“Os que se foram, se foram... Mas, os que ficam estão se queimando para muito
tempo. Quando se libertarão desse fogo que não se extingue? Só eu sei o que estou
sofrendo para toda a vida!”
Assim me falou, pelo telefone, o pai invisível e desconhecido que perdeu dois filhos
no incêndio do Edifício Joelma.
Quis dizer-lhe algumas palavras de consolo fraterno, mas
ele desligou o telefone. Não que
ria consolo nem explicações.
Queria apenas colocar uma
interrogação de fogo na mente de um tolo que acredita em Deus.
Lembrei-me da prece de Emmanuel, psicografada por Chico Xavier no dia mesmo
do incêndio. Ali encontramos este pequeno trecho: “Tocados pela dor dos corações que
ficam na Terra, tantos deles tateando a lousa
ou investigando o silêncio, entre o pranto e o
vazio, aqui estamos a rogar-te alívio e proteção para cada um”.
As grandes provas atingem os que vão e os
que ficam. E quase sempre os que ficam
pagam mais caro. Emmanuel definiu bem essa
angústia sem limites, que não obstante se
fecha nos limites exíguos entre o pranto e o
vazio, entre a dor e o silêncio. Mas, esse
desespero nasce da falta de conhecimento positivo das leis que regem a vida humana.
As religiões nos ensinam que deus criou o mundo e nos criou, pondo-nos na Terra
por causa do pecado original. Essa explicação ingênua, que servia para os povos
camponeses, há muito que perdeu o sentido para os homens das grandes civilizações. Não
há lógica nesse padecer da humanidade causado pela desobediência do casal primitivo.
Trata-se de um mito, é evidente. E os
mitos são lógicos, mas precisam ser
decifrados. O Espiritismo decifrou o mito e as
religiões o repeliram e condenaram por isso.
Mas, a Era da Razão necessita da explicação
do mito. E é esse, no plano religioso, um dos
motivos da expansão do movimento espírita em nossos dias.
Não estamos na Terra para pagar a desobediência de Adão e Eva. Aqui estamos para
evoluir, para desenvolver o nosso espírito, para
superar a condição precária e passageira em
que nos encontramos num corpo de
carne e osso, de natureza inegavelmente animal. Essa a
verdade.
Como o sabemos, como podemos fazer essa
afirmação enfática? Sabemo-lo através
das escrituras sagradas de todas das grandes religiões, através da Bíblia e dos Evangelhos
de Jesus e principalmente através das pesquisa
s da Ciência Espírita,
hoje em fase acelerada
de confirmação pelas pesquisas científicas
do próprio campo materialista. Não se trata de
crença ou de fé, mas de certeza cientificamente demonstrada.
O homem não é uma obra acabada, um ser
completo e perfeito, mas um ser em
formação, como o afirmou o cientista inglês Sir Oliver Lodge. Nosso corpo animal é apenas
uma forma de manifestação do nosso espírito
no plano da matéria densa. Temos corpo
animal e corpo espiritual, como ensinou o apóstolo Paulo em I Coríntios. Morremos e
ressuscitamos.
Cada existência na Terra é uma fase
do nosso desenvolvimento espiritual, do nosso
crescimento como espíritos, pois, somos espíritos e não corpos materiais. Pode um homem
crescer e se tornar apto para a vida sem passar pelas experiências de suas fases de
crescimento?
Como espíritos somos seres conscientes, dotados de razão, de capacidade de pensar,
discernir e escolher. Temos livre-arbítrio. Podemos tomar decisões, fazer o que nos apraz,
na medida das condições humanas na Terra. Erramos, cometemos abusos e crimes,
afundamos no vício e na crueldade, no orgulho
e na vaidade. Mas,
temos a consciência que
é a nossa bússola no caminho evolutivo e o nosso tribunal interno.
Nossa consciência está sintonizada com os
objetivos da nossa vida como espíritos.
Está sintonizada com as leis
de Deus. Quando fraudamos essas leis em favor de nossos
interesses humanos e terrenos nossa consciência nos acusa e nos chama à razão. Ela mesma
nos julga em nome de Deus e nos conde
na às provações que podem corrigir-nos.
A consciência é a guarda, a vigilante da
nossa evolução. Ela nos força à correção,
exigindo-nos a reparação dos males que
causamos aos outros no
abuso do nosso livre-
arbítrio. Não é Deus quem nos condena, somos os mesmos que nos penitenciamos dos
erros que cometemos. Isso podemos ver a
qui mesmo, na Terra, quando o aguilhão da
consciência nos fere.
Nosso destino não é a morte material, mas
a ressurreição espiritual. Deus não quer
mandar-nos para o Céu ou para o Inferno das religiões. Deus quer levar-nos para as muitas
moradas da Casa do Pai a que
se refere Jesus nos Evangelhos. Essas moradas são mundos
melhores, superiores e felizes que nos aguardam no Infinito.
As provas coletivas, como a dos incêndios,
dos desastres, das catástrofes, envolvem
criaturas que se acumpliciaram em vidas anteriores na prática das atrocidades de que a
História está cheia, essa
História da Humanidade que
nos estarrece quando a lemos em
profundidade. E os que ficam estão acumpliciados como os que vão, têm também o que
pagar.
Por mais intensa que seja a dor dos que ficam, por maior que seja o seu desespero, a
verdade é que no fundo de seus corações ecoa
a voz da consciência, advertindo-os de que
estão se livrando de pesados débitos contraí
dos para consigo mesmos, perante as leis
divinas. Deus põe o remédio ao lado da ferida, o bálsamo ao lado da dor
José Herculano Pires
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