OPORTUNIDADE
No grito possesso do irmão desesperado,
Com o espírito dilacerado por desventura e dor,
Ouviremos a verdade de quem a tudo tem necessitado,
A alegria sendo-lhe negada, uma vida sem amor.
Da existência imediatamente anterior,
Nada se recorda de sua falta de complacência.
Agiu como quis, praticou todo tipo de horror.
Rolou na lama até o máximo da decadência.
Às necessidades de seus irmãos, fez vistas grossas.
De tudo que dispunha, esbanjou na boemia.
Muitas vezes, por amigos, foi encontrado caído em fossas.
Mas... apresentava justificativas; para isso tinha mestria.
Seus amigos de verdade tudo tentaram por sua regeneração.
Alcoólicos Anônimos, religião, conselhos e recomendações de toda sorte.
Todavia, nada sortia efeito, nem mesmo sentida oração.
Tanto desequilíbrio, não poderia acabar diferente; sobreveio-lhe a morte.
Em meio a uma mente toda confusa,
No momento, pouco pode perceber do ocorrido.
Quem não é forte, joga com a vida, perde e abusa.
Desencarnou no meio do jogo; o último gole por ser bebido.
Do outro lado da vida, veio-lhe a brutal consciência:
Havia dado cabo da própria vida; era um suicida.
Não tinha mais nada para explicar; sua vida era sua referência.
Quando olhava para si só via chagas; uma enorme ferida.
O que havia feito de sua existência?
Por que não dera ouvidos aos amigos verdadeiros?
Como justificar tudo o que fizera ante Deus e a consciência?
Como afastar de si, tantos inimigos justiceiros?
Muitas perguntas havia a responder.
O sofrimento e as dores ainda eram fortes.
Para onde quer que olhasse, nada para se esconder.
Sua situação pensou, era pior que mil mortes.
Assim permaneceu por tempo indeterminado.
Gemendo, chorando, reclamando de dor e cansaço.
Quando adormeceu, sonhou que tudo havia acabado.
Dois Anjos, de linda figura, viram e o levaram pelo braço.
Todos, por pior que tenhamos sido, algo de bom fizemos no pretérito.
Deus, infinito em amor e justiça, possui o coração puro.
Vê qualquer fiapo de ação que possa considerar como mérito,
Para Seu filho socorrer. Não o apraz deixa-lo em apuro.
Se Deus fosse só justo em seu julgamento,
E a vida pudesse também retroceder,
Com certeza reencarnaria como um jumento,
E ao Deus da vida, todos os dias iria agradecer.
Felizmente isso não passa de desabafo de arrependido.
A vida só caminha para frente, rumo a libertação.
Deus de amor e justiça auxilia e aguarda o filho combalido.
Cada qual no seu tempo, angariará méritos à evolução.
Mas... para que nos degraus da evolução, possa voltar a subir,
Seus débitos terá que resgatar; para tanto, tornará a nascer.
Porém, muito do que tinha, não poderá mais usufruir.
Ainda carregará consigo, desejo inconsciente de morrer.
Das dificuldades de sua nova vida, terá pavor.
Dos amigos que lhe eram fiéis e verdadeiros; nenhum.
Com seu novo corpo, sofrerá doenças e constante dor.
Seus inimigos cruzarão seu caminho, um a um.
Assim terá que enfrentar sua nova existência.
Vivenciará provas e dificuldades atrozes.
Obrigar-se-á a manter-se em total abstinência,
Sob pena de partir antes do tempo, vítima de cirrose.
Dor, desespero, solidão e amargura.
Tudo em uma só vida e o desejo inconsciente de morrer.
Algo lhe diz que é preciso lutar. Que também é filho de Deus essa criatura.
Em realidade, trata-se de nova oportunidade, de viver.
Como se sairá ante tantas dificuldades?
Para que avance, seus débitos deverá quitar.
Viver já fará parte das provas dessa verdadeira faculdade.
Avançar significará provar que aprendeu, ao próximo, amar.
Deixemos de lado suas lutas inglórias;
Seus sacrifícios e momentos de desânimo.
Contemos sua atual encarnação e suas histórias,
A fim de mostrar o quanto Deus é magnânimo.
Sérgio Rubens