VENÇA A SI MESMO
Não consideremos o labor do aprimoramento moral como algo extraordinário, porquanto para isso é que nos encontramos reencarnados
“(...) Na ordem dos sentimentos, o dever é muito difícil de cumprir-se... Não têm testemunhas suas vitórias.” - Lázaro [1]
O grande desafio dos tempos hodiernos é o homem vencer-se a si mesmo, pois, encurralado por soez hedonismo e sufocante materialismo, distancia-se, dia a dia de sua identidade cósmica. Assim, sequestrado pelo imediatismo, não consegue vislumbrar os painéis do infinito espiritual que o aguarda.
Torna-se quase incompreensível – para muitos – a conclamação de Jesus [2]:“Sede perfeitos como perfeito é o Pai Celestial”.
Segundo Lázaro1, “temos que refletir as virtudes do Eterno, que não aceita esboços imperfeitos, porque quer que a beleza da Sua Obra resplandeça aos olhos de cada criatura” emancipada.
A arena das lutas humanas está doravante localizada nas mais íntimas anfractuosidades da alma. A conquista das virtudes (tesouros do Céu), eis a meta assinalada para todos nós! Mas como lograr tal desiderato ante tantas circunstâncias adversas, em especial perante nossas próprias limitações?!
“Eu venci o mundo”, proclamou Jesus [3]. E sendo Ele o nosso Modelo e Guia mais perfeito [4], urge também que obtenhamos a vitória do Espírito sobre as iniquidades mundanas em que pesem as sabotagens da matéria.
Em página enriquecedora e de peregrina beleza, Joanna de Ângelis [5], através da psicografia de Divaldo Franco, vem nos auxiliar no âmbito da autossuperação abordando a magna questão das lutas íntimas: “(...) Ninguém tomará conhecimento desse esforço hercúleo que desenvolves em favor da felicidade real, pois as pessoas estão acostumadas às exteriorizações, às fugas psicológicas, às conquistas de ocasião, que as projetam no mundo econômico, social, político, artístico, responsáveis pela exaltação do ego.
Há uma corrida desenfreada na busca do sucesso externo, sem que se dê importância à autorrealização, aos componentes da harmonia pessoal, à vitória sobre as paixões desenfreadas e perturbadoras... Todo o interesse social está centrado na imagem, na aparência que chama a atenção, que desperta inveja e comentários, mesmo quando se está jugulado aos conflitos íntimos difíceis e à tremenda solidão no meio da balbúrdia e do aplauso vazio. Para anular essa situação, foge-se para a embriaguez dos sentidos, para o álcool, o fumo desordenado, as drogas aditivas, o sexo desenfreado...
As convenções sociais deficientes estabeleceram que todas as realizações que dão respostas imediatas e produzem prazer devem ser as metas a serem conquistadas. Essa proposta falsa nas suas bases transforma o ser humano em um feixe exclusivo de sensações, que devem ser supridas ininterruptamente, embora a fragilidade do vaso orgânico e as suas complicadas tecelagens emocionais, susceptíveis de conflitos e desarranjos frequentes...
As tuas são lutas íntimas que deves travar em silêncio, sem qualquer alarde, porque te concederão a medida exata de quem és e do que podes fazer em benefício próprio. Trata-se de um grande esforço, para o qual não conseguirás aplauso nem contribuição exterior. É uma batalha sem quartel que todos são convocados a atender, queiram ou não.
Sempre chega o dia, no qual, mesmo os mais resistentes são conduzidos às reflexões, ao amadurecimento mental, à meditação.
Realiza a tua luta íntima constantemente, analisando as tuas dificuldades, deficiências e limites após relacioná-los por escrito ou na memória, de forma que possas diluí-los suavemente, com tranquilidade, superando cada um, à medida que te libertes do anterior. Isso demandará um esforço gigante, porém, rico de gratificação. Toda ascensão cobra o tributo do sacrifício, para brindar com as paisagens emolduradas de beleza, inabituais e fascinantes.
O país íntimo em que tu, como Espírito, te domicilias - esse corpo transitório - alberga as marcas das existências passadas, nem sempre saudáveis, que hoje ressurgem desafiadoras na condição de problemas graves que podem conduzir a abismos inesperados. Somente adentrando-te nele, passo a passo, como o conquistador que penetrando uma região desconhecida e se deslumbra à medida em que a vence, é que poderás libertar-te das aflições, superando as paixões dissolventes e anestesiantes.
Não te detenhas em postergações, acreditando, por mecanismo de fuga, que realizarás amanhã ou depois, o que poderias iniciar agora. Esse amanhã é um engodo psicológico para impedir-te a libertação... Começa, portanto, das perturbações mais simples e cresce em coragem para prosseguir sem desfalecimento. Cada vitória sobre ti mesmo, por menor que se apresente, representa uma conquista, que abrirá lugar para novas e oportunas vitórias. Desse modo, luta e luta, discretamente, aprimorando-te, superando-te, com a alegria de quem está conquistando o Universo, cosmo grandioso que és. Nesse tentame não te faltarão apoio nem ajuda dos teus Amigos Espirituais interessados na tua evolução. Lembra-te que os legítimos conquistadores da Humanidade venceram-se primeiro a si mesmos, discernindo a respeito daquilo que desejavam e de como fazê-lo, a fim de adquirir resistência para as façanhas a que se entregariam. Terminado esse difícil estágio, partiram para etapas mais cansativas, mas, no entanto, fadadas à vitória.
As grandes lutas sempre são travadas no campo da consciência, onde se homiziam os maus pensamentos e pendores, mas também no qual se hospedam os sentimentos de nobreza e de enriquecimento da Humanidade.
Nunca te canses de aprimorar-te, nem consideres esse labor como sendo extraordinário, porquanto para isso é que te encontras reencarnado”.
Rogério Coelho
[1] - KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. 121. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2003. cap. XVII, item 7.
[2] - Mateus, 5:48.
[3] - João, 16:33.
[4] - KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 83. ed. Rio de Janeiro: FEB, 2002, q. 625.
[5] - FRANCO, Divaldo. Sendas Luminosas. Votuporanga: DIDIER, 1998, p.p. 83-85
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