Total de visualizações de página

11 fevereiro 2017

Os que ficam - José Herculano Pires



OS QUE FICAM

“Os que se foram, se foram... Mas, os que ficam estão se queimando para muito tempo. Quando se libertarão desse fogo que não se extingue? Só eu sei o que estou sofrendo para toda a vida!”

Assim me falou, pelo telefone, o pai invisível e desconhecido que perdeu dois filhos no incêndio do Edifício Joelma.

Quis dizer-lhe algumas palavras de consolo fraterno, mas ele desligou o telefone. Não que ria consolo nem explicações.

Queria apenas colocar uma interrogação de fogo na mente de um tolo que acredita em Deus. Lembrei-me da prece de Emmanuel, psicografada por Chico Xavier no dia mesmo do incêndio. Ali encontramos este pequeno trecho: “Tocados pela dor dos corações que ficam na Terra, tantos deles tateando a lousa ou investigando o silêncio, entre o pranto e o vazio, aqui estamos a rogar-te alívio e proteção para cada um”.

As grandes provas atingem os que vão e os que ficam. E quase sempre os que ficam pagam mais caro. Emmanuel definiu bem essa angústia sem limites, que não obstante se fecha nos limites exíguos entre o pranto e o vazio, entre a dor e o silêncio. Mas, esse desespero nasce da falta de conhecimento positivo das leis que regem a vida humana. As religiões nos ensinam que deus criou o mundo e nos criou, pondo-nos na Terra por causa do pecado original. Essa explicação ingênua, que servia para os povos camponeses, há muito que perdeu o sentido para os homens das grandes civilizações. Não há lógica nesse padecer da humanidade causado pela desobediência do casal primitivo.

Trata-se de um mito, é evidente. E os mitos são lógicos, mas precisam ser decifrados. O Espiritismo decifrou o mito e as religiões o repeliram e condenaram por isso.

Mas, a Era da Razão necessita da explicação do mito. E é esse, no plano religioso, um dos motivos da expansão do movimento espírita em nossos dias.

Não estamos na Terra para pagar a desobediência de Adão e Eva. Aqui estamos para evoluir, para desenvolver o nosso espírito, para superar a condição precária e passageira em que nos encontramos num corpo de carne e osso, de natureza inegavelmente animal. Essa a verdade.

Como o sabemos, como podemos fazer essa afirmação enfática? Sabemo-lo através das escrituras sagradas de todas das grandes religiões, através da Bíblia e dos Evangelhos de Jesus e principalmente através das pesquisa s da Ciência Espírita, hoje em fase acelerada de confirmação pelas pesquisas científicas do próprio campo materialista. Não se trata de crença ou de fé, mas de certeza cientificamente demonstrada.

O homem não é uma obra acabada, um ser completo e perfeito, mas um ser em formação, como o afirmou o cientista inglês Sir Oliver Lodge. Nosso corpo animal é apenas uma forma de manifestação do nosso espírito no plano da matéria densa. Temos corpo animal e corpo espiritual, como ensinou o apóstolo Paulo em I Coríntios. Morremos e ressuscitamos.

Cada existência na Terra é uma fase do nosso desenvolvimento espiritual, do nosso crescimento como espíritos, pois, somos espíritos e não corpos materiais. Pode um homem crescer e se tornar apto para a vida sem passar pelas experiências de suas fases de crescimento?

Como espíritos somos seres conscientes, dotados de razão, de capacidade de pensar, discernir e escolher. Temos livre-arbítrio. Podemos tomar decisões, fazer o que nos apraz, na medida das condições humanas na Terra. Erramos, cometemos abusos e crimes, afundamos no vício e na crueldade, no orgulho e na vaidade. Mas, temos a consciência que é a nossa bússola no caminho evolutivo e o nosso tribunal interno.

Nossa consciência está sintonizada com os objetivos da nossa vida como espíritos. Está sintonizada com as leis de Deus. Quando fraudamos essas leis em favor de nossos interesses humanos e terrenos nossa consciência nos acusa e nos chama à razão. Ela mesma nos julga em nome de Deus e nos conde na às provações que podem corrigir-nos. A consciência é a guarda, a vigilante da nossa evolução. Ela nos força à correção, exigindo-nos a reparação dos males que causamos aos outros no abuso do nosso livre- arbítrio. Não é Deus quem nos condena, somos os mesmos que nos penitenciamos dos erros que cometemos. Isso podemos ver a qui mesmo, na Terra, quando o aguilhão da consciência nos fere.

Nosso destino não é a morte material, mas a ressurreição espiritual. Deus não quer mandar-nos para o Céu ou para o Inferno das religiões. Deus quer levar-nos para as muitas moradas da Casa do Pai a que se refere Jesus nos Evangelhos. Essas moradas são mundos melhores, superiores e felizes que nos aguardam no Infinito.

As provas coletivas, como a dos incêndios, dos desastres, das catástrofes, envolvem criaturas que se acumpliciaram em vidas anteriores na prática das atrocidades de que a História está cheia, essa História da Humanidade que nos estarrece quando a lemos em profundidade. E os que ficam estão acumpliciados como os que vão, têm também o que pagar.

Por mais intensa que seja a dor dos que ficam,  por maior que seja o seu desespero, a verdade é que no fundo de seus corações ecoa a voz da consciência, advertindo-os de que estão se livrando de pesados débitos contraí dos para consigo mesmos, perante as leis divinas. Deus põe o remédio ao lado da ferida, o bálsamo ao lado da dor



José Herculano Pires


Nenhum comentário: