não conseguem entender que amar é libertar, é aceitar os desígnios de Deus, quando chega o momento em que os seres que se amam precisam se distanciar por algum tempo. Não acreditam que a ponte de amor que os une é forte para jamais se romper.

Por isso, precisamos ficar atentos aos nossos sentimentos desequilibrantes, seja para dar alento ao coração daquele amado que se distanciou, seja para que possamos aprender o melhor desse momento doloroso e trazermos paz ao nosso próprio coração.

Por incrível que pareça, a saudade é um sentimento importante em todos os seres, mas que quando em exagero, nos traz sofrimentos incalculáveis.

Se não sentíssemos saudade, não daríamos a devida importância àquela pessoa em nossa vida. Mas, para o nosso próprio bem, cabe a nós compreendermos que essa saudade deve caber em nosso coração. Se for maior do que ele, nos sufocará, bem como sufocará o ente amado que a sentirá com todas as dores construídas por nós e que a ela (saudade) forem somadas.

Portanto, acreditemos que somos capazes de viver a vida com a lembrança saudosa dos nossos entes queridos. Assim, estaremos construindo um futuro de felicidade para nós e para eles, dando-nos a condição de quando chegar a nossa vez de viajar para o outro lado, estejamos aptos para sermos recebidos com louvor por estes seres tão amados.


Adriana Machado
Fonte: Kardec Rio Preto