Um confrade muito querido sugeriu-me
escrever sobre a revista Reformador, estabelecendo um paralelo entre a
elevação dos conteúdos doutrinários veiculados no passado remoto , e a
atual insipidez doutrinária e excesso de fotografias de dirigentes
publicadas nas suas páginas.
Outro companheiro informou-me que a FEB –
Federação Espírita Brasileira está preparando o lançamento (previsto
para o mês de junho de 2016) da nova edição dos “Quatro Evangelhos”,
almejando a submissão comemorativa aos 150 anos de lançamento do livro
de J.B. Roustaing. Em face disso, telefonei para o departamento
editorial da FEB e fui informado sobre o tal lançamento, em razão
disso, deliberei antecipar um manifesto de alerta em face da augurada
reedição das obras que representam a ruptura de união ente os espíritas
no Brasil.
Percorrendo determinadas narrativas sobre
a história da revista Reformador inteiramo-nos de que ela foi fundada
em 21/1/1883 por Augusto Elias da Silva, um fotógrafo português, num
corajoso empreendimento de difusão espírita no Brasil do século XIX.
Isto porque, fundar e conservar um órgão de propaganda espírita, na
Corte do Brasil era, naquele período, para esmorecer o ânimo dos
espíritas mais resolutos. Uma vez que dos púlpitos brasileiros,
principalmente dos da Capital, choviam anátemas sobre os espíritas, os
novos hereges que cumpria abater.
Escreveu o fotógrafo lusitano o seguinte:
“Abre caminho, saudando os homens do presente que também o foram do
passado e ainda hão de ser os do futuro, mais um batalhador da paz: o
“Reformador”. Com essas palavras inaugurais apresentava-se, no Brasil o
novo órgão da divulgação espírita. ”[1]
O artigo de fundo do primeiro número
traçava as diretrizes de paz e progresso pelos quais se nortearia o
informativo, definindo ainda os objetivos que tinha em vista alcançar.
Apresentou-se, portanto, o “Reformador” como mais um semeador da paz,
apetrechado da tolerância e da fraternidade, desfraldando a bandeira da
presumível “união” entre os espíritas. Ótimo!
Até 1888 a redação do periódico funcionou
(no ateliê) montado na residência do Elias da Silva. Era um jornal
quinzenal composto de quatro páginas e estima-se que sua tiragem inicial
era de aproximadamente 300 exemplares, contando com cerca de uma
centena de assinantes. A partir de 1902 passou ao formato de revista,
inicialmente com 20 páginas e periodicidade bimestral. Na década de 1930
passou a ser mensal, e o número de páginas aumentou gradativamente. Em
1939, a FEB adquiriu e instalou as máquinas impressoras próprias, nas
dependências dos fundos do prédio da Avenida Passos. Foi uma decisiva
empreitada e graças a essa providência, as edições e reedições de livros
espíritas e da revista começaram sua expansão.
Em seguida, com a instalação do complexo
gráfico, em 1948, em amplo edifício (atualmente abandonado, arrasado e
falido) especialmente construído em São Cristóvão/Rio de Janeiro, a FEB
acresceu a propaganda doutrinária. Paradoxalmente, na década de 1970 a
FEB “modernizou” as impressões de Reformador com as capas coloridas,
substituindo inclusive o logotipo e desenho, mas a Revista tomou novo
rumo gráfico oferecendo gigantescos espaços de proeminência para as
imodestas imagens (fotos) dos diretores febianos.
Apesar de ser um dos quatro periódicos
surgidos no Rio de Janeiro, de 1808 a 1889, que sobreviveram até os dias
atuais e o único que nunca teve interrompida sua publicação, todavia
diversas vezes desviou-se do programa de estudar, difundir e propagar a
legítima Doutrina dos Espíritos sob o seu tríplice aspecto
(científico-filosófico-religioso), sobretudo durante a coordenação do
editor Luciano dos Anjos.
Em verdade, tudo tem matrizes nos eternos
diretores roustanguistas que ininterruptamente (há mais de 100 anos) se
revezam na direção da FEB até os dias atuais. Nesse confuso cenário
foram infligidos e cedidos espaços fadigosos do periódico a fim de
veicular as burlescas teses da metempsicose consubstanciada nos
“criptógamos carnudos” (involução), do neo-docetismo [2] consoante
propostos nas obras do visionário J.B. Roustaing, um “após(tolo)” da discórdia! E pelo que sei, desde a primeira edição já são mais de 15 milhões de exemplares publicados pela FEB.
A trajetória centenária do Reformador se
confunde com a própria história do quartel-general de J.B.Roustaing, a
FEB, da qual tem sido a porta-voz e a representação do seu pensamento.
Confrades que não rezam pela cartilha roustanguista, embora sejam
coordenadores de uma ou outra área doutrinária da FEB (baixo clero),
jamais alcançaram lograr maiores destaques administrativos, sendo
“aceitos” de esguelha pelos poderosos diretores (alto clero) , todos
fanáticos pelo advogado de Bordeaux.
A revista Reformador, não raro, expressou
várias vezes uma linha editorial e diretrizes a serviço do Evangelho à
maneira sorrateira dos fastidiosos volumes dos “Quatro Evangelhos” de
Roustaing, tal como ocorreu na presidência do Armando de Assis.
Destaque-se que os quatro volumes de Roustaing são estudados
sistematicamente nas reuniões públicas realizadas todas as terças feiras
na sede da FEB, em Brasília e na sucursal febiana, sediada na Av.
Passos-Rio de Janeiro, e isto diz tudo.
A FEB e UNICAMENTE ELA sucessivamente
esteve na dianteira em defesa do roustanguismo. Nessa linha de
contra-senso, tem expressado sempre a prevalência das suas verdades
docetistas, embaralhadas e camuflada atrás da boa literatura do Chico
Xavier e dos clássicos que edita. A FEB acredita que conseguirá
catalisar a “unificação” e a unidade da Doutrina; mas em realidade ,
sempre sucederam e sobrevirão as dissidências (internas e externas)
resultantes dos sofismas de princípios insustentáveis pela racionalidade
kardeciana.
Para a consubstanciação do projeto da
disseminação do docetismo, há mais de um século a FEB vem catequisando à
socapa alguns confrades ingênuos. Na volúpia insuperável das
interpretações equivocadas dos eternos fascinados pelos “Quatro
evangelhos” vai transformando o caleidoscópico Movimento
Espírita Brasileiro numa desordem ideológica sem precedentes inspirados
nos vaporosos pilares dos engodos dos Quatro Evangelhos.
Com Roustaing narcotizando a mente do
alto clero febiano será empreita impraticável evitar a dispersão
sistemática e generalizada cada vez mais acentuada dos espíritas, em
caminho de desintegração, por força de interferências obsessivas em
nível de fascinação. Se a unidade doutrinária foi a única e derradeira
divisa de Allan Kardec para o fortalecimento do Espiritismo, a união
deve ser a fortaleza inexpugnável da Doutrina Espírita. Em verdade a FEB
não conseguiu avançar coisa nenhuma nesse quesito de união entre os
espíritas, justamente por que se deixou abater diante dos embustes
docetistas, e de outras aberrações doutrinárias contidas na obra do
bordelense, razão suficiente para não lograr a unificação, pois
desconhece o poderoso antídoto contra os venenos das discórdias e
desuniões, a coerência legada pelas obras codificadas por Allan Kardec.
Herculano Pires na sua sapiência
ponderava: “Em os Quatro Evangelhos as verdades são sempre contrariadas
pelas mentiras, o natural é prejudicado pelo absurdo e o belo é sempre
desfigurado pelo horrível. Jesus é fluidificado, purificado e até
endeusado; mas também é ironizado, ridicularizado, deturpado e
estupidificado”! “Roustaing é o anti-Kardec. Se Kardec é o bom senso,
Roustaing é a falta de bom senso”. [3]
Queira Deus que no futuro não distante
ressurja o ideário da concepção e fundação de uma CONFEDERAÇÃO ESPÍRITA
no Brasil (sem Roustaing, óbvio!)
Jorge Hessen
Fonte: A Luz da Mente
Referências:
[1] disponível em http://febnet.org.br/site/conheca.php?SecPad=3&Sec=188 acesso em 13/04/2016.
[2] Os gnósticos-docetas do
primeiro século sustentavam que Jesus não tinha realidade física, que o
seu corpo era apenas aparente. Sua posição contrariava as teses da
encarnação do Cristo, apresentando-o como uma espécie de Deus
mitológico, sob a influência das idéias helenísticas. O Docetismo
exerceu grande influência em Alexandria, propagando-se a Éfeso, onde o
apóstolo João instalara a sua Escola Cristã. João refutou a tese doceta
como herética, pois além de não corresponder à realidade histórica,
transformava o Cristo num falsário. A fábula dos docetas ( como o
apóstolo Paulo a classificou) apresentava-se como uma das mais estranhas
desfigurações do Cristo, fornecendo elementos ricos e valiosos aos
mitólogos para negarem a existência real e histórica de Jesus de Nazaré.
[3] Herculano Pires. O Verbo e a Carne, São Paulo: Ed Paideia, 1972
Nenhum comentário:
Postar um comentário