A SOCIEDADE SOMOS NÓS
É
evidente que, se não fossem os preconceitos sociais, pelos quais se
deixa o homem dominar, ele sempre acharia um trabalho qualquer, que lhe
proporcionasse meio de viver, embora se deslocando da sua posição. Mas,
entre os que não têm preconceitos ou os põem de lado, não há pessoas que
se veem na impossibilidade de prover às suas necessidades, em
consequência de moléstias ou outras causas independentes da vontade
delas?
Resposta: Numa sociedade organizada segundo a lei do Cristo, ninguém deve morrer de fome.
Questão n° 930, de O Livro dos Espíritos
Há
indivíduos indolentes e indisciplinados que vivem em situação difícil
por sua própria culpa. Mas há, também, os que experimentam amargas
privações decorrentes de circunstâncias alheias à sua vontade:
O
doente sem recursos, o velho sem abrigo, a criança abandonada, operário
desempregado, o homem marginalizado em virtude problemas de
comportamento.
Imagina-se que providências a respeito do assunto são
de alçada exclusiva do Governo, chamado ao atendimento da população
carente e à erradicação da miséria.
No entanto, a sociedade somos
nós, cidadãos que a compomos. O Governo é apenas uma representação. Não
podemos debitar-lhe inteiramente a solução desse problema, mesmo porque a
cristianização da sociedade não depende de iniciativas dos poderes
constituídos. Fraternidade, solidariedade, misericórdia, caridade,
compaixão, não são passíveis de imposição por decretos.
Consideremos,
ainda, que o Governo não é onisciente, onipresente, onipotente. Ele não
sabe tudo, não vê tudo, não pode tudo. Mas a sociedade, como um todo,
formada pelos cidadãos que a compõem, pode exercitar essas faculdades,
na medida em que, diante das misérias humanas, sempre haverá alguém
capaz de fazer algo, ao passo que a interferência de prepostos
governamentais vai depender de os encontrarmos, de estarem dispostos a
fazê-lo e desfrutarem de disponibilidades para tanto.
Há outro
aspecto importante: o Governo representa não apenas a sociedade, mas
também suas tendências. Ele se vincula à história da nação, suas
características, sua maneira de ser. A Alemanha de Adolfo Hitler foi a
materialização da belicosidade e das pretensões de hegemonia racial de
boa parte do povo alemão.
Seria, portanto, inocência, pretender que o
indivíduo alçado ao poder se transforme, por obra e graça do Espírito
Santo, num campeão do Evangelho, apóstolo do Bem, empolgado pela
promoção humana, trabalhando de sol a sol com disciplina, prudência,
bom-senso, honestidade e, sobretudo, amor pelo semelhante.
Poderá
surgir, de quando em vez, um sábio ou um santo na direção de um povo,
mas ele próprio terá de lutar contra terríveis limitações e
dificuldades, porquanto será um elemento estranho numa coletividade
alheia aos seus ideais.
A sociedade legitimamente cristã deve ser
construída de baixo para cima. Quando a maioria da população for
cristianizada teremos governos capazes de vivenciar plenamente os
ensinamentos de Jesus. Não há fórmulas mágicas para isso. É apenas uma
questão de trabalho, muito trabalho no esforço do Bem.
Diz o Espírito
Humberto de Campos, em psicografia de Francisco Cândido Xavier: As
missões legitimamente salvacionistas vêm à Terra vestidas de macacão.
O
verdadeiro missionário é aquele que serve sempre, com inabalável
disposição, empenhando a própria existência no esforço em favor do
semelhante.
Isso explica porque o espírita consciente fatalmente se
vincula a obras de assistência e promoção humanas ─ creches, berçários,
escolas, abrigos, lares da infância e da velhice, hospitais ─ formando
uma mentalidade de participação e de iniciativas em favor dos carentes
de todos os matizes. Ele sabe que não há outro caminho.
Richard Simonetti
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