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31 janeiro 2011

Glória da Imortalidade - Joanna de Ângelis

 
GLÓRIA DA IMORTALIDADE

Medita a respeito da transitoriedade do carro orgânico, das suas contínuas transformações, do seu desgaste, à medida que nele te movimentas e serás induzido a pensar no que irá ocorrer após o fenômeno biológico da sua morte ou desestruturação molecular.

Vives em um mundo onde ocorrem contínuas alterações das formas e dos conteúdos, que se modificam incessantemente, as mais grosseiras dando lugar a outras mais sutis, num continuum sem fim.

Ao verdor exuberante do início sucedem-se as fases em que as alterações se apresentam inevitáveis, seguindo no rumo da consumpção do aspecto externo para dar lugar a outras vibrantes expressões.

Por mais se arrastem as horas de sofrimento, sucedem-se os dias de ufanismo e de alegria, outros de reflexão e de pausa, obedecendo à lei inexorável das transformações a que tudo se submete.

Assim é a vida física: enganosa na aparência, rápida nas alterações profundas.

Desse modo, um instante chega para tudo e todos em que o fluxo vital se interrompe e o casulo orgânico se desconecta, vitimado pelo fenômeno da morte, igualmente parte da Vida.

Nascer, viver, morrer são termos da mesma equação biológica e prosseguir vivendo é a fatalidade da Criação.

Por mais se recalcitrem ou se ignorem as incessantes alterações biológicas, elas prosseguem ocorrendo automaticamente, porquanto a vida é parceira da morte e esta é pórtico de entrada na Vida.

A trajetória existencial não poderia ser de outra forma, tendo-se em vista a indestrutibilidade do ser, que necessita experienciar diversas aprendizagens até alcançar o objetivo para o qual foi gerado - a glória da Imortalidade!

Lamentavelmente foram criados tabus e superstições em tomo da sua realidade extracorpórea, tombando-se em fantasias injustificáveis, em vãs tentativas de negar-se a sobrevivência ou envolvê-la em mistérios absurdos.

Fosse analisada com a mesma naturalidade com que se consideram os fenômenos orgânicos, e mais fácil seria a aceitação da morte, não como fim, mas como etapa de transferência de uma para outra expressão de comportamento.

Mais apegadas às sensações do que às emoções, as criaturas humanas desejariam que o carro material não cessasse o seu curso, sem dar-se conta da perversidade de tal conduta. Como seriam insuportáveis as dores e os processos degenerativos que tomam conta da matéria, não fossem interrompidos pela morte libertadora! Quanto desesperadores se apresentariam as aflições morais e os desencantos emocionais, caso não houvesse o abrandamento da angústia mediante o processo da desencarnação!

A morte, desse modo, ao invés de ser a destruidora da alegria e do afeto, é o anjo amigo que interrompe os fenômenos circunstanciais e transfere o ser para a realidade onde tudo tem solução, onde a vida tem início e prossegue.

Assim sendo, passa a considerar a morte, antes detestável, como sendo a tecelã da felicidade, que contribui para o ajustamento das ocorrências no contexto da Imortalidade.

Não houvesse a morte, impossível seria a ressurreição. À noite, pois, da saudade, apresenta-se o dia do reencontro feliz.

* * *

Sem qualquer dúvida, o corpo de que te utilizas irá morrer. Não és a indumentária que se corrompe, mas o Espírito que comanda a argamassa celular.

Da mesma maneira como surgiste no mundo físico, dele te apartarás, pelo impositivo da transformação carnal.

Antes de embarcares no veículo orgânico vivias independente dele e assim prosseguirás depois da sua consumpção molecular.

A vida é mais poderosa do que a morte, superando-a de forma eloquente e ditosa.

Ciente dessa realidade, vive de tal maneira que, em chegando o momento de abandonares o corpo, possas fazê-lo com tranquilidade e alegria, sem apegos ou lamentações, destituído de saudades ou de ressentimentos.

O indivíduo são as suas aquisições morais ao largo do processo orgânico. Sucedendo-se, uma etapa a outra, em cada fase adquire experiências que o enriquecem, facultando-lhe novas conquistas que incorpora em forma de bênção.

Mesmo as dores e os desconfortos morais constituem preciosos contributos que o auxiliam na seleção de valores para a sua própria felicidade.

Não fossem essas ocorrências e os significados da paz, da alegria de viver, da plenitude, ficariam destituídos de sentido, em fase do desconhecimento da aflição, das perdas, das angústias, das dores em geral...

Enquanto estejas reencarnado, trabalha com afinco as tuas aspirações e amplia-lhes o campo, selecionando aquelas que são de significado profundo e duradouro em relação às outras superficiais e sem sentido iluminativo.

Avança, desalgemando-te do passado, mas sem ansiedade pelo futuro, permitindo que cada ocorrência tenha lugar na circunstância e no momento próprios.

A precipitação roubar-te-á o prazer de cada conquista e a insegurança tomar­-te-á a alegria de cada abençoada emoção.

Assim, utiliza-te de todo instante para melhorar-te, aprimorando os teus sentimentos e desenvolvendo a capacidade de entendimento e de realização intelecto-moral, que te concederão a palma da vitória sobre os vícios e as paixões perniciosas.

Não postergues o bem que possas fazer nem os deveres que aguardam realização, porquanto poderás ser surpreendido pelo fenômeno da desencarnação, deixando, na retaguarda, atividades interrompidas que irão perturbar-te.

O teu dia ideal é hoje, enquanto luz a oportunidade de crescimento interior. Vive-o intensamente, e verificarás que o seu curso nunca se interrompe, continuando atual e vibrante.

Com essa atitude enfrentarás a morte inevitável com plena consciência da sobrevivência e rico de alegria por haver-te preparado para a viagem de retomo ao Grande Lar.

* * *

Se, por acaso, estás ferido pela saudade que decorre da ausência física de alguém amado, que a morte arrebatou, enxuga o pranto do coração e sorri feliz ante a expectativa do reencontro que ocorrerá, após a tua viagem de volta.

Em sua homenagem, ama e serve, evocando-o com a ternura e o reconhecimento pelos instantes felizes que ao seu lado viveste.

Não lamentes a perda, porque, vivo, onde se encontre tem conhecimento daquilo que ocorre contigo e poderá visitar-te, comungar das tuas emoções, dialogar pelo pensamento e reencontrar-te na esfera dos sonhos, nos teus momentos de parcial desprendimento pelo repouso físico.

Honra-lhe a memória através de ações dignificantes em seu louvor e por meio de vibrações de afeto que lhe dirigirás.

A morte não possui o poder de romper as afeições nem os ódios.

Desse modo, não guardes mágoas, não te tornes inimigo de ninguém, mesmo que haja quem se te faça adversário.

Vibra, portanto, no amor, e o amor vibrará contigo em harmonia cósmica, na glória da Imortalidade.

Joanna de Ângelis. Psicografia do médium Divaldo Pereira Franco, na manhã de 06 de agosto de 2005, na cidade do Rio de Janeiro, RJ

30 janeiro 2011

O Relógio - Raul Teixeira

O Relógio

Apenas tinha começo o Iluminismo na Europa. O mundo se agitava diante dessa nova concepção de vida, de mundo, de arte, de literatura e tudo mais o que existe.

O Iluminismo derramava por sobre toda a sociedade as suas variadas inclinações para um estilo especial de ver o mundo.

Foi exatamente nesses primórdios do período iluminista que Huygens, Christiaan Huygens conseguiu inventar o relógio de pêndulo. O mundo agora conhecia, a partir de Huygens, uma forma de marcar o tempo, bastante diferente das formas utilizadas até então.

As criaturas conheciam o relógio de sol. Mas o relógio de sol estava na dependência dos períodos do ano. Naqueles períodos em que o dia era mais amplo, tínhamos um determinado número de horas marcado pelo relógio de sol.

Nas quadras invernais, quando os dias são menores, já estava prejudicada a leitura por meio do relógio solar.

Huygens teve essa ideia de inventar um artefato pendular, depois da descoberta de Galileu Galilei.

O notável gênio Galileu, observando um pêndulo que pendia de uma coluna e que se movia, no seu movimento, deu-se conta, depois de observar delongadamente, que o período desenvolvido pelo pêndulo, o tempo que o pêndulo levava do centro de equilíbrio a uma das extremidades do seu movimento à outra, era sempre o mesmo.

Esse equilíbrio pendular fez com que Galileu fosse o grande descobridor dessa peculiaridade dos pêndulos. E essa peculiaridade dos pêndulos permitiu a Christiaan Huygens a construção do primeiro relógio pendular.

Afinal de contas, nós todos já podemos imaginar o que significa para a Ciência, por exemplo, ler o tempo, sem nenhuma variação incomodatícia.

O tempo, que é uma das grandes vertigens dos cientistas, tempo e espaço, agora, ao menos, poderia ser lido sem tantos problemas, a partir do relógio pendular de Huygens.

Todos imaginamos o que é o tempo, mas essa grandeza que imaginamos, é muito difícil de ser estabelecida, quantificada.

O que é mesmo o tempo?

Para a Ciência, para a Física, o tempo pode ser esse intervalo que existe entre uma ocorrência e a ocorrência imediatamente seguinte. Aí é que está o grande problema: qual é a ocorrência imediatamente seguinte? Então temos que usar um sistema discreto, coisas observáveis, para estabelecermos o tempo.

Quando olhamos o tempo que o relógio marca, percebemos que ele é diferente de um outro tipo de tempo. O tempo que a mente marca.

Basta lembrarmo-nos de que, quando saímos de férias, por exemplo, as nossas férias já foram devidamente vividas, gozadas na nossa intimidade. Já sabemos como serão as nossas férias ainda não desfrutadas.

Dizemos por exemplo: Terei férias no fim do ano. Vou passar tantos dias com vovó, viajarei para tal lugar, comprarei tal coisa e, quando chegar em casa, começarei as obras.

Ora, na nossa cabeça, já usufruímos as férias, já fomos, já voltamos. Mas agora temos que esperar todo o trajeto do relógio físico, que estabelece o calendário.

Então, nos damos conta de que existe um tempo físico, que o relógio marca, e um tempo psicológico, que marcamos em nossa intimidade.

* * *

As nossas existências são regidas basicamente por um tempo físico. Nascemos e, a partir daí, conta-se o nosso tempo. Comemoramos as datas a partir dessa contagem.

Comemoramos o primeiro aniversário de nossa criança, o segundo, o terceiro, o décimo ano dessa criança. Vamos assim marcando de ano em ano, o tempo em que se vive no corpo físico.

Ao mesmo tempo, o corpo físico vai assinalando a passagem do tempo por ele, pelas suas transformações. A criança que não falava, passa a falar, que não andava, começa a caminhar. Muitas coisas que ela não conseguia fazer, agora já tem autonomia para fazê-lo, na medida em que passe o tempo.

O raciocínio que, na fase infantil, é eminentemente lúdico, fantasista, objetivo, concreto, o tempo passa e a nossa criança, se aproximando da adolescência, já consegue refletir, raciocinar de maneira subjetiva. Já consegue subjetivar as coisas.

Tem habilidade de sair do mundo das coisas concretas, o mundo representado somente pelas coisas que vemos, que tocamos, que cheiramos, que comemos, para imaginar, de forma ordenada, de forma raciocinada.

Quando começamos a pensar em que o corpo e a mente vão nos dando conta da passagem do tempo, temos que nos aperceber de que, ao considerarmos a existência dessas duas dinâmicas temporais, um tempo físico marcado pelo relógio e um tempo interior marcado pela mente, vale a pena considerarmos como estamos utilizando o tempo de nossa vida.

Como é que estamos utilizando esse tempo pelo qual passa o nosso corpo?

O que fazemos em cada ano de vida?

Estudamos? Praticamos esportes?

Desenvolvemos habilidades físicas, intelectuais, artísticas, culturais?

Formamos família? Criamos filhos? Construímos, viajamos? Como é que estamos utilizando esse tempo físico da nossa existência?

De acordo com o modo como estejamos usando esse tempo, seremos exitosos ou não, em nossa caminhada humana.

E esse tempo interno, que marcha com maior rapidez do que o tempo do relógio, o que estamos fazendo com ele?

Quanto tempo ocupamos de nossa mente pensando em coisas boas, pensando em coisas más, maquinando a traição, o crime, a desordem, a balbúrdia, a desestabilização dos outros?

Quanto tempo levamos engendrando a melhor maneira de acudir as crianças que estão soltas e sem ninguém nas ruas?

Os velhos que estão abandonados nas sarjetas, à míngua, essa juventude drogadita que vagueia pelas madrugadas, entre picadas, pós, copos e sexo?

O que é que a nossa mente consegue elaborar, que possa vir em beneficio dessas criaturas?

Qual é o livro que estamos pensando em escrever? Qual é a música que queremos cantar? Quais os tipos de assuntos que valorizamos?

Qual é o teatro que eu gosto, os filmes pelos quais me apaixono, as letras e as músicas que me comovem?

O que é isso que dinamiza o meu mundo interior e que me dá forças para viver? Quais os amigos que eu tenho, que esforço eu faço para conquistar amigos? Como é que eu os preservo? Como é que eu sou amigo dos meus amigos?

Como é que eu trato minha esposa, meu marido, meus filhos, meus pais? Qual é a consideração que eu tenho por eles? Em que conta tenho o meu trabalho, em que conta tenho a minha religião?

São coisas sérias para mim ou são brinquedos dos quais me valho, para que eu tenha um determinado status social, para que eu tenha uma representatividade social, para que eu não seja diferente dos outros?

Importantíssimo é sabermos, nesse grande relógio do Universo, como é que pendulamos nós, para que lado vamos, de que lado viemos.

Transcrição do Programa Vida e Valores, de número 205, apresentado por Raul Teixeira, sob coordenação da Federação Espírita do Paraná. Programa gravado em agosto de 2009

29 janeiro 2011

Dar de Graça o que de Graça se Recebe - Raul Teixeira

Dar de Graça o que de Graça se Recebe

Muito embora vivamos num mundo capitalista, há coisas que precisam ser pensadas de maneira diferente.

É natural que todos recebamos por aquilo que façamos. Nosso trabalho profissional. Formamo-nos para isso, estudamos, queimamos fosfato, gastamos tempo.

Então, a forma como a sociedade recompensa o nosso esforço, o nosso trabalho, na medida em que lhe prestamos serviços, é através da gratificação salarial.

Recebemos dos nossos patrões ou das pessoas para as quais trabalhamos, o correspondente ao serviço que prestamos. Nada mais justo, nada mais natural.

E a vida vai passando, vamos adquirindo esse vezo, esse costume de cobrar pelos trabalhos que realizamos.

Mas, existe uma fronteira bastante interessante, que é a fronteira do sentimento, do coração, do bom senso. Cada vez que pensamos nessa fronteira, temos que admitir que há coisas que doamos, que ofertamos a quem nos cerca e que não há necessidade de que cobremos por isto.

Mesmo na esfera do nosso trabalho profissional, às vezes, queremos fazer um mimo a uma pessoa que não pode pagar o que a gente cobra, a uma instituição que presta serviços a terceiros e para a qual queremos dar a nossa contribuição e isto nos referindo àquilo que fazemos profissionalmente.

Quem é que não pode, em sendo cabeleireiro, dedicar trinta minutos de um dia, uma hora, para cortar cabelo de idosos, de crianças órfãs, de doentes, doentes mentais ou mesmo de presidiários, servindo de boa vontade a um trabalho social?

Quem é que não pode, em sendo professor, dedicar uma hora por semana, um dia no mês para alfabetizar comunidades carentes, pessoas pobres que não têm acesso à escola, que trabalham noite e dia e que têm aquele dia que poderia servir-lhes de libertação intelectual? Quem é que não pode fazer isto?

Sendo odontólogo, sendo advogado, prestando ajuda a uma instituição que trabalha com pobres, com famílias carentes. Há muitas coisas, que poderíamos fazer com nosso trabalho profissional, com aquilo que a gente pagou para adquirir.

No entanto, existe um campo ainda mais especial. É aquele em que realizamos coisas pelas quais nada pagamos.

Imaginemos a nossa capacidade intelectiva. Nunca pagamos por ela. Ninguém paga pelo número de neurônios que tem no cérebro, no sistema nervoso. Ninguém paga pelo oxigênio que respira, pela luz do sol que recebe, pelas chuvas que caem, pelos ventos que bafejam e refrescam.

Há coisas que a natureza nos oferece a todos os que estamos no mundo, de forma totalmente gratuita.

E há outros tantos benefícios que a natureza nos dá, que recebemos de bom grado e que não há sentido cobrar para, no uso desses atributos, prestar serviços a alguém.

Há muita coisa que podemos dar aos outros, sem nenhuma preocupação com o pecúnio, com a gratificação financeira, com os valores amoedados, com o dinheiro.

Esse é um território em que começamos a trabalhar em nome da fraternidade, em nome da boa vontade, dessa contribuição que desejamos prestar à sociedade em que vivemos.

Esse é um trabalho que não nos deixa apenas satisfeitos economicamente, financeiramente, mas nos deixa felizes por dentro.

Cada vez que trabalhamos, encontramos a oportunidade de oferecer à nossa comunidade ou às pessoas que precisam do nosso trabalho, aquilo com que a Divindade nos dotou, os valores que trazemos de outras existências, de outras experiências, mesmo desta vida e que queremos contribuir com isso, de alguma forma, para terceiros.

Começamos a pensar nessa possibilidade de prestar algum serviço a alguma pessoa ou a algum grupo de pessoas, sem perceber por isso qualquer salário.

Tenhamos a certeza de que vamos nos sentir grandemente felizes, altamente recompensados, porque estaremos atendendo àquilo que Cristo propôs: ao dar os nossos festins, convocar os estropiados das estradas, os pobres das encruzilhadas, para que venham ter conosco, no nosso festim de bodas.

A boa vontade faz com que convertamos essas ações gratuitas numa festa para tantos corações.

* * *

Essa festa que proporcionamos aos corações daqueles que não podem pagar, mas que acabam recebendo de nós alguma ajuda, penetra-nos a própria alma e reveste-se de uma característica importantíssima.

Reveste-se desse poder de nos fazer criaturas integradas ao plano da Divindade, aquele mesmo plano que nos concede as coisas gratuitamente, graciosamente.

Nesse território, vale a pena lembrarmos o trabalho do voluntário.

Esse voluntário que estamos nos referindo é o que pode cortar um cabelo, que pode atender a uma causa jurídica, que pode atender a dentes, que pode atender a psicologia, que pode, enfim, lavar, passar, pregar botões numa peça de roupa. Há voluntariado para todos os tipos de serviços e há necessidades para todos os níveis de voluntariado.

Lamentamos, no entanto, que ainda exista em nosso país, e em vários países que conhecemos, uma mentalidade de voluntariado um tanto estranha.

Para muitos que se apresentam como voluntários, o voluntariado deve ser exercido quando a pessoa o queira, no dia que lhe dê vontade, quando não tenha o que fazer em casa, então ela irá fazer um serviço voluntariado.

Isso não é propriamente o que se espera de um voluntário.

Porque uma instituição que dependa de trabalho voluntário tem trabalho todos os dias.

Alguém que se voluntarie para cozinhar não pode ir quando bem entende. Como é que ficarão os assistidos, nos dias em que o voluntário não comparecer?

Aquele que se voluntarie para lecionar, para dar aulas a crianças, a jovens, a adultos carentes. Como é que irá apenas quando tiver vontade?

Então vemos, por exemplo, nos Estados Unidos, que os voluntários têm carteira, são registrados governamentalmente. Eles podem entrar nos hospitais, nas casas de assistência, nos dias e horários que quiserem, mediante a apresentação daquele documento.

Mas eles têm seriedade. O voluntário nos Estados Unidos faz um serviço como se fosse o seu emprego, sem receber uma moeda, a não ser a gratificação da alegria.

No nosso país, por exemplo, as pessoas vão quando querem. Viajam sem anunciar, sem preparar a instituição: Vou ficar tanto tempo fora. Há que se providenciar um substituto.

As pessoas imaginam que, por estarem prestando serviço voluntário, não têm nenhuma obrigação, não tem nenhum compromisso. A isso chamaríamos de um voluntarismo e não de um trabalho voluntário.

Um trabalho voluntário é um trabalho sério, de todo dia, marcamos aquela escala certinha, aquela agenda correta. É voluntário, porque não se cobra por ele, mas a responsabilidade tem que ser a mesma.

Ora, cada vez que realizamos um trabalho para alguém, dando de graça, conscientemente estamos realizando o nosso depósito no Banco da Providência Divina.

Aquilo que absorvemos dos outros, devemos aos outros. Aquilo que recebemos da Divindade, passamos a ser devedores da Divindade. Tudo aquilo que ofertamos, que oferecemos, nos transforma em credores da Providência.

Temos, verdadeiramente, não aquilo que compramos, aquilo que as pessoas nos dão. O que é nosso pertence verdadeiramente é aquilo que oferecemos.Temos o que damos.

Não foi à toa que o nobre Francisco de Assis afirmou que: É dando que se recebe.

É claro que, se a criatura precisa trabalhar para manter sua família e não pode trabalhar de graça, para ninguém, durante um largo período de sua vida, a Divindade compreende.

Qualquer pessoa de bom senso compreenderá. Mas estamos nos referindo a essa postura egoística, em que só pensamos no lucro imediato, na vantagem financeira, quando o trabalho voluntário, o trabalho pelo bem, o trabalho para alguém, sem receber nada, materialmente falando, nos dá um lucro moral expressivo, nos permite um salário de paz interior incomensurável.

Quando imaginamos a grandeza que é ver o sorriso de uma criança de cabelos cortados, de banho tomado, de roupa trocada; quando imaginamos a alegria de uma criatura diante de um prato de refeição e percebemos que fomos nós que fizemos, que fomos nós que preparamos, que fomos nós que arrumamos... não há compensação maior.

E é nesse sentido que podemos pensar naquele Ser especial que um dia chegou à Terra e Se doou a toda Humanidade, dizendo:

Eu sou o pão da vida, eu sou a fonte de águas cristalinas, eu sou a luz do mundo, dando de graça o que trouxe do Pai, o que de graça recebeu para que nós aprendamos a fazer o mesmo.

Transcrição do Programa Vida e Valores, de número 189, apresentado por Raul Teixeira, sob coordenação da Federação Espírita do Paraná. Programa gravado em janeiro de 2009.

28 janeiro 2011

A Parentela - Raul Teixeira

A Parentela

Quando abrimos as páginas evangélicas, nos deparamos com Jesus Cristo num momento muito peculiar, dentre os momentos peculiares de Sua vida.

Quero me referir àquele no qual alguns amigos chegaram para anunciar-Lhe que lá fora estavam Sua mãe e Seus irmãos a chamá-lO.

Jesus Cristo Se dirige ao mensageiro e retruca: Quem é meu pai, quem é minha mãe, quem são meus irmãos? Meu pai, minha mãe, meus irmãos, são todos aqueles que cumprem a vontade do meu Pai Celestial.

Essa fala de Jesus Cristo, ao longo do tempo, tem suscitado muitas querelas, muitos comentários, muitas discussões.

Para alguns, Jesus Cristo estava desfazendo de Sua família, estava tratando mal à Sua mãe, estava sendo ingrato. Para outros, Ele, que conhecia Seus parentes, Seus familiares, sabia a razão porque estava dizendo o que dizia.

Mas, em realidade, bastando pensar nos demais ensinamentos que recolhemos de Jesus de Nazaré, não podemos supor que Ele tivesse qualquer dificuldade na relação com Sua mãe ou com Seu pai.

Não podemos imaginar, sequer, que Ele tivesse alguma contrariedade com os Seus irmãos. Alguns afirmam que Jesus Cristo teve irmãos consanguíneos, filhos outros de Maria de Nazaré, mas há quem afirme que, ao Seu tempo, os primos em primeiro grau eram chamados de irmãos. Então, dizem que esses irmãos de Jesus não passavam de primos de Jesus.

Não importando qual seja, de fato, a realidade familiar, o fato é que Ele sabia porque é que estava dizendo tal coisa.

A lição que nos cabe retirar dessa fala evangélica do Nazareno é de que a nossa família é a Humanidade. Todos aqueles que fazem parte dessa grei gigantesca são nossos familiares, são nossos pais, nossas mães, nossos irmãos.

Dessa maneira, Jesus tirava esse domínio da família nuclear, da nossa mente, relativamente ao progresso.

Nós somos fiéis à nossa família nuclear, é válido, mas não podemos nos fixar nessa família nuclear para ignorarmos a macro-família da Humanidade.

Temos respeito para com nosso pai, para com nossa mãe, para com nossos irmãos, mas encontramos, pelo mundo afora, tantas outras mães que nos amam, tantos outros pais que nos querem bem, tantos irmãos que convivem conosco e se relacionam conosco, melhor do que muitos irmãos biológicos.

Quem são meus irmãos, quem é minha mãe, quem é meu pai?

Se falarmos em termos físicos, não temos dúvida, meu pai é Seu Fulano, minha mãe é Dona Beltrana, e meus irmãos são os cicranos. Contudo, a lição de Jesus Cristo não era para aquele momento, era para todos os tempos. Meu pai, minha mãe, meus irmãos, estão na Humanidade.

Daí, verificarmos que temos dois níveis de parentela.

O Evangelho segundo o Espiritismo trata, num de seus notáveis capítulos trazidos por Allan Kardec, ao nosso conhecimento, um que fala exatamente sobre isto: A parentela corporal, a parentela espiritual.

Nenhum de nós ignora que somos filhos de um grupo consanguíneo, de um grupo genético. Somos assemelhados ao nosso pai, à nossa mãe, Temos a estatura desse, a estatura daquele, os olhos parecidos com esse, a maneira de ser, biologicamente, muito parecida com aquela.

Estamos sempre ligados ao nosso pai e a nossa mãe. Dizemos: Ele é alto como os avós o foram. Ele é gordinho porque toda a família era assim. Carrega esse problema porque é genético, carrega essa beleza porque é genética.

Nossa família corporal, nossa família biológica.

Entretanto, ninguém ignorará que existe uma família muito maior do que essa ao nosso redor ou distante de nós, que é a nossa família espiritual.

* * *

Vale a pena nos perguntarmos: Quem é que compõe essa nossa família espiritual? Quem é que faz parte dessa nossa família espiritual?

Temos, fazendo parte dela, muitas criaturas que fizeram parte do nosso passado, de outras vidas nossas.

É muito comum nos identificarmos de tal maneira com alguém que, ainda que não se seja adepto da tese reencarnacionista, admitimos que já nos vimos antes, que estivemos juntos antes, que convivemos em outra ocasião, tamanho é o elo entre nós.

Existem afinidades das almas, que nos remetem ao passado. Não há outra saída: temos que ter vivido juntos.

Muitas vezes temos revelações espontâneas, intuições, inspirações que nos levam a acreditar que convivemos no passado.

Há outros relacionamentos dessa família espiritual que não vêm do nosso pretérito, dos outros renascimentos. São desta mesma vida.

São almas que encontramos, mas elas estão muito próximas da nossa frequência interior, são almas afins, nos ligamos por afinidades, não obrigatoriamente porque tenhamos vivido no passado, mas porque temos ideais similares, ideais semelhantes, porque temos os mesmos gostos para as coisas e os mesmos desgostos.

As mesmas opiniões são compartilhadas por nós. Quando um tem uma ideia, o outro a tem. Às vezes, falamos juntos uma mesma coisa. São Espíritos afins formando a nossa família espiritual.

Quando falamos em família espiritual é bom que se entenda que nem sempre esses grupos são formados por pessoas do bem. Muitas vezes encontramos almas afins, no erro, no mal.

Um grupo de delinquentes que se reúna com afinidades em que um sabe o que o outro deseja e pensa, são almas afins. É uma família espiritual degenerada.

Quantas vezes encontramos companheiros, que só os encontramos nos bares. Eles só frequentam aquele lugar. Outros só no clube, outros só no trabalho, e vamos formando grupos, do meu trabalho, do bar que eu frequento, do clube em que estou, da igreja.

Temos vários grupos. Muitos desses, com os quais temos afinidade, são do bem, outros podem não ser.

Desses grupos, muitos frequentam nossa casa, visitam nossa casa, sentam-se à mesa conosco e há outros grupos que nunca convidamos para visitar nossa casa.

Isso vai definindo o nível desse parentesco espiritual. Até onde confiamos? Até onde nos abrimos, até onde conseguimos conviver?

Vale a pena prestarmos bem atenção nas criaturas com as quais temos afinidade.

Há de fato situações em que pessoas do bem não se sentem afinadas com pessoas dedicadas ao mal. Não significa que haja ódio entre elas. Uma alma bondosa não sente ódio por ninguém, mas sente uma desafinação de propósitos, sente que não é a pessoa que vibra na sua sintonia.
Imaginemos um homem, uma mulher de bem, que você é, tendo que conviver com alguém habituado a cometer furtos ou a roubar. Por mais que você goste dessa pessoa, não concordará com suas práticas lesivas a terceiros.

Por mais que você conviva e goste de uma criatura, se você é abstêmio e essa criatura alcoólatra, não existe afinidade nesse particular.

Alguém que é tabagista e você detesta tabaco, fumo, o cheiro, a fumaça, naturalmente não haverá afinidade nesse campo.

De modo que, afinidade não implica em desamor, não implica ódio. Implica em falta de sintonia.

Todas as vezes que temos sintonia com as pessoas, elas fazem parte de nossa família espiritual, mais ou menos profundamente, a par daquela família em cujo seio, em cujos braços renascemos, nossos pais, nossas mães, nossos irmãos, nossos familiares afins.

Deste modo, vamos trabalhar para cumprir o objetivo de Deus, que é tornarmo-nos uma só família para sabermos quem é meu pai, minha mãe, meus irmãos...

Transcrição do Programa Vida e Valores, de número 210, apresentado por Raul Teixeira, sob coordenação da Federação Espírita do Paraná. Programa gravado em agosto de 2009

27 janeiro 2011

A Construção do Lar - Raul Teixeira

A Construção do Lar

É muito comum fazermos a distinção entre casa e lar.

Costumamos chamar de casa a construção de material, de madeira, de alvenaria, de pedra, seja o que for, enquanto o lar é o que se passa dentro dessa construção. Muitas vezes, nós conseguimos construir a casa, mas não chegamos a formar o lar.

Vivemos dentro dessa casa de formas tão estranhas, que não configuram o lar. O lar é o emocional, é o sentimental, é o racional, é o vivencial. É a interação das pessoas. A casa é o prédio.

Muitas vezes as pessoas dizem: Estou indo pra casa, mas, aborrecidas, porque estão indo para casa e, possivelmente, ao chegarem em casa, não encontrarão o respaldo do lar.

É muito importante verificarmos porque é que o lar nos é importante. Exatamente porque ali se reúnem Espíritos, criaturas, indivíduos procedentes dos mais variados recantos da natureza.

Advindas, essas criaturas, das experiências as mais várias e, ao nos encontrarmos dentro de casa, para formar o lar, teremos obrigatoriamente que trocar essas experiências.

A esposa teve uma criação, uma formação, uma instrução ou deixou de tê-la. O marido outra e, agora, são duas pessoas que vão se reunir, na tentativa de forjar outras pessoas e educá-las, os filhos.

O lar representa esse cadinho, esse campo de provas, onde as diferenças se atritam, onde trocamos aquilo que sabemos com o que o outro sabe.

Desse modo, é muitíssimo importante que construamos o nosso lar em bases de equilíbrio, de entendimento, o que nem sempre é fácil.

Todas as vezes que nos reunimos, pessoas diferentes, seja no que for, isso nos dá uma certa instabilidade, isso gera uma certa instabilidade.

Há sempre uma diferençazinha entre o esposo e a esposa, entre os pais e os filhos, entre os irmãos. Por quê?

Porque se a esposa tem um pouco mais de cultura, se o marido tem um pouco menos, isso deixa um degrau de frustração.

Ele vai fazer de tudo para mostrar que também sabe, quando seria tão fácil admitir que ele ainda não sabe. Poderá aprender. Se a esposa se torna submissa porque seu marido é doutor, seu marido é que sabe, já desbalanceia o lar.

Seria tão normal se ela admitisse que, de fato, ele preparou o que sabe, ele sabe na frente e ela não está proibida de aprender e de saber também. Mas, cada qual respeitando o outro, sem se sentir lesionado, sem se sentir frustrado, sem se sentir diminuído.

No lar, temos ensejo de trocar tudo isto. Verificamos que aquele homem notável, notável médico na sociedade, chega em casa. Ele é carente do que a cozinheira fez, dos carinhos da esposa, dos filhos.

Aquele grandioso engenheiro respeitado na sua empresa, na sociedade, mas quando chega em casa, ele é aquele gatinho carente de carinho, de atenção de sua esposa, dos seus filhos.

Somos movidos à emoção, a sentimento. O ser humano não é meramente racional, somos sentimentais.

Então, aquele homem que faz pressão na sociedade, o grande político, o grande administrador, quando chega em casa quem manda em tudo é a sua mulher.

Não, nós não vamos. Não, eu não quero. Não, você não vai fazer. Não, você não aceitará. E para que o amor possa vigorar é necessário que nós aprendamos ouvir um ao outro. O lar é assim.

É essa grande panela, é esse grande cadinho, dentro de cuja estrutura todos vamos aprendendo, uns com os outros, oferecendo o melhor que tenhamos e aprendendo o que os outros têm a nos oferecer.

É muitíssimo importante a estrutura do lar. Nada tem a ver com a casa. O lar vem de dentro.

* * *

Uma vez que essa estrutura de lar é de dentro da criatura humana, é muito importante que cada elemento do lar se preocupe com o outro e se ocupe também com ele.

Cada vez que pensamos na família que vive nesse lar que estamos abordando, certamente que cabe aos esposos determinados compromissos entre si, para a mantença do lar.

Se eles despautarem desses cuidados, o lar não se sustenta. Para a estrutura do lar é importantíssima a fidelidade, o respeito, a parceria, o acompanhamento, o companheirismo.

Se houver filhos na relação, os cuidados com o encaminhamento dos filhos neste mundo atormentado da atualidade.

Onde estão nossos filhos? Com quem estão nossos filhos? Fazendo o quê os nossos filhos estarão?

Esses cuidados que, há muito, passaram a ser coisas démodé, precisam voltar às preocupações nossas, precisam retornar aos cuidados domésticos.

Quando ouvimos as notícias de que tal criança foi seviciada, foi levada, foi conduzida, isso nos remete a refletir sobre a desatenção, muitas vezes, dos pais.

Com quem está minha criança? Onde está neste momento?

Vivemos dias em que os nossos filhos são mandados para dormir na casa dos amigos, dos colegas. Mas a gente não sabe quem são os pais desses amigos, desses colegas.

Não sabemos qual é a formação moral dessa família para onde estamos mandando os nossos filhos. Muitas vezes, acordamos tarde demais.

A estruturação do lar exige bom senso, exige cuidados, exige raciocínio.

Não é uma prisão. Todos usufruem liberdade. Mas, na estruturação do lar, a liberdade jamais estará alheada, distanciada das noções de responsabilidade.

Todos os que têm liberdade no lar, também hão de ter responsabilidades.

E se forem crianças?

Vamos ensinando às crianças a ter responsabilidade com as coisas delas. Guardar os brinquedos, colocar a roupinha que tirou no cesto, na medida em que elas vão podendo.

Como é que a criança aprende a ajudar em casa?

Traga para a mamãe, pegue a vassoura.

Pegue aquilo. Traga aquilo. Leve aquilo para a mamãe. Ajude a mamãe.

Sem nenhuma imposição, para que a criança aprenda a gostar de colaborar.

Venha aqui com o papai, segure aqui para o papai poder esticar.

Criando vínculos.Quando os nossos filhos começam a ir para a escola, cedinho, será nosso dever, de pai ou de mãe, puxar assunto com eles.

Como é que foi hoje o dia? Com quem você brincou? O que a professora lhe ensinou? Ou a tia?

E a sua merenda, comeu-a? Distribuiu com alguém?

Para que ensinemos à nossa criança, desde cedo, a conversar conosco sobre o que se passou com ela.

Depois que ela aprende a conversar conosco, não precisamos perguntar nada.

Quando a apanhamos à porta da escola, ela já nos vem contando. Quando a colocamos no carro, ela já começa a falar. E é dessa maneira que vamos criando uma parceria doméstica.

Os filhos não precisam esconder dos seus pais as coisas que vivenciam. Os pais não devem negar orientação aos filhos, para que eles saibam se nortear. Estar sempre acompanhando.

Quando a nossa criança começa a crescer e não faz aquelas intrigantes perguntas, sobre sexo, sobre isso ou sobre aquilo, que os pais não imaginem que elas não sabem, que elas são inocentes. Admitam que já aprenderam, de forma equivocada e, porque aprenderam de forma equivocada, têm vergonha de falar para nós.

Cabe, então, para que o lar se reerga, todos nos envolvermos com todos.

Com carinho, com atenção, com sorriso, com seriedade, cada coisa no seu lugar. Mas, que não falte entre nós jamais a ternura, o respeito recíproco, na certeza de que somos irmãos em Deus, momentaneamente situados como marido, mulher, pais, filhos, irmãos.

Para que o nosso lar seja feliz, para que utilizemos esse cadinho, como a grande oficina das almas, não poderá faltar o amor. O amor que gera respeito, o amor que imprime responsabilidade.

Transcrição do Programa Vida e Valores, de número 186, apresentado por Raul Teixeira, sob coordenação da Federação Espírita do Paraná. Programa gravado em janeiro de 2009

26 janeiro 2011

A Imprensa - Raul Teixeira

A Imprensa

Todas as formas de reprodução, em larga escala, de textos escritos é chamada imprensa.

A partir daí, todos esses movimentos que têm havido, ao longo da História do homem, desde quando o homem começou a escrever suas ideias, seus pensamentos, nas lajes de pedra, no solo, onde quer que tenha sido, passamos a ter a existência de um veículo de comunicação.

É muito importante que uma geração legue a outras a sua produção, a sua cultura, tudo aquilo que aprendeu.

É muito importante que as gerações novas prestem atenção no legado que lhes foi deixado pelas gerações anteriores. A imprensa se presta a isso.

É dessa forma que achamos nos livros, nos opúsculos, nas revistas, nos textos mais variados, a presença do passado investindo no nosso presente.

A imprensa é profundamente importante para a Humanidade. Desde quando passamos a sentir necessidade de saber das coisas, que se sucedem aqui, ali, acolá, lançamos mão da imprensa.

A imprensa tem ajudado nesse grande movimento de alfabetização das criaturas. Seria muito complicado alfabetizar hoje, bilhões e bilhões de almas mundo afora, através da tradição oral, pertencente a muitos povos antigos.

Hoje, graças ao trabalho da imprensa, esse labor de alfabetizar se torna mais fácil.

Mas a imprensa também colaborou bastante, no movimento da democracia, para esse tipo de governança, esse filosofar social, esse sistema de dirigir comunidades, de dirigir o Estado, a cidade-estado grega. Naturalmente se deve à imprensa da época.

Os textos dos grandes democratas apresentados às comunidades e o povo podendo conhecer direitos, deveres, saber quem era nobre, quem era ignóbil, isso tudo vem colaborando para distender no mundo a democracia.

E o que falar das revoluções científicas?

Tudo quanto os cientistas vão adquirindo em conhecimento, vão desenvolvendo na sua lavra de pesquisas, é a imprensa que divulga.

Hoje, conhecemos jornalistas científicos, aqueles que acompanham o trabalho dos cientistas nos laboratórios e tratam de difundi-los para as comunidades. Isso se deve à imprensa.

Mas, curiosamente, temos observado um fenômeno preocupante: a incapacidade de muitos, que fazem imprensa, de divulgar coisas boas.

Será que, sob a justificativa de que a imprensa busca sempre atender ao interesse popular, e isto é verdade, deve procurar atendê-lo, essa comunidade necessita somente de notícias drásticas, de coisas negativas?

Impossível é pensar que não existam notícias boas para os jornais, para as revistas. Coisas boas para a publicação em livros.

Por que esse compromisso nefasto de grandes grupos da imprensa em divulgar somente o negativo?

Quem estaria lucrando com isto? A sociedade não é.

Quem estaria ganhando com esse movimento pessimista que se alastra pela sociedade, a partir de uma imprensa mal forjada?

Ficamos pensando no trabalho que tiveram os homens, desde o começo da civilização, para estruturar uma sistemática que ganhou grande pulso depois de Johannes Gutenberg, com os seus tipos móveis montados, ao invés das pessoas escreverem manualmente os textos.

Tudo isso ganhou dimensão com os novos trabalhos gráficos, com os novos maquinários gráficos. Mas, por que razão a criatura humana penetrou esse descaminho do negativismo?

Qualquer notícia que lemos tem a sua negatividade, traz o escândalo na sua pauta.

Será que é isto que a sociedade do mundo espera da imprensa?

Será que a imprensa não tem mais possibilidades de trazer esperanças às criaturas? Orientá-las? Elucidificá-las?

Quando pensamos em tudo isso, temos que refletir que está chegado o momento de refundirmos todo o trabalho da nova imprensa.

* * *

O interesse popular é pelo bem. Qual é a criatura, qual é a família que gostaria de ler somente tragédias, desastres, infortúnios, infelicidades ao compulsar as páginas de um jornal?

Quem é que gostaria de saber só de escândalos da vida alheia, as intrigas da intimidade dos casais famosos, ao compulsar uma revista?

Quem é que gostaria de ter, nas páginas de um livro, senão aquilo que deleitasse, que ilustrasse, ainda que se narrasse um crime, um desastre passional, mas que fosse para o engrandecimento da vida, para trazer uma mensagem nova?

Todos gostariam. De modo que, quando vemos a imprensa servindo de veículo, exatamente para fazer o oposto daquilo que é a sua missão, informar devidamente, preocupamo-nos com o futuro das comunicações.

Vale a pena pensar nos textos que encontramos redigidos pelos Apóstolos de Jesus, pelos discípulos.

É claro que eles falavam das traições, dos crimes da época, das tragédias sociais. Mas, fundamentalmente, tudo aquilo era para falar da vida, que esplende em toda parte. Da vida que nos concita a amá-la, a respeitá-la, a valorizá-la.

Deveria ser esse o papel da imprensa: divulgar aquilo que é de interesse social, sem qualquer dúvida. Mas o interesse social superior.

Não há nenhum interesse para a sociedade, em tomarmos conhecimento de que, neste exato momento, caiu um ônibus em tal lugar, explodiu um automóvel em outro lugar ou desabou um prédio em qualquer parte do mundo. Há tanta coisa boa para se noticiar.

Lamentavelmente, é raro lermos a respeito de jovens pobres das favelas, que aprenderam a cartilha, a tabuada, que fizeram vestibulares e foram aprovados, que dançam ballet, que foram contratados por empresas internacionais para dançar, para cantar.

E isso diz respeito ao interesse social. Cada criatura pobre, cada menino simples entenderia que, se aquele pôde se superar, ele também poderá. E isso seria incentivo.

Quando vemos a nossa imprensa, em grandes contingentes, preocupada e ocupada tão somente em divulgar o escândalo, é natural refletirmos que também ela estará incentivando as almas frágeis, aos Espíritos débeis, que procurarão, através dos escândalos, um lugar na imprensa.

É por isso que nos lembramos de uma canção, de uma letra de Chico Buarque de Holanda: Meu guri. Ele retrata exatamente isto: ele disse que chegava lá, porque ele via os meninos da favela onde ele vivia, os meninos do morro, do bairro pobre, conseguindo as coisas às custas do roubo, da falcatrua, da criminalidade.

E o poeta popular narra, com riqueza, o que é que vai na alma de um guri que cresce vendo aquilo na imprensa, nos jornais, sem falarmos naquilo que ele vivencia no seu habitat.

Seria tão bom se a imprensa do mundo inteiro se associasse aos interesses do nosso Criador. Trazer luz para as mentes e para os corações.

Ninguém está dizendo que a imprensa não deveria noticiar o crime, a falcatrua, a barbaria. Mas não como algo fundamental. Noticiar en passant para chamar a atenção, não focar a sua venda, a venda de seus produtos no que há de pior.

Ao abrirmos uma revista, um jornal, um periódico qualquer o que encontramos ali é costumeiramente nauseante.

A pornografia, a prostituição, a corrupção política, a corrupção de toda ordem, como se não houvessem outros valores que tivéssemos necessidade de conhecer.

Há tanta gente boa no mundo, há tanta coisa boa na Terra precisando desses spotligths da imprensa. Precisando dessas anotações da imprensa, que jornalistas sensíveis ao progresso do mundo, que periodistas sensíveis à necessidade social de crescer, de se libertar da sombra, não perdessem de vista que, nesses tempos curiosos da Terra, nesses tempos danados do mundo, nessa hora bicuda da Humanidade, todos sentimos necessidade de uma imprensa que sirva o bem, que trabalhe para a luz e nos ajude a crescer.

Transcrição do Programa Vida e Valores, de número 197, apresentado por Raul Teixeira, sob coordenação da Federação Espírita do Paraná. Programa gravado em agosto de 2009

25 janeiro 2011

Fatalidade - Emmanuel

FATALIDADE

A fatalidade do mal é sempre uma criação devida à nós mesmos, gerando, em nosso prejuízo, a provação expiatória, em torno da qual passamos compulsoriamente a gravitar.

Semelhante afirmativa dispensa qualquer discussão filosófica, pela simplicidade com que será justo averiguar-lhe o acerto, nas mais comezinhas atividades da vida comum.

Uma conta esposada naturalmente é um laço moral tecido pelo devedor à frente do credor, impondo-lhe a obrigação do resgate.

Um templo doméstico entregue ao lixo sistemático transformar-se-á com certeza num depósito de micróbios e detritos, determinando a multiplicação de núcleos infecciosos de enfermidade e morte.

Um campo confiado ao império da erva daninha converter-se-á, sem dúvida, na moradia de vermes insaciáveis, compelindo o lavrador a maior sacrifício na recuperação oportuna.

Assim corre em nosso esforço cotidiano.

Não precisamos remontar a existência passadas para sondar a nossa cultura de desequilíbrio e sofrimento.

Auscultemos a nossa peregrinação de cada dia.

Em cada passo, quando marchamos no mundo ao sabor do egoísmo e da invigilância, geramos nos companheiros de experiência as mais difíceis posições morais contra nós.

Aqui, é a nossa preguiça, atraindo em nosso desfavor a indiferença dos missionários do trabalho; ali, é a nossa palavra agressiva ou impensada, coagulando a aversão e o temor ao redor de nossa presença.

Acolá, é o gesto de incompreensão provocando a tristeza e o desânimo nos corações interessados em nosso progresso; e, mais além, é a própria inconstância no bem, sintonizando-nos com os agentes do mal...

Lembremo-nos de que os efeitos se expressarão segundo as causas e alteremos o jogo das circunstância, em nossa luta evolutiva, desenvolvendo, conosco e em torno de nós, a mais elevada plantação de amor e serviço, devotamento e boa vontade.

“Acharás o que procuras”, disse-nos o Senhor.

E, em cada instante de nossa vida, estamos recolhendo o que semeamos, dependendo da nossa sementeira de hoje a colheita melhor de amanhã.

Pelo Espírito Emmanuel
Do livro: Fé, Paz e Amor
Médium: Francisco Cândido Xavier

24 janeiro 2011

Nos Círculos da Fé - Emmanuel

NOS CÍRCULOS DA FÉ

Reunião pública de 5-5-61, 1ª. Parte, cap. 1, item 12, de “O Céu e o Inferno”, de Allan Kardec.

Acende a flama da reverência, onde observes lisura na ideia religiosa.

Lembremo-nos, com o devido apreço aos irmãos que esposam princípios diferentes dos nossos, de que existem tantos modos de expressar confiança no Criador quantos são os estágios evolutivos das criaturas.

Há os que pretendem louvar a Infinita Bondade, manejando borés; há os que se supõem plenamente desobrigados de todos os compromissos com a própria crença, tão somente por se entregarem a bailados exóticos; há os que se cobrem de amuletos, admitindo que o Eterno Poder vibre absolutamente concentrado nas figurações geométricas; há os que fazem votos de solidão, crendo agradar aos Céus, fugindo de trabalhar; há os que levantam santuários de ouro e pedrarias, julgando homenagear o Divino Amor; e há, ainda, os que se presumem detentores de prerrogativas e honras especiais, pondo e dispondo nos assuntos da alma, como se Deus não passasse de arruinado ancião, ao sabor do capricho de filhos egoístas e intransigentes...

Ainda assim, toda vez que se mostrem sinceros, não lhes negues consideração e respeito.

Quase sempre, são corações infantis, usando símbolos como exercícios da escola ou sofrendo sugestões de terror para se acomodarem à disciplina.

Contudo, não lhes abraces as ilusões, a pretexto de honorificar a fraternidade, porque a verdadeira fraternidade se movimenta a favor dos companheiros de evolução, clareando-lhes o raciocínio sem violentar-lhes o sentimento.

É preciso não engrossar hoje as amarras do preconceito, para que o preconceito não se faça crueldade amanhã, perseguindo em nome da caridade ou supliciando em nome da fé.

*

Se a Doutrina Espírita já te alcançou o entendimento, apoiando-te a libertação interior e ensinando-te a religião natural da responsabilidade com Deus em ti mesmo, recorda a promessa do Cristo:

- "Conhecereis a verdade e a verdade, afinal, vos fará livres."

De “Justiça Divina”
De Francisco Cândido Xavier
Pelo Espírito Emmanuel

23 janeiro 2011

Calamidades e Provações - André Luiz

CALAMIDADES E PROVAÇÕES

Ontem...
O homem desejou recursos para mais facilmente abrir estradas e a Divina Providência lhe suscitou a idéia de reunir areia a nitroglicerina, em cuja conjugação despontou a dinamite. A comunidade beneficiou-se da descoberta, no entanto, certa facção organizou com ela a bomba destruidora de existências humanas.

Ontem...
O homem pediu veículos que lhe fizessem vencer o espaço, ganhando tempo, e o Amparo Divino ofereceu-lhe os pensamentos necessários à construção das modernas máquinas de condução e transporte. Essas bênçãos carrearam progresso e renovação para todos os setores das aquisições planetárias, entretanto, apareceram aqueles que desrespeitam as leis do trânsito, criando processos dolorosos de sofrimento e agravando débitos e resgates, nos princípios de causa e efeito.

Ontem...
O homem solicitou apoio contra a solidão psicológica e a Eterna Bondade, através da ciência, lhe concedeu o telégrafo, o rádio e o televisor, aproximando as coletividades e integrando no mesmo clima de aperfeiçoamento e cultura. Apesar disso, junto desses nobres empreendimentos, surgiram aqueles que se valem de tão altos instrumentos de comunicação e solidariedade para a disseminação da discórdia e da guerra.

Ontem...
O homem rogou medidas contra a dor e a Compaixão Divina lhe enviou os anestésicos, favorecendo-lhe o tratamento e o reequilíbrio no campo orgânico. Ao lado dessas concessões, porém, não faltam aqueles que transformam os medicamentos da paz e da misericórdia em tóxicos de deserção e delinqüência.

Ontem...
O homem pediu a desintegração atômica, no intuito de senhorear mais força, a fim de comandar o progresso, e a desintegração atômica está no mundo, ignorando-se que preço pagará o Orbe Terrestre, até que essa conquista seja respeitada fora de qualquer apelo à destruição.

Como é fácil observar, Deus concede sempre ao homem as possibilidades e vantagens que a Inteligência Humana resolve requisitar à Sabedoria Divina. Por isso mesmo, as calamidades que surjam nos caminhos da evolução no mundo, não ocorrem obviamente, sob a responsabilidade de Deus.

Do livro "Buscas e Acharás", pelo Espírito André Luiz, Francisco C. Xavier, edição IDEAL Mensagem adaptada. A palavra "Ontem" foi inserida no texto por nós (Instituto André Luiz) para melhor ilustração da idéia de André Luiz

22 janeiro 2011

Decisão Sabia - Neio Lúcio

DECISÃO SÁBIA

Em tempos recuados, existiu um rei poderoso e bom, que se fizera notado pela sabedoria.

Convidado a verificar, solenemente, a invenção de um súdito, cuja cabeça era um prodígio na matemática, compareceu em trajes de honra à festa em que o novo aparelho seria apresentado.

O calculista, orgulhoso, mostrou a obra que havia criado pacientemente. Tratava-se de largo tabuleiro forrado de veludo negro, cercado de pequenas cavidades, sustentando regular coleção de bolas de madeira colorida. Acionadas por longos tacos de marfim, essas bolas rolavam na direção das cavidades naturais, dando ensejo a um jogo de grande interesse pela expectação que provocava.

Revestiu-se a festa de brilho indisfarçável.

Contendores variados disputaram partidas de vulto.

Dia inteiro, grande massa popular rodeou o invento, comendo e bebericando.

O próprio monarca seguiu a alegria geral, dando mostras de evidente satisfação. Serviu-se, ao almoço, junto às grandes bandejas de carne, pão e frutos, em companhia dos amigos, e aplaudia, contente, quando esse ou aquele participante do novo e inocente jogo conseguia posição invejável perante os companheiros.

À tardinha, encerrada a curiosidade geral, o inventor aguardou o parecer do soberano, com inexcedível orgulho. Aglomerou-se o povo, igualmente, a fim de ouvi-lo.

Não se cansava o público de admirar o jogo efetuado, através de cálculos divertidos.

Despedindo-se, o rei levantou-se, fez-se visto de todos e falou ao vassalo inteligente:
— Genial matemático: a autoridade de minha coroa determina que sua obra de raciocínio seja premiada com cem peças de ouro que os cofres reais levarão ao seu crédito, ainda hoje, em homenagem à sua paciência e habilidade. Essa remuneração, todavia, não lhe visa somente o valor pessoal, mas também certos benefícios que a sua máquina vem trazer a muitos homens e mulheres de meu reino, menos afeitos às virtudes construtivas que todos devemos respeitar

neste mundo. Enquanto jogarem suas bolas de madeira, possivelmente muitos indivíduos, cujos instintos criminosos ainda se acham adormecidos, se desviarão do delito provável e muitos caçadores ociosos deixarão em paz os animais amigos de nossas florestas.

O monarca fez comprida pausa e a multidão prorrompeu em aplausos delirantes.

Via-se o inventor cercado de abraços, quando o soberano recomeçou:
- Devo acrescentar, porém, que a sabedoria de meu cetro ordena que o senhor seja punido com cinquenta dias de prisão forçada, a fim de que aprenda a utilizar sua capacidade intelectual em benefício de todos. A inteligência humana é uma luz cuja claridade deve ser consagrada à cooperação com o Supremo Senhor, na Terra. Sua invenção não melhora o campo, nem cria trabalho sério; não ajuda as sementes, nem ampara os animais; não protege fontes, nem conserva estradas; não colabora com a educação, nem serve aos ideais do bem. Além disto, arrasta centenas de pessoas, qual se verificou neste dia, conosco, a perderem valioso tempo na expectativa inútil. Volte aos seus abençoados afazeres mentais, mesmo no cárcere, e dedique sua inteligência a criação de serviço e utilidades em proveito de todos, porque, se o meu poder o recompensa, a minha experiência o corrige.

Quando o rei concluiu e desceu da tribuna, o inventor se fizera muito pálido, o povo não bateu palmas; entretanto, toda gente aprendeu, na decisão sábia do grande soberano, que ninguém deve menosprezar os tesouros da inteligência e do tempo sobre a Terra.

Do livro "Alvorada Cristã"
Pelo Espírito Neio Lúcio
Médium: Francisco C. Xavier

21 janeiro 2011

Curiosa Experiência - Irmão X

CURIOSA EXPERIÊNCIA

João Massena, espírito extremamente dedicado aos enfermos, desde alguns anos após a desencarnação dirigia um grupo de companheiros em grande cidade, esmerando-se na plantação das idéias libertadoras do Espiritismo. Respeitado e querido, entre aqueles que lhe recebiam a generosidade, ampliava constantemente a própria área de ação, Invocado carinhosamente, aqui e ali, prestava serviços preciosos, angariando tesouros de cooperação e simpatia. Aplicava o Evangelho, com raro senso de oportunidade, sustentava infelizes, protegia desesperados e sabia orientar o concurso de vários médicos desencarnados, em favor dos doentes, especializando-se, sobretudo, no socorro aos processos obsessivos.

Massena apoiava o grupo de amigos encarnados e o grupo apoiava Massena, com tal segurança de entendimento e trabalho, que prodígios se realizavam constantemente.

As tarefas continuavam sempre animadoras, quando surgiu para João certo caso aflitivo. Jovem destinada a importantes edificações mediúnicas jazia em casa, trancada entre quatro paredes e vigiada por Espíritos impossíveis, interessados em cobrar-lhe algumas dívidas do passado culposo. Benfeitores da Vida Maior amparavam-na; perseguidores que lhe tramavam a perda.

Prestigiado pelos poderes Superiores, Massena estudou a melhor maneira de acordá-la para as responsabilidades de que se achava investida e percebeu que, para isso, bastaria aparecesse alguém capaz de lhe excitar a memória para o retorno ao equilíbrio, alguém que falasse a ela com respeito à fé raciocinada, à crença lógica, à imortalidade da alma e à vida espiritual.

A jovem, contudo, sob a provação da riqueza amoedada, sofria a desvantagem de não precisar sair do estreito recinto doméstico e, à face disso, encontrava maior empeço para largar a si própria.

A pouco e pouco, dominada por entidades vampirizadoras, entregou-se ao vício do álcool e, quase anulada que lhe foi a resistência, permitiu que essas mesmas criaturas perturbadas lhe assoprassem a sugestão de um crime a ser perpetrado na pessoa de um parente próximo. Conquanto reagisse, a pobrezinha estava quase cedendo à insanidade, à delinquência. João, aflito, reconheceu o estado de alarma. A moça, no entanto, não se ausentava de casa, não recebia visitas, não recorria a leituras e ignorava o poder da prece. Mentalmente intoxicada, tomava rumo sinistro, quando Massena descobriu algo. A infortunada menina gostava de televisão, que se lhe fizera o único meio de contacto com o mundo exterior. Porque não auxiliá-la através de semelhante recurso? O abnegado amigo espiritual pôs-se em campo e, repartindo apelos mentais, em setores diversos, conseguiu articular providências, até que um amigo lhe aceitou a inspiração e veio ao grupo com um projeto entusiástico. Esse “projeto entusiástico” não era outra coisa senão o interesse de Massena no salvamento da jovem. E o visitante, sob o influxo dele, fez veemente no tranquilo cenáculo, convidando o conjunto a aproveitar uma oportunidade que obtivera em determinado canal. Conseguira vinte minutos para assunto espírita numa televisora respeitável. O grupo representar-se-ia, por alguns dos componentes mais categorizados, daí a quatro dias – uma sexta-feira às dez da noite -, para comentar ligeiros aspectos de mediunidade e Doutrina Espírita. O ofertante, após anotações de jubiloso otimismo, concluiu explicando que necessitava de ajustes urgentes. Queria, de imediato, o nome do companheiro decidido a falar, antes de atender a instruções de autoridades e estabelecer minudências.

Os nove companheiros, ali reunidos, não sintonizavam, porém, naquela onda de expectação fervorosa.
Lara, o diretor de maior responsabilidade, ponderou:
- Ora! Ora! O Espiritismo não precisa de televisão. Temos as nossas casas de ensino... Entretanto, coloco o assunto ao critério dos irmãos...
O recém-chegado, expressando-se por si e pelo benfeitor espiritual que o envolvia em pensamentos de esperança, repostou:
- Sem dúvida, o templo espírita é o lar da palavra doutrinária, mas isso não nos impede de comentar os princípios espíritas, em benefício da Humanidade, seja no rádio ou na imprensa, na rua ou no salão. Se fôssemos falar acerca do bem apenas nos instintos de fé religiosa, deixaríamos ao mal campo livre, terrivelmente livre...
O judicioso apontamento, contudo, não vingou.
Delcides, comentarista inteligente da equipe, aduziu:
- Sou contra. Eu não iria à televisão, de modo algum. Considero isso pura vaidade.
Antônio Pinho, orador competente, anuiu:
- De minha parte, não tenho coragem de me entregar a semelhante exibição...
Meira, verbo seguro e visão firme, comentou, seco:
- Nem eu.
E os demais cinco ajuntaram:
- Decididamente, ir à televisão falar de Espiritismo não está certo...
- Penso de igual modo. Quem quiser aprender Doutrina Espírita, venha às reuniões...
- Eu também não poderia concordar...
- Não sou de teatro...
- O assunto esta fora de cogitação...

Encerrou-se o entendimento e o ofertante afastou-se, desapontado.
Curiosos, visitamos a jovem obsidiada, justamente na data para a qual Massena lhe previa o suspirado auxílio. Eram dez horas da noite, na sexta-feira referida, e fomos achá-la sentada à frente do vídeo.
Os minutos que seriam reservados aos comentários em torno do Espiritismo estavam sendo aplicados num festivo programa de exaltação ao uísque e, perplexos, fitamos o simpático sorriso de tele-atriz que convidava:
- Beba a nova marca! Uma delícia!...

Do livro "Cartas e Crônicas"
Psicografia de Irmão X
Medium: Francisco C. Xavier

20 janeiro 2011

A Sociedade Somos Nós - Richard Simonetti

A SOCIEDADE SOMOS NÓS

É evidente que, se não fossem os preconceitos sociais, pelos quais se deixa o homem dominar, ele sempre acharia um trabalho qualquer, que lhe proporcionasse meio de viver, embora deslocando-se da sua posição. Mas, entre os que não têm preconceitos ou os põem de lado, não há pessoas que se veem na impossibilidade de prover às suas necessidades, em consequência de moléstias ou outras causas independentes da vontade delas?

Numa sociedade organizada segundo a Lei do Cristo, ninguém devemorrer de fome.

O Livro dos Espíritos – Questão nº 930

Há indivíduos indolentes e indisciplinados que vivem em situação difícil por sua própria culpa. Mas há, também, os que experimentam amargas privações decorrentes de circunstâncias alheias à sua vontade:

O doente sem recursos...

O velho sem abrigo...

A criança abandonada...

O operário desempregado...

Imagina-se que providências a respeito do assunto são de alçada exclusiva do Governo, chamado ao atendimento da população carente e à erradicação da miséria.

No entanto, a sociedade somos nós, cidadãos que a compomos.

O Governo é apenas uma representação. Não podemos, portanto, debitar-lhe inteiramente a solução desse problema, mesmo porque a cristianização da sociedade não depende de iniciativas dos poderes constituídos. Fraternidade, solidariedade, misericórdia, caridade, compaixão, não são passíveis de imposição por decretos.

A própria subordinação de movimentos religiosos ao Estado sempre conduz a perigosos desvios. Exemplo típico temos no famoso Édito de Milão, no Século IV, em que Constantino iniciou o processo que transformaria o Cristianismo em religião oficial do Império Romano.

Nem por isso instalou-se uma sociedade cristã. Ao contrário — o artificialismo, a hipocrisia, as exterioridades, males insistentemente combatidos por Jesus, tomaram de assalto o culto cristão, atrelado ao carro do poder temporal e sujeito, em decorrência, às influências daqueles que disputavam as glórias humanas.

De “Um jeito de ser feliz”, de Richard Simonetti

19 janeiro 2011

A Família e os Deveres dos Filhos com Relação aos Pais - F.Altamir da Cunha

A Família e os Deveres dos Filhos com Relação aos Pais

É muito comum o desenvolvimento de temas enfocando a louvável preocupação a respeito dos deveres dos pais com relação aos filhos, no núcleo familiar. Sem sombra de dúvida, seria inaceitável a indiferença a tão importante e oportuno assunto. Porém, considerando a família, como instituição social na qual se reúnem espíritos encarnados de variados níveis evolutivos, credores e devedores uns dos outros, rumo à perfeição, não podemos olvidar o regime de reciprocidade de deveres entre os mesmos.

Se, é verdade que aos pais compete o dever de amar, proteger, assistir e educar o filho para a vida, não é menos verdade que aos filhos cabe o dever de amar, respeitar e assistir os pais em suas necessidades; principalmente na velhice, quando peso da idade os torna dependentes. É importante lembrar, que o cumprimento desse dever, independe de como os pais se comportaram, se cumpriram ou não seus deveres. Isso não deve interferir no dever dos filhos; a oportunidade reencarnatória, da qual os pais se fizeram instrumentos, já é suficiente para que os filhos lhes sejam gratos.

Cometeriam grave erro, os filhos que se acomodassem ao simples dever da assistência material, embora reconhecedores que somos de sua importância. Porém, é importante ressaltarmos, que toda criatura necessita muito mais do que este tipo de assistência.

Lembramos que em uma das visitas costumeiras a um ancianato, ouvimos de uma interna o comentário: “aqui eu tenho apartamento com televisão e uma pessoa para cuidar de mim. Mas o que eu queria mesmo, era estar ao lado do meu filho. Hoje (era um sábado), ele deve estar passeando com os filhos e a esposa. Sinto muita saudade dele”. Este comentário revela, que a necessidade maior é a da presença, do carinho e da atenção.

A ingratidão dos filhos para os pais, principalmente, quando estes se encontram em idade provecta, é a maior prova da insensibilidade de algumas criaturas; reflexo do utilitarismo, que domina a sociedade contemporânea. Na antiguidade algumas sociedades, mantinham em seu seio, grupos formados por anciões, os quais, eram respeitados, e pela experiência de que eram portadores, tornavam-se conselheiros para as decisões mais importantes.

Hoje, a inversão de valores se fez patente - o mais importante não é ‘ser’ (ser experiente, ser honesto, ser justo, etc.), mas, sim, ‘ter’ (mesmo que seja apenas, a astúcia para conseguir de forma desonesta), causando abandono e solidão àqueles que não são mais produtivos. Essa é uma triste realidade, que precisa ser mudada.

Desconhecer a importância daqueles que no passado, limparam e araram a terra, plantaram as sementes e cuidaram, para que se tornassem árvores

frondosas e frutíferas de cujas sombras e frutos hoje nos servimos, é a manifestação cruel do egoísmo, em forma de ingratidão.

Nós como filhos, que inúmeras vezes, idealizamos grandes projetos

humanitários, não podemos esquecer, que se ainda não aprendemos a abrir os corações para amar os nossos pais, jamais conseguiremos amar à humanidade.

Respeitar pai e mãe conforme prescrito em os dez mandamentos, é assisti-los em todos os aspectos; não deveria representar para os filhos um sacrifício, mas, sim, um prazer – o prazer de retribuir a dedicação e o carinho, recebidos na infância.

Portanto, aos filhos hoje, compete o legítimo exercício da caridade e da gratidão, sem esquecer que da vida apenas recebemos o que damos. Quem semeia indiferença, candidata-se à solidão!

F.Altamar da Cunha - Publicado no jornal O Clarim - Março/2008

18 janeiro 2011

Drogas: Fonte de Prazer ou Sofrimento - F.Altamir da Cunha

DROGAS: FONTE DE PRAZER OU SOFRIMENTO?

Um dos temas mais interessantes da atualidade é, sem sombra de dúvida, aquele que se relaciona com uso de drogas. Estudar e avaliar seus efeitos nas esferas biopsíquica, social e espiritual, constitui-se ação impostergável.

É bastante fazermos uma retrospectiva na história da humanidade, para constatarmos, que o uso de drogas não é um problema de agora. Na bíblia é relatada a história de uma das primeiras vítimas: "E começou Noé a cultivar a terra e plantou uma vinha. Bebeu do vinho e embriagou-se; e achava-se nu dentro da sua tenda" (Gênesis 9, 20-21).

Nas civilizações antigas mascavam-se determinadas folhas, para se obter energia e disposição, a fim de vencer as intempéries e os perigos. Na Índia e no Egito eram conhecidos os efeitos das drogas para provocar a liberação parcial do espírito (desdobramento); através desse fenômeno comunicavam-se com os desencarnados, os quais eram interpretados como deuses. Cristóvão Colombo, quando esteve nas Américas, fez menção a respeito dos índios, habitantes daquelas terras que, através de um canudo de determinada planta, inalavam uma substância, que os tornava excitados.

Portanto, registros sobre o uso e conhecimento dos efeitos das drogas, sempre estiveram presentes na história da humanidade.

Na atualidade, no entanto, os reflexos nocivos do uso abusivo de drogas alcançaram vários setores da sociedade, onerando as finanças públicas, desestruturando famílias, causando sofrimento e morte.

Ante as repetidas notícias, através da mídia, destacando a insensibilidade dos traficantes e o sofrimento dos escravos do vício, os demais cidadãos angustiados questionam: Até quando?...
Todo sofrimento tem um termo, mas somente acontecerá quando forem eliminadas as suas causas. Existem traficantes porque existem pessoas imaturas que, acovardadas ante os desafios da vida ou movidas por curiosidade, iniciam-se no uso de substâncias de efeito tóxico e delas tornam-se escravas. Não acreditam nas possibilidades que lhe são inerentes e que seriam suficientes para torná-las vencedoras.

Quanto à legalidade, existem as drogas lícitas e as ilícitas. Entre as consideradas legais ou licitas, nós poderíamos incluir o cigarro e as bebidas alcoólicas.

O cigarro, que há tempo faz parte do dia-a-dia de uma considerável parcela da população, gera dependência, causando a médio e longo prazo, problemas cardiovasculares e vários tipos de cânceres. Os alcoólicos, que conquistam cada vez mais consumidores jovens, têm sido uma das causa principais da violência urbana e dos acidentes de trânsito. O alcoolismo, hoje considerado um problema de saúde, é responsável por uma grande parcela de ocupação dos leitos hospitalares, faltas no ambiente de trabalho, desestrutura familiar, cirrose hepática, câncer e perda da memória.

Lembramos de um dos melhores professores de matemática que tivemos no curso ginasial (primeiro grau). Destacava-se, na época, pela sua rapidez de raciocínio e competência profissional. Era consumidor de alcoólicos; perdeu o controle e tornou-se alcoólatra. Anos depois o encontramos; ele nos apresentou um problema de matemática de nível ginasial para que resolvêssemos, pois não conseguira resolver. Ao lermos o problema constatamos ser um dos mais elementares. O álcool havia prejudicado sua memória, incapacitando-o para o exercício profissional. Mas não ficou restrito à memória os danos causados pelo álcool; alguns anos depois, com pouco mais de 40 anos, retornava ao plano espiritual, vítima de cirrose hepática.

Após essa exposição superficial, a respeito das drogas lícitas, não podemos deixar passar a oportunidade de tecermos também algumas considerações sobre as drogas alucinógenas ou ilícitas. Estas têm conseqüências mais devastadoras, não apenas pelo seu efeito nocivo na saúde do consumidor, mas também, pela ganância dos traficantes, em luta pelo domínio de áreas de venda.
O mundo tem passado por uma vertiginosa transformação, exigindo de todos, adequações psicológicas e espirituais. Mas é justamente o que não tem acontecido; alguns espíritos imaturos, na sua maioria oriundos de lares desestruturados, sentem-se como peixe fora da água; buscam através das drogas amortecer as angústias que os atormentam. Fogem momentaneamente da realidade, por força do efeito alucinógeno; porém, quando cessa esse efeito, sentem-se mais angustiados, necessitando de repetidas doses que os conduzem inexoravelmente à dependência e à autodestruição; destruição física, destruição moral, destruição de sonhos e da dignidade, porque o usuário torna-se escravo do vício.

Os efeitos das drogas não se restringem apenas ao corpo físico; a sua ação vigorosa, complementada por astúcia de espíritos perversos, desagrega a personalidade, liberando dos arquivos do subconsciente imagens de dramas vividos em encarnações anteriores. Atingido esse estágio, que na maioria das vezes torna-se irreversível, vem, a seguir, a loucura ou a morte.
Ante o exposto, que representa o drama vivido pelo dependente de drogas enquanto encarnado, é oportuno lembrarmos, que ele não termina com a morte. As desarmonias causadas na tessitura perispiritual e a dependência (necessidade da droga) lhe causarão muitos transtornos, até que se reabilite com as leis da vida, o que se dará através de outras oportunidades reencarnatórias.

Portanto não encontramos motivos para interpretar que o uso de drogas proporcione prazer, quando na realidade é fonte de sofrimento e destruição. (F. Altamir da Cunha).


17 janeiro 2011

Pagar o Quê? Para Quem? - Orson Peter Carrara

Pagar o Quê?...Para Quem?

Somente o desconhecimento dos princípios espíritas pode gerar a ideia de que temos que pagar com sofrimentos, e para alguém, dívidas de existências passadas. Eis o equívoco.

O que ocorre é que a existência do espírito é única; as existências corpóreas é que são múltiplas, mas o ser integral é sempre o mesmo. As múltiplas existências corpóreas cumprem a finalidade de estágios de aprendizado, na verdade degraus de aperfeiçoamento.

Como estamos todos em aprendizados, cometemos equívocos. Tais equívocos geram consequências. Tais consequências podem redundar em prejuízos para nós mesmos ou para terceiros. E tais prejuízos devem ser reparados. Isto é das Leis Divinas.

Tais reparações nós as devemos à nossa própria consciência, à vida. E, neste processo, podemos nos encontrar em situações aflitivas, decorrentes todas dos equívocos que nos envolvemos.

Porém, tudo isso, não se refere a outro ser que viveu noutro tempo e que, aparentemente nenhum vínculo com ele mantemos. Não! Somos nós mesmos que agíamos nesta caminhada de aprendizados e que trazemos nas lembranças e registros, ainda que inconscientes, a necessidade dessas reparações que ora se apresentam na atualidade consciente que estamos vivendo.

Assim funciona a Lei da Reencarnação. Os filhos de Deus estagiam em diversas existências corpóreas (visando o próprio progresso, repetimos), habitando países e corpos diferentes, mas a individualidade é a mesma, razão pela qual carrega consigo seu patrimônio moral e intelectual, bem como as reparações devidas aos equívocos praticados com prejuízos para si mesmo ou para terceiros.

Então, não se trata de uma questão de pagar, mas de conquistar a paz de consciência. Quando constatamos, antes da presente encarnação, que prejudicamos alguém ou a nós mesmos, solicitamos que a próxima encarnação propicie os mecanismos de reparação.

Esses mecanismos podem apresentar-se com a aparência de enfermidades, limitações físicas, dificuldades materiais, obsessões, entre outras.

E a visão distorcida sobre os princípios espíritas gera a errônea idéia de que estamos no mundo para pagar... Renascemos simplesmente para dar continuidade ao processo evolutivo. Mas, como ontem (aqui significado existências corpóreas) nos alimentamos em excesso, hoje (atualidade que estamos vivendo da presente encarnação) poderemos estar enfrentando uma forte dor de estômago ou até uma incômoda diarréia, simplesmente como conseqüência imediata da gula. Agora peço ao leitor substituir o exagero da alimentação pelas diversas situações que podem ser imaginadas, em outros exemplos. O exemplo da alimentação é apenas comparativo.

Assim também nos prejuízos, de qualquer ordem, causados a terceiros. Criamos vínculos com eles e os trazemos em nós através de conseqüências que também podem ser apresentar com diversas aparências. Isto é apenas a reação de uma ação.

E o assunto ainda pode ser ampliado na visão dos aprendizes negligentes. Negligência no passado ou mesmo no presente. Tarefas adiadas, desprezadas, abandonadas... Tudo traz reflexos. Afinal colhemos hoje as ações de ontem e estamos continuamente semeando para o amanhã.

Por outro lado, a título de ilustração do assunto, solicito ao leitor considerar também que nem todo equívoco passado pode apresentar-se atualmente através de dificuldades. Muitas vezes, equívocos podem ser reparados através de trabalho e dedicação a causas e pessoas. Isto tudo porque, conforme já sabemos, "o amor cobre a multidão de pecados".

Por Orson Peter Carrara


16 janeiro 2011

Cultura Espírita - José Herculano Pires

 
CULTURA ESPÍRITA
Se o homem-espírita de hoje não compreender a real necessidade da prática real e efetiva dos princípios doutrinários e dormir sobre os louros literários, a Civilização Espírita abortará ou será transformada numa simples caricatura da fórmula proposta, como aconteceu com o Cristianismo

Para que uma civilização se desenvolva é necessária a integração dos homens nos seus princípios e pressupostos. Uns e outros se encontram nos livros de Kardec, mas se esses livros não forem realmente estudados, investigados na intimidade profunda dos textos e transformados em pensamento vivo na realidade social, a civilização não passará de urna utopia ou de uma deformação da realidade sonhada.

Por mais frágil e efêmero que seja o homem na sua existência, é ele que dá vida ao presente e ao futuro, é ele o demiurgo que modela os mundos. Para o homem-espírita construir a Civilização do Espírito é necessário que a viva em si mesmo, na sua consciência e na sua carne, pois é nesta que a relação da consciência com o mundo se realiza. E para isso não bastam os livros, é necessário o concurso de todos os meios de comunicação: a palavra, a imprensa, o rádio, a televisão, e mais ainda, a prática intensiva e coletiva dos princípios doutrinários, de maneira correta e fiel.

Se o homem-espírita de hoje não compreender isso e dormir sobre os louros literários, a Civilização Espírita abortará ou será transformada numa simples caricatura da fórmula proposta, como aconteceu com o Cristianismo. É disso que os espíritas precisam tomar consciência com urgência. Ou acordam para a gravidade do problema ou serão esmagados pelo avanço irrefreável dos acontecimentos no tempo.

A idéia comodista de que Deus faz e nós desfrutamos ou suportamos não tem lugar no Espiritismo. Pelo contrário, neste se sabe que o fazer de Deus no mundo humano se realiza através dos homens capazes de captar a sua vontade e executá-la. Não há milagres nem ações mágicas na Natureza, onde a vontade de Deus se cumpre através dos Espíritos, desde o controle das formações atômicas até o crescimento dos vegetais.

Dizia Talles de Mileto, o filósofo vidente, que o mundo está cheio de deuses que trabalham em toda a Natureza, e deuses, para os gregos, eram espíritos. Kardec repetiu em outros termos e de maneira mais explícita e minuciosa essa mesma verdade. No mundo humano os Espíritos se encarnam, fazem-se homens para modelá-lo. Cada espírito encarnado trás consigo sua tarefa e a sua responsabilidade individual e intransferível. O que não cumpre o seu dever, fracassa. Não há outra alternativa.

O fracasso da maioria dos cristãos resultou na falência quase total do Cristianismo. O que se salvou foi o pouco que alguns fizeram. E é a partir desse pouco, dois mil anos depois da pregação do Cristo e do seu exemplo de abnegação total, foi, que Kardec partiu para a arrancada espírita. O exemplo da França é uma advertência aos brasileiros. A hipnose materialista absorveu os franceses no imediato e o Espiritismo quase se apagou de todo nos campos arroteados por Kardec, Denis, Flammarion, Delanne e tantos outros. O mesmo acontece hoje entre nós, sob a complacência de instituições representativas da doutrina e o apoio fanático de líderes carismáticos, piegos espirituais e alucinados mentais a dirigir multidões de cegos.

Todas as tentativas de correção dessa situação perigosa se chocam com a frieza irresponsável dos que se dizem responsáveis pelo desenvolvimento doutrinário. E a passividade da massa espírita, anestesiada pelo sonho da salvação pessoal, do valor mágico da tolerância bastarda, da crença ingênua do valor sobrenatural das esmolas pífias (o óbulo da viúva dado por casais de contas comuns nos bancos) vai minando em silêncio o legado de Kardec.

O medo do pecado que sai da boca, da pena ou das teclas – enquanto se come e bebe à farta, semeiam-se migalhas aos pobres e dorme-se na bem-aventurança das longas digestões – faz desaparecer do meio espírita o diálogo do passado recente, substituindo o coro dos debates pelo silêncio místico das becas de siri. Ninguém fala para não pecar e peca por não falar, por não espantar pelo menos com um grito as aves daninhas e agoureiras que destroem a seara.

A imprensa espírita, que devia ser uma labareda, é um foco de infestação, semeando as mistificações de Roustaing, Ramatis e outras, ou chovendo no molhado com a repetição cansativa de velhos e surrados slogans, enquanto as terras secas se esterilizam abandonadas.

À margem dessa imprensa paroquial, feita para alimentar a família, os jornais que surgem em condições de mostrar ao grande público a grandeza e o esplendor da Doutrina morrem de inanição, enquanto jornais mistificadores, preparados com os condimentos da imprensa sensacionalista e louvaminheira, ou temperados com bocas de siri (quanto mais fechadas, mais gostosas) são mantidos pela renda de instituições comerciais ou por interesses marginais.

As escolas espíritas marcam passo na estrada comum. Os programas de rádio são sufocados por adulteradores e substituídos por improvisações acomodatícias. A televisão só se abre para sensacionalismos deturpadores. Os recursos financeiros só são empregados na caderneta de poupança da caridade visível, que no invisível rende juros e correções monetárias. As iniciativas editoriais corajosas – como o lançamento de toda a coleção da Revista Espírita – morrem asfixiados pelo encalhe, ante o desinteresse de um público apático. Os hospitais Espíritas transformam-se em organizações comuns, mantidos pelas verbas oficiais de socorro a doentes que podem carreá-las aos seus cofres, a antiga e legítima caridade espírita de anos atrás, sustentada por alguns abnegados que já passaram para o Além, murcha como flor de guanchuma em pastos ressequidos. Restam apenas, nessa paisagem desoladora, alguns pequenos oásis sustentados pelos últimos e pobres abencerragens de uma velha estirpe desaparecida.

É necessário que se diga tudo isso, que se escreva e semeie essa verdade dolorosa, para que toque os corações, na esperança de uma reação que talvez não se verifique, mas que pelo menos se tenta despertar. Na hora decisiva da colheita, as geadas da indiferença e as parasitas do comodismo ameaçam as mínimas esperanças de antigos e cansados lavradores. Apesar disso, os que ainda resistem não podem abandonar os seus postos. É necessário lutar, pois o pouco que se possa salvar poderá ser a garantia de melhores dias.

O homem, as gerações humanas morrem no tempo, mas o espírito não. O tempo é o campo de batalha em que os vencidos tombam para ressuscitar. Quem poderia deter a evolução do espírito no tempo? A consciência humana amadurece na temporalidade. A esperança espírita não repousa na fragilidade humana, mas nas potencialidades do espírito, que se atualizam no fogo das experiências existenciais. Curta é a vida, longo é o tempo, e a Verdade intemporal aguarda a todos no impassível Limiar do Eterno. O homem é incoerência e paixão, labareda esquiva que se apaga nas cinzas, mas o espírito é a centelha oculta que nunca se apaga e reacenderá a chama quantas vezes for necessário, para que a serenidade, a coerência e o amor o resgatem na duração dos séculos e dos milênios.

Todas as Civilizações da Terra se desenvolveram, numa assombrosa sucessão de sombra e luz, para que um dia – o Dia do Senhor, de que falavam os antigos hebreus – a Civilização do Espírito se instale no planeta martirizado pelas tropelias da insensatez humana. Então teremos o Novo Céu e a Nova Terra da profecia milenar. Os que não se tornarem dignos da promessa continuarão a esperar e a amadurecer nas estufas dos mundos inferiores, purgando os resíduos da animalidade. Essa é a lei inviolável da Antropologia Espírita.

José Herculano Pires
No livro O Espírito e o Tempo
Editora Paideia